quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Rainha(s)



No momento em que o mundo está suspenso do que se vai passar com a Rainha de Inglaterra nas próximas horas e em que se supõe que o momento do fim está prestes a chegar, não posso deixar de pensar numa outra "rainha" e no tanto que ambas têm em comum, para além de serem da mesma geração e detentoras de uma longevidade que as levou até escassos quatro ou cinco anos de cumprir cem. Uma proeza!
Claro que uma é conhecida e admirada pelo mundo inteiro e a outra é "rainha" num círculo muito mais restrito de quem a conheceu de perto e, principalmente, continua a ser rainha para mim, no fundo meu coração e em todas as  memórias do que vivemos juntas. Claro que uma é nobre e outra é plebeia, mas têm, na verdade,  muito mais em comum do que pode parecer à primeira vista: as duas são exemplos de coragem e de resistência, de força, de generosidade e de bom humor. E por isso deixam uma marca indelével, cada uma na sua dimensão.
Sei muito bem como se vivem estas horas de agonia: sei da aflição de querer estar perto e de tentar de alguma maneira atenuar o sofrimento; sei da impotência de ter a noção que não se pode fazer nada a não ser estar ali; sei da tristeza imensa de pressentir que vamos ter que nos separar sem saber quando é que isso vai acontecer de facto; e de querer por todas as formas mostrar ainda que o amor que nos une é mais forte que tudo.
E também sei como é o que vem depois. Sei como a saudade e a tristeza nos invadem em certas horas e dias; sei da doçura das recordações do que fez a nossa história, sei da preocupação de querer fazer sempre exactamente o que ela gostaria que fizéssemos sem perdermos a nossa individualidade, e do orgulho de termos podido viver tanto tempo em conjunto.
E por mais dolorosas que sejam estas horas finais, o sentimento mais reconfortante que fica connosco todos os dias da nossa vida é que quem foi rainha um dia será, para nós, rainha para sempre.

quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Deliciosamente terno


Um filme que se chama no original Le Temps des Secrets e cujo título título em português se transforma  em "O Meu Verão na Provença" já faz prever uma tradução desastrosa. De facto, para quem, como eu, ouve o original, mas vai passando os olhos nas legendas depara-se com pérolas destas: gibier aparece traduzido como "jogos", quando na realidade deveria ser "caça", que não tem nada a ver e nem no contexto faria sentido, pois tratava-se de montar armadilhas para caçar pássaros. Ou a expressão sauve-toi!, traduzida por "salva-te!", quando na verdade deveria ser "pira-te!" ou "desaparece"! Uma anedota total, pois, e todo um espectáculo de ignorância e de incompetência, que me parece totalmente inadmissível.
O filme, realizado por Christophe Barretier (o mesmo de Les Choristes, 2004) é a adaptação da obra homónima de Marcel Pagnol, terceiro volume das suas recordações de infância e adolescência, situado em termos de espaço e tempo no ambiente campestre das férias de Verão na Provence, nos anos 1905-1906. Trata-se de um retrato doce e melancólico, delicioso e divertido, que nos leva também até às nossas memórias mais remotas, tudo embrulhado de ingenuidade, ternura, cuidado e emoção, que nos faz sentir implicados na narrativa simples e despreocupada  e sonhar diante de magníficas paisagens luminosas e soalheiras e das casas com portadas cor d'azur, tão típicas da Provence.
Não é um filme imperdível, mas mesmo sendo um pouco suspeita, porque França me apaixona e gosto muito de cinema francês, acho que vale a pena vê-lo (ignorando as legendas, naturalmente...)

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

A voz

Impossível deixar passar esta data. Mesmo se o entusiasmo bloguístico esmoreceu muito nos últimos tempos; mesmo se já escrevi inúmeros textos,  - mais de dez -, sobre o assunto, e em particular sobre este dia "histórico" de 4 de agosto.

Mas há coisas que não podem explicar-se.  Por isso não encontro as palavras certas para dizer o efeito que esta voz tem em mim desde que, há muitos anos, a ouvi pela primeira vez. E na vida só encontrei, bem mais recentemente, outra voz capaz de me enamorar, de me embalar e de me emocionar tanto, companhia  de todos os dias, sejam eles mais felizes ou mais sombrios, como uma luz  capaz de chegar ao mais fundo de mim, de aproximar pessoas e de unir corações, de curar desgostos e de sarar feridas, dizendo daquela maneira doce que só a magia da música conhece, o que não conseguimos expressar de nenhum modo.

Nas suas redes sociais Luís Represas veio hoje relembrar-nos a efeméride: "Faz hoje 46 anos que a Música tomou conta de mim. 16 anos de Trovante e mais 30 a Solo. E o caminho continua." Pois para mim é um pouco menos. Não são 46, mas também são muitos: são 39 anos ao longo quais esta voz me acompanha e me seduz, me fascina e arrebata. Imoderadamente. 

Que continue a ser assim por muito tempo. E que bom é haver artistas e vozes que trazem leveza e harmonia aos nossos dias e que nos fazem sentir mais felizes.

Parabéns Luís Represas

(Fotografia de Manuela Santos Silva)

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Eiffel : um filme aquém do esperado



Apesar de ser um filme que se vê com agrado, Martin Bourboulon, o realizador de Eiffel, acentuou a historieta de amor em vez de concentrar o essencial do filme na construção da Torre, o que o tornaria  bem mais interessante.
O reencontro com um amor de passado, que ao que parece existiu de facto, mas não passou disso mesmo, é pois a trama central do filme, relegando quase para segundo plano a história da construção do monumento e essa é, talvez, a grande desilusão para quem esperava ver um filme onde fosse central a polémica que a Torre suscitou na época da sua criação, tornando-se com o tempo um dos mais emblemáticos monumentos não só de Paris, ou de França,  mas do mundo inteiro. 
E mesmo com Romain Duris (sempre extraordinário) e Emma Mackey convincentes nos papéis de Gustave Eiffel e Adrienne Bourgès, mesmo com a interessante reconstituição de Paris do fim do século XIX, o filme sabe a poucochinho, um pouco na linha daquela piroseira chamada Titanic, em que num fundo histórico se cria um melodrama amoroso. Gustave Eiffel terá de facto conhecido Adrienne na sua juventude, mas o reencontro e a motivação para a construção da Torre não passam de ficção.
Valia bem mais, do meu ponto de vista, que a história de amor fosse entre Gustave Eiffel e La Dame de Fer, que foi afinal a ligação que permaneceu para sempre, resistindo incólume à passagem do tempo.

terça-feira, 10 de maio de 2022

Uma ferida no coração de Paris




Jean-Jacques Annaud, conceituado realizador, autor de títulos sonantes como "O Nome da Rosa" ou "Sete anos no Tibete", propôs-se abordar um assunto verídico, recente e por isso mesmo sensível: o incêndio na catedral de Notre-Dame.
Voltei a emocionar-me como me aconteceu há três anos, naquele fim de tarde de 15 de Abril de 2019, quando mesmo à distância a vi a arder e a temi totalmente destruída, tal como cerca de trinta anos antes chorara com o incêndio do Chiado, ou como me invade um certa nostalgia cada vez que volto a Paris e a vejo ainda amputada, silenciosa, e fechada, apesar de continuar de pé. Mas eu sou uma parisiense de coração, trago Paris sempre comigo e, por isso, o filme tinha que me tocar de maneira especial. Era uma inevitabilidade.
Notre-Dame brûle é pois uma história tristemente real cujo final conhecemos, mas não é por isso que é menos empolgante. Porque nela se conta como apesar de tudo foi possível mantê-la erguida, salvar grande parte dos seus "tesouros", permitir que renasça das cinzas, graças ao esforço e à coragem de um conjunto de homens e mulheres - os bombeiros de Paris -  que pondo em risco as suas vidas a salvaram de uma tragédia maior e aos quais o filme parece querer prestar uma justa homenagem.
Ver este filme é também uma viagem de regresso a um lugar que era e é de todos nós, às memórias de todas as vezes em que nos recolhemos no seu interior em oração ou em deslumbramento, em que subimos às suas torres e nos deixámos encantar pela sua história e pela vista da cidade aos nossos pés, em que a olhámos demoradamente, ou que vimos nela um símbolo e uma referência, um tesouro universal, lugar mágico e poderoso onde se juntam numa sintonia perfeita religião, cultura e arte.
Há uma beleza intrínseca ao furor implacável das chamas e uma bravura tensa no seu combate que Jean-Jacques Annaud soube pôr em imagens, num filme em que a catedral e o fogo são os protagonistas e que ele mesmo designou como uma espécie de "docuficção", com imagens reais dos acontecimentos daquele triste dia contados em pormenor e  momentos ficcionados, fazendo uma recriação da incredulidade que todos sentimos perante o que pensávamos que não pudesse acontecer nunca.
É um filme a não perder, absolutamente, para os que amam Paris como eu, mas também para os que gostam de um filme bem feito que, para lá dos meios e desafios técnicos, mostra o horror de um acontecimento real pelo lado dos que o viveram mais de perto e que, apesar de todos os imprevistos, contratempos e indecisões, permitiu o que muitos consideraram  um milagre no meio da desgraça: a catedral resistiu.

segunda-feira, 9 de maio de 2022

Aniversário de "isto e aquilo"

 

Lembrei-me agora, de repente, que "o meu mais velho" celebrou anteontem mais um aniversário. Dez anos e 1353 posts depois, aqui vamos resistindo à passagem do tempo, embora já não com o mesmo entusiasmo que têm todos os inícios.
Na verdade, a falta de tempo, a falta de paciência, ou simplesmente, o facto de não saber sobre o que escrever e ter às vezes  a sensação que é sempre um pouco sobre as mesmas coisas que me detenho, faz com que passem muitos dias sem nenhuma publicação.
Como sempre, evito o mais óbvio: não quero falar da guerra da Ucrânia que nos traz a todos inquietos e abismados, nem da inflação, do calor excessivo para a época, da crise, ou de qualquer dessas coisas.
Mas agora que os dias de sol e a aproximação das férias prometem novo ânimo pode ser que me volte a apetecer andar mais por aqui, porque escrever é na verdade, apesar de tudo, uma coisa que me dá prazer e que não pretendo deixar de fazer.

domingo, 1 de maio de 2022

Juntos outra vez

Era um dos seus grande prazeres. Era assim há muitos anos. Sentava-se na sua frente e durante cerca de duas horas era como se o mundo e o tempo parassem e a realidade fosse só aquela viagem a um lugar de sonho, uma viagem de emoções, percorrendo histórias e sensações, sentimentos e memórias, feita de  música e de palavras que a levavam por muitos lugares;  e sentia-se bem, porque tudo era doce e bonito como aquela voz que a embalara a vida inteira, que era casa e conforto, que apesar da passagem do tempo continuava única e límpida, que sempre a hipnotizava como se houvesse nela uma luz ou um feitiço qualquer, que era capaz de a levar até ao mais fundo de si. Por isso os momentos assim eram inexplicáveis para quem não os vivia; por isso, num instante se passava do riso à cumplicidade, à memória, à comoção, tudo só sensibilidade à flor da pele, tudo tão verdade, que até parecia mentira. Poucas coisas a faziam tão feliz.

Mas naquela noite do último dia de Abril a magia do que se passou fora ainda mais especial. Talvez porque o que se passara nos dois anos em que não tinham podido olhar-se e sorrir ou abraçar-se sem medo, nem máscaras, nem distanciamentos prudentes parecia agora ter terminado, talvez porque havia naquele ambiente de festa uma alegria implícita de celebração da vida, ou porque os anos e as vivências em comum tinham apertado os laços e aprofundado sentimentos, e o que começara por ser uma voz de que se gosta se tornara com o tempo parte da família afectiva, aquela que é para levar para sempre coladinha ao coração, ou também porque em véspera de um "Dia da Mãe" vivido em ausência pela primeira vez, aquela noite inesquecível lhe tinha sabido a colo e a amor.

Obrigada, Luís Represas!

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Palavras que já não se aguentam (I) - O "empoderamento"


Há palavras que de tão repetidas, a propósito ou  a despropósito, se vão gastando e chegam ao ponto de já não se poder ouvir, perdendo por isso o seu valor, significado, força.

O "empoderamento" é um desses casos. Recentemente muito associado à causa feminista e à defesa da igualdade de género, o termo tem servido para tudo e mais alguma coisa e tem sido usado de forma excessiva e indiscriminada por quem se pretende fazer notar, com razão ou sem ela. Nada contra o princípio subjacente, nem contra qualquer tipo de autonomia associado a poder de decisão próprio sobre liberdades várias após muitos anos de machismo, de desigualdades, e de luta para os combater.

Mas, sinceramente, é uma palavra, entre muitas outras, daquelas que já não posso ouvir e que me fazem sempre olhar com certa desconfiança para quem a profere a propósito de tudo e mais alguma coisa. É que o seu uso imoderado pode até levar a acentuar aquilo contra o que se quer lutar.

Pior que o empoderamento, mas na mesma  linha, só mesmo a "sororidade". E da mesma maneira que me irritam muito as pessoas que dizem não gostar de homens ou de mulheres, mas de "pessoas", também não aprecio nada esta ideia de "mulheres unidas jamais serão vencidas" numa espécie de conspiração contra o sexo oposto, porque creio na verdade que os homens precisam das mulheres na mesma medida do seu contrário e  acredito que só juntos (as "pessoas") podemos mudar alguma coisa. 

segunda-feira, 7 de março de 2022

Aniversário


Fazer anos, para mim, é sempre uma grande festa. Gosto de fazer anos, porque há muitas coisas boas que me fazem feliz e porque a vida é sempre para celebrar.
Este ano, pela primeira vez, não tenho a minha mãe fisicamente comigo, mas ela continua presente, todos os dias, na minha memória e no meu coração; e tê-la tido durante tanto tempo é muito maior e melhor do que a falta que agora, às vezes, ainda sinto que ela me faz.
E depois, não me posso queixar de nada. Tenho saúde, trabalho, uma casa linda pela qual vivo apaixonada e onde me sinto muito bem, alegria, felicidade, o mar aqui ao pé, este magnífico sol de Lisboa, e mais coisas... Na verdade, não me falta nada.
Mas o mais importante de tudo são os afectos. São as pessoas que eu amo e me fazem sentir querida, é um leque de amigos que me mima muito,  que me apoia e  compreende, mesmo quando não concordamos, que me aquece a alma; é esse lado mais sorridente da existência, que faz que ela valha verdadeiramente a pena. Acho que nunca saberei agradecer-lhes com palavras tudo o que me dão, mas nestes tempos em que o mundo parece que ficou louco de repente,  viver a tranquilidade deste dia cheio de amor é um oásis de paz, que me faz sentir abençoada e muito, muito, agradecida.

quinta-feira, 3 de março de 2022

Bardem: um actor sublime

Quase vinte anos depois do memorável Los Lunes al Sol (2002), a dupla Fernando Léon Arenoa (o realizador) e Javier Bardem (o protagonista) voltam a reunir-se num filme que tem como pano de fundo o mundo laboral e que já lhes valeu seis prémios Goya: melhor filme, melhor actor, melhor realizador, melhor montagem, melhor música, melhor guião original.

Javier Bardem é um dos mais notáveis actores espanhóis e, na verdade, todo o filme é ele. Aqui, como o "patrão", dono de uma empresa familiar de balanças industriais, "Basculas Blanco", numa interpretação magistral que nos faz conseguir empatizar com a personagem, apesar do seu lado cínico, manipulador e sem escrúpulos, disposto a tudo para atingir determinados fins e manter as aparências.

Há actores que fazem qualquer filme valer a pena. Javier Bardem é um deles. E, mesmo muito bem acompanhado, como é o caso, com Manolo Solo, Almudena Amor, Óscar de la Fuente, é por ele, sobretudo, que vale a pena ver esta sátira social, plena de humor e malícia, um comédia negra deliciosa, muito divertida e com momentos verdadeiramente hilariantes.

E que bom que é voltar ao cinema!

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

É o que é

Por estes dias em que se aproximam os meus anos, dou comigo a pensar como a vida se vai construindo consoante as opções, boas ou más, que vamos tomando ao longo dos anos, em função da nossa maneira de ser e de circunstâncias várias. É nesta altura do ano em que os dias ficam maiores e a temperatura amena nos faz sonhar com evasões e outras paragens, que eu páro para pensar no que tenho, no que sou, de onde venho e para onde quero ir.

E apesar de ser já considerável o caminho percorrido, não me vejo muito diferente do que sempre fui, apesar das cicatrizes e nódoas negras que se vão ganhando, do que a experiência nos modifica e o tempo nos ensina, de corrigirmos e alterarmos algumas formas de ser e estar. Mas nem o vivido me pesa, nem me posso queixar. Vou encontrando encanto em cada nova etapa e continuo a gostar de ser como sou, imperfeita e inquieta, sensível e emotiva de forma imoderada apesar de poder parecer uma "durona" à primeira vista, muito dada a mimos e a meiguices, organizada e desconcertante, razoável e excessiva, alegre  e arrebatada, "bocazas" e amalucada, leal e sonhadora, cheia de virtudes e de defeitos como toda a gente, "senhora do seu nariz", conservadora e ousada, convicta e apaixonada, com muito que melhorar, com todos os afectos que a vida me trouxe, que são a minha maior riqueza, e incluem também quem ficou pelo caminho e os laços que não quero nem posso desatar e me são fundamentais para me sentir querida e feliz. 

Amo as cores pastel, com o azul claro em destacadíssimo primeiro lugar, as línguas, as artes e as letras, tal como gosto de pessoas e de cidades, de mar e de sol, de ouvir chamar o meu nome e de andar a pé, de abraços apertados e de festas no cabelo, de regressar a casa, de conversas entre amigos noite dentro e de manhãs de preguiça, do primeiro café do dia, de voltar a Paris e a Sevilha, do dia dos meus anos.

Assumo os meus defeitos, medos e vulnerabilidades, procuro sempre mais e melhor e sei que, no fundo, sou boa pessoa e, modéstia à parte, sei também que quem me descobre os "encantos secretos" gosta de mim de verdade.

Agora que o meu mês de Março está quase aí, vejo-me outra vez mais perto do sol e do mar e sonho com as minhas cidades, - as de sempre, que são casa e colo, e as que espero poder conhecer pela primeira vez e descobrir devagar,  - porque ver, experimentar e aprender continua a ser o que me move e apaixona. E espero que seja sempre assim.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Sabores de infância : a pêra-rocha

Por motivos vários, tenho andada arredada da escrita e deste mundo bloguístico, que caiu um pouco em desuso nos  tempos  apressados que vivemos, em que o instantâneo  e o imediato se nos impõem como uma condenação.

Regresso hoje aqui, pela primeira vez em 2022, mas evito o assunto do momento. Não, não vou comentar os resultados eleitorais, nem que seja por gostar de escapar ao mais óbvio.

Hoje, uma pêra-rocha à hora de almoço, soube-me a praia. Parece uma estranha associação, mas não é assim tão descabido. A minha mãe, sempre atenta à comida saudável, na qual a fruta tinha lugar de destaque, costumava muitas vezes levar pêra-rocha para a praia. Era pois frequente, depois do banho de mar, sentarmo-nos nas toalhas, ao sol, a trincá-las vagarosamente.

Não havia cá "bolas de Berlim" para ninguém, apenas as batatas fritas nos eram permitidas, mas não sempre,  e/ou um "Olá fresquinho", muito de vez em quando. É talvez por isso que não sou de todo fã das "Bolas de Berlim", nem percebo o sentido que faz comê-las especificamente na praia. 

É que, para mim, para além do cheiro do creme Nívea, é o sabor adocicado das pêras - rochas que me leva de volta à praia e de certo maneira me evoca esses dias em que o tempo parecia passar mais lento, e todas as manhã e tardes de Verão, com sabor a despreocupação, a sol, a vento e a mar.

Ai meu Deus, parece-me que estou um pouco Proustiana. Ou talvez não...