Muito se tem falado nos últimos tempos sobre isto. Pelas piores razões: falta de recursos de todo o tipo, falta de gestão e de organização, com prejuízo óbvio de quem tem que recorrer a estes serviços, cada vez mais caóticos e à beira da ruptura total.
Mas para além de tudo isto, há a questão humana. O que eu não consigo entender é que por maior que seja a falta de condições de trabalho, o lado humano não seja considerado. Que se esqueça que as pessoas que vão ao hospital são as mais vulneráveis de todas, e se encontram em situação de extrema fragilidade física e emocional. Assim, por maior que seja o volume de trabalho e o stress, é impensável que se deixe as pessoas horas a fio num canto qualquer à espera de ser atendidas, sem uma palavra, um gesto de atenção ou de cuidado, um simples olhar.
Mais confusão ainda me fazem as diferenças gritantes e antagónicas entre diferentes hospitais públicos.
Por motivos que não vêm ao caso, tenho frequentado nos últimos tempos com relativa regularidade os serviços de urgência do Hospital Amadora-Sintra e o que tenho assistido e vivido por lá é impossível de descrever em palavras. Diria que está próximo do que pode ser, para mim, uma "descida aos infernos". Mas para além da sobrelotação, da confusão e da agitação generalizadas, da falta de condições aos mais diversos níveis, - que vão desde não haver sequer uma cadeira para os acompanhantes dos doentes que estão nas urgências e que são obrigados a ficar horas infinitas de pé, à desatenção total aos doentes que esperam sabe Deus quanto tempo, apenas para ser atendidos, - o que mais me impressiona é a forma como as pessoas são tratadas, ou antes, "destratadas", pela quase esmagadora maioria dos profissionais que ali trabalham e que incluem médicos, enfermeiros, auxiliares, administrativos, seguranças, até: não ouvem as pessoas, não lhes dirigem a palavra, nem o olhar, e funcionam como se tudo aquilo fosse uma tremenda chatice. Com excepções, naturalmente, mas muito poucas. Enfim, já lá estive meia dúzia de vezes e aquilo a que assisti é verdadeiramente inconcebível.
Ora, no último fim de semana, e perante a necessidade de nova deslocação às urgências, deu-se a "feliz" casualidade de este hospital estar demasiado sobrecarregado e os doentes serem, por isso, deslocados para outros serviços de urgência. Pude, deste modo, conhecer o atendimento do Hospital de São Francisco Xavier, que seria sempre a minha primeira escolha, caso me fosse permitido optar pelo que mais desejo.
Na verdade, parecia que estava noutro país. A diferença entre um e outro é tão antagónica como a diferença entre o mundo civilizado e a selva. Aqui, apesar da confusão e da sobrelotação, que também existia, as pessoas eram tratadas com a humanidade que se esperaria que houvesse sempre, e independentemente do tempo que tinham de aguardar, não estavam "abandonadas a um canto", mas antes permanentemente cuidadas por todos os profissionais que ali trabalham, sempre com palavras amáveis, paciência, sorrisos, atenção. E com a dignidade que deveria ser obrigatória em todo o lado.
Parece-me pois muito estranho que dois hospitais públicos, que pertencem ao mesmo Serviço Nacional de Saúde, do mesmo país, possam funcionar de modo tão diametralmente oposto. Mas o que é ainda mais revoltante é que a pessoa que é conduzida ao hospital através de uma ambulância do INEM não possa escolher o hospital onde prefere ser atendida, e tenha de se sujeitar ao que pertence à sua "área", a qual não tem sequer em conta o hospital que fica mais próximo em termos de distância quilométrica, mas sim o concelho onde se está.
Nada disto faz sentido, nem o facto de não nos restar mais do que "rezar a todos os santinhos" para que da próxima vez que seja necessário ir à urgência haja novo "plano de contingência", que é a única maneira de "fugir" do que não se quer, e poder ser atendido como se espera e se merece.
Inacreditável!...