sexta-feira, 28 de setembro de 2018

A Banha da Cobra


Por motivos que não vêm ao caso, cheguei ao tal "Curso de Escrita Criativa" em que me tinha inscrito por curiosidade na sua quarta sessão. Mas só aguentei uma hora. Na verdade aquilo a que assisti é muito pior do que alguma vez poderia imaginar.
Explico sucintamente do que se tratava. O senhor que dava o curso e se intitulava "escritor", embora eu nunca tenha ouvido falar dele, tinha um convidado que era uma daquelas pessoas polivalentes que são tudo: escritor, cineasta, jornalista, pintor, professor universitário. Este convidado, cujo nome não vale a pena referir para não publicitar a mediocridade, esteve durante uma hora (foi o tempo que eu consegui aguentar, embora a sessão estivesse programada para duas horas) a debitar banalidades e lugares-comuns, enquanto ia aproveitando para fazer a propaganda dos seus "romances" e workshops, deixando clara a ideia de que ele era uma grande escritor, uma espécie de iluminado mesmo, e falando da boa e da má literatura sem nunca definir exactamente o que distinguia uma da outra. A assistência, composta maioritariamente pela faixa etária acima dos cinquenta anos, ouvia-o com ar interessado e, para meu grande espanto, tomava muitas notas.
O que ele dizia eram coisas deste género: "O romance está para a escrita como a maratona está para a corrida"; ou "eu não invento as personagens. Elas já existem. Eu só as encontro". Ou que os bons romances são os que demoram muito tempo a escrever (ele leva seis ou sete anos a escrever um romance, donde se depreende que os dele são bons) e os que têm "universalidade" e "autenticidade", isto é, que permitem que os leitores se revejam neles. Com exemplos das suas obras, claro,  e tudo pontuado por muitos "eu, pessoalmente" e "na minha opinião pessoal".
Quando cheguei a casa fui logo pesquisar em que faculdade o dito "escritor" dava aulas. Só podia ser na Lusófona, como eu já suspeitava. Mas o cúmulo, para mim, foi quando o "escritor" titular disse também que não usava palavras difíceis nas suas obras para não obrigar o leitor a ter que ir ao dicionário, embora houvesse escritores que o fizessem por necessidade de mostrar "erudismo" (Juro que ele disse isto!!!...).
Quando ao fim de uma hora destas e outras barbaridades fizeram um intervalo para "fumar um cigarro", eu decidi que a minha incursão pelo "Curso de escrita criativa" terminava ali. E pergunto-me: se eu sentar algumas pessoas  na minha frente e for dizendo disparates, posso dizer que estou a dar um "Curso"?
É certo que fazer uma avaliação baseada apenas nesta reduzida "aventura" pode ser um pouco precipitado porque baseado numa análise superficial, mas não consegui suportar aquela espécie de tortura por mais tempo. Generalizar pode também não ser justo, mas confesso que fiquei sem qualquer vontade de repetir a experiência. Um curso desta natureza, para ser sério, tem de ter obrigatoriamente uma componente prática que não me pareceu existir ali de todo, até porque isso é incompatível com um número de inscritos tão substancial: 80, naquele caso...
Aquilo a que assisti ontem não passa, portanto, de uma fraude, de contornos um pouco perigosos na medida em que pode induzir em erro muitos incautos, que consiste em chamar "literatura" e "escrita criativa" ao que não são mais do que "baboseiras"...

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Abuso(s)



Por educação, por mania, ou seja lá pelo que lhe quiserem chamar, não sou pessoa de tratar toda a gente por tu. E, do mesmo modo, também não gosto muito que pessoas que não me conhecem, ou que me conhecem mal, me tratem logo assim. 
Há hoje uma tendência, que as redes vieram potenciar, de mal se estabelece um contacto, mesmo virtual, partir-se do princípio que algum laço de amizade nos une e que algumas "confianças" são naturais e permitidas. Detesto esses excessos... 
A amizade, para mim, é muito especial e quase sagrada. Mas consolida-se no tempo, devagar e com subtileza,  na doce magia de descobertas intuídas e intimidades partilhadas, no encantamento do que nos contamos ou do que calamos, na alegria de nos irmos conhecendo, encontrando afinidades, surpreendendo e maravilhando, ou decepcionando, ao longo do tempo. 
Já tenho dito muitas vezes: no meu coração não cabe toda a gente, porque quem lá está ocupa um espaço enorme. E se é verdade que os amigos, como os amores, passam por nós ou vêm para ficar, não é menos verdade que quem entra no meu círculo mais íntimo - ou quem sai dele - decido eu!...

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Escrita criativa?



Numa altura em que cada vez mais toda a gente tem a mania que "escreve" e anseia publicar o seu próprio livrinho, de um preferência um potencial best-seller, prolifera o negócio dos "cursos de escrita criativa", que tanto podem ser presenciais como online e, se calhar, haverá mesmo os que vêm na "Farinha Amparo". 
Sou, em relação ao assunto, absolutamente céptica. Porque escrever, como dançar, pintar, cantar ou representar, para dar apenas alguns exemplos, é antes de mais um talento natural, que se tem, ou não. Tomemos como exemplo a dança: eu posso aprender a técnica do flamenco, para referir um género pelo qual tenho especial apreço, mas mesmo sabendo-a muito bem, - o que já de si me parece uma tarefa dificílima, - não me torno uma bailarina do Ballet Nacional de Espanha, nem sequer de uma qualquer companhia de quinta categoria.
O mesmo é válido para a escrita. Não é por escrever assim ou assado que me transformo num(a) escritor(a). Ora, os cursos de "escrita criativa", seja lá isso o que for, pressupõem, julgo eu, uma espécie de "receita" que se deve seguir. E isso parece-me até um pouco perigoso e sei mais ou menos do que falo, pois além de um curso de Literatura tenho mais de trinta anos de experiência lectiva em Português e sei muito bem que escrever e tentar desenvolver o gosto pela escrita pressupõe, antes de mais nada, ler. Ler muito. Como actividade anterior e paralela, também. E depois é preciso entender o poder das palavras, deixar-se enfeitiçar por elas e pela sonoridade própria de cada texto, pelo seu ritmo, que é afinal o que constitui o seu encanto, mais do que a "história" que nos é contada. E perceber o poder transformador da leitura e da palavra em nós, o modo extraordinário como nos permite conhecer o mundo e conhecermo-nos a nós próprios.
Escrever é uma aprendizagem, como tudo na vida, mas escrever bem é uma aptidão que está para lá das técnicas e de toda a prática possível. Porque hoje publica-se muito, mas em geral o que se vende é "porcaria". Os livros que nos tocam e empolgam são os que têm na sua prosódia uma fulguração qualquer, que faz a diferença. E isso, convenhamos, é privilégio de quem já nasce com o dom.
Em todo o caso, a minha curiosidade relativamente ao fenómeno dos "cursos de escrita criativa" levou-me a inscrever-me num (gratuito, claro está) para ver o que se ensina e/ou aprende por lá. Prometo, depois, contar tudo...

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Um sedutor


O último filme que vi tem o sugestivo título de Juliet Naked ("Juliet nua")  e não é nada do que o título poderia fazer supor. O que me levou a vê-lo foi ter no seu elenco um actor de que gosto muito, apesar de nunca conseguir pronunciar o seu nome: Ethan Hawke. É, na minha opinião, um daqueles casos sérios de talento e versatilidade, para além de haver qualquer coisa nos seus olhos que me seduz, mistura perfeita de malandro e de menino bom. É o protagonista da trilogia (Before Sunrise, Before Sunset, Before Midnight) que faz parte dos "filmes da minha vida". Por isso, vejo qualquer filme em que participe, mesmo correndo o risco de achar depois que não valeu a pena.
Mas voltou a não ser o caso, desta vez. Juliet Naked, uma co-produção britânica e americana, realizada por Jesse Peretz  numa adaptação do romance homónimo de Nick Hornby, não é um grande filme. E, no entanto, é uma agradável surpresa. Trata de relações entre as pessoas, como eu gosto. De ligações que se arrastam no tempo só porque sim. De desencanto e de esperança. De ilusão e recomeço. Não se trata pois de sexo, nem de nudez, mas antes da complexidade das relações humanas e de como vamos guiando as nossas vidas.
Ethan Hawke, com o seu brilhantismo discreto, e também Rose Byrne com quem contracena, contribuem em grande medida para dar às personagens uma vertente humana credível e tocante.
Vale a pena ver!...

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Algures, numa cidade...



É conhecido o meu amor pelas cidades, às quais sou capaz de me ligar com dedicação e afecto, como faço com as pessoas. Gosto dos seus cheiros, luzes e cores, do traçado mais ou menos labiríntico das ruas, da calma e do movimento, de observar  quem passa, das tonalidades que marcam as várias horas do dia e da noite, de adivinhar como será viver nelas. Gosto de deixar que me seduzam devagar, em interminável namoro, que a cada vez me traz a familiaridade do que já se conhece e o espanto do que é capaz de continuar a surpreender-nos.
E, como no amor, delicio-me a contemplá-las, deixo-me arrebatar sem dar pelo tempo passar e sento-me em silêncio muitas vezes, como quem se abriga num colo conhecido, deixando-me envolver pela serenidade desse doce encantamento.
É por isso que, com excepção do mar, que me tranquiliza e atrai, não necessito da natureza em estado puro para descansar, ou reconfortar-me.
Há em todas as cidades que eu amo pequenos redutos de silêncio e sossego onde me refugio para me perder, para me encontrar, ou simplesmente ficar, sem pensar em coisa nenhuma, em momentos que depois gravo na memória para horas de desgosto, desencanto, aflição. Podem chamar-se Jardim da Estrela ou Príncipe Real,  Place des Vosges ou Luxembourg, Parque Maria Luísa ou Retiro, Vondelpark ou Tiergarten, Minnewater ou Begijnhof; mas para lá das particularidades de cada um, que os tornam únicos e especiais, todos me enchem de uma satisfação interior que  dá um novo alento aos meus dias.

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Não havia necessidade...


No Verão, tenho o hábito da leitura em versão original das línguas que domino, e já não é a primeira vez que sigo sugestões dadas em programas de televisão credíveis. Foi assim que decidi ler o livro espanhol da moda, ao que parece, já que para além do número de exemplares vendidos, o que não quer dizer nada, ou talvez sim, vi pelo menos duas espanholas na praia a ler o mesmo livro que eu.
A autora, Elisabet Benavent, era para mim uma total desconhecida: espanhola, da zona de Valencia, 34 anos, com formação na área da comunicação, uma coluna na revista Cuore, um blogue/site chamado @BetaCoqueta e dezassete livros publicados desde 2013, com grande sucesso editorial.
Fuimos Canciones, publicado no início de Abril de 2018, é o primeiro volume de uma história que continua em Seremos Recuerdos, publicado cerca de um mês depois, que eu já não li.
A história desenvolve-se em em cerca de 500 páginas e não é mais que o dia-a-dia de três amigas na casa dos trinta, com o sexo como leitmotiv. 
O livro lê-se rapidamente, mas não convence. E, acima de tudo, as cenas libidinosas, que ocupam cerca de 85% da história, são detalhadas até ao mais ínfimo pormenor, com um grau de minúcia que me parece excessivo e escusado. Vejamos um excerto, escolhido ao acaso:
(...) pero por alguna razón Jimena no quería que parara. Y le fallaba la voz de tanto pedirle que no lo hiciera, de pedirle que hiciera más fuerza con sus dedos alrededor de sus muñecas y de desear que el cinturón siguiera golpeándola con el vaivén de las caderas de Samuel. (...) Qué más daba que ella "no se hubiera ganado" que él se desnudase del todo? No quería. Quería que siguiera montándola durante toda la noche de aquella manera, usándose el uno al otro sin importar los detalles(...).
Cuando se corrió, el alivio fue casi doloroso. Él soltó una de sus manos, mientras sussurraba en su oído que quería que se tocara para él, que se corriera y le empapara la ropa. Y ella obedeció hasta que no quedó una gota de su excitación por compartir..., obedeció hasta que el orgasmo se esfumó y tocarse le dolía. Hasta que él paró, salió de ella, se quitó el condón y terminó sobre su pubis, en sus muslos, y salpicó su estómago de semen. 
Tudo o resto me parece, também, francamente medíocre. Até a relação do título com a história é forçada e ineficaz:  cada capítulo tem o nome de uma canção conhecida, seguindo aquele princípio de que para cada momento há sempre uma canção. Enfim, tudo muito poucochinho...
E enquanto lia este livro não pude deixar de pensar em Mario Vargas Llosa, que consegue escrever páginas do mais profundo erotismo sem necessitar ser demasiado explícito, ou vulgar.  Provavelmente é isso que distingue a literatura enquanto forma de arte daquilo que não o é, e que será, quando muito, apenas puro entretenimento, de melhor ou pior gosto.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Cidades que enamoram (I)



Há nesta cidade colorida e festiva uma contagiante energia que parece tornar a vida mais leve e airosa. Aqui, gosto de voltar pelo menos uma vez por ano para me sentir em paz.

sábado, 8 de setembro de 2018

Regressar ao passado




Quando eu era pequena, os meus avós paternos tinham uma casa de férias na zona de Abrantes de onde eram originários, embora na época vivessem na Baixa, em Lisboa, havia já largos anos. 
A casa tinha sido concebida pelo meu avô apesar de ele não ser arquitecto e, por isso, era para toda a gente um lugar especial, excepto para a minha mãe, tão citadina como eu, que abominava o "campo", e para quem aquele mês de Agosto passado com a família do meu pai, longe da "civilização", era um enorme aborrecimento.
Para mim e para a minha irmã, no entanto, os dias inteiros passados ao ar livre e em contacto com a terra, literalmente, eram sinónimo de aventura e liberdade.
Fazíamos a viagem de comboio, a partir de Santa Apolónia, e tudo me parecia grandioso: os comboios, a duração do percurso, a quantidade de bagagem que transportávamos, a azáfama das partidas e o mistério que encerram, por mais que fosse familiar o destino e as rotinas que nos esperavam.
Depois, os meus avós morreram e acabaram-se as férias no "campo", teria eu uns oito anos, mais ou menos. A partir daí, raras vezes voltámos a Alferrarede e a casa acabou mesmo por ser vendida passados alguns anos. Nunca mais lá voltei. Mas conservei sempre memórias desse lugar de infância, com todas as cores, cheiros, sons, sabores e episódios mais ou menos marcantes de um tempo tão longínquo.
Em Dezembro passado, por uma feliz coincidência, voltei a Abrantes num dia cinzento e de chuva miudinha. Tinha ainda uma vaga ideia do castelo e da vista sobre a cidade, mas não recordava mais nada. Só o sabor das tigeladas e da "palha" me souberam ao tempo da infância. E, como era mesmo ao lado, acabei por ir também a Alferrarede. A terra estava já muito diferente, mas a rua e a casa das antigas férias de Verão continuavam quase iguais, como se ali o tempo  tivesse parado inexplicavelmente. Lá estava a mesma passagem de nível onde íamos ver passar os comboios que tanto fascinavam o meu pai, o campo muito verde ao lado da casa, de onde se via o castelo, o empedrado incerto da rua lateral com ares da província, e até o portão verde em cujo degrau fingíamos estar sentadas no autocarro apenas perdera o JM prateado - as iniciais de João Mouzinho -, que o meu avô exibia com indisfarçável orgulho.
A senhora que comprou a casa e vive lá agora, vendo-me rondar a casa e espreitar o quintal de forma descarada, apareceu intrigada a perguntar se queria alguma coisa. Expliquei-lhe quem era e o que me levara ali. Então ela, que tinha conhecido o meu avô, convidou-me a entrar com a natural simplicidade que só as pessoas da aldeia conseguem ter e mostrou-me tudo: a casa, o quintal e a horta; o poço, o tanque e a nora; as laranjeiras que o meu avô plantou e ainda dão excelentes laranjas; e aquele espaço enorme, que antes me parecia uma floresta sem fim e um mundo de magia, arrojo e descoberta.
Que incrível emoção essa viagem no tempo, feita não só com a cabeça, mas com o coração e o corpo inteiro!... Comoveram-me as histórias da família, os elogios ao meu avô, a simpatia com que fui recebida naquela casa que fora nossa durante tanto tempo e, acima de tudo, ver como tanto do que eu vivera naquele lugar permanecia quase intacto: os canais da rega que eram um oceano para os nossos barcos de papel, o palheiro onde dormia o burro que andava à nora para tirar a a água do poço, o tanque que para nós era também piscina, a cozinha com um enorme fogão, tudo com o mesmo ar ainda antigo como se os anos se tivessem demorado mais ali e quase não tivessem passado.
Foi um dia que não poderei esquecer. Não por saudosismo, nem por nostalgia desse passado que tinha coisas boas e más, como é próprio de todos os tempos. Mas  recordar lugares, pessoas, histórias e momentos nossos, não faz mal nenhum. Porque a memória também é uma coisa boa; e porque é bom revisitar o que de alguma forma nos pertence e foi fazendo de nós muito do que somos.
Depois daqueles Verões de infância em Alferrarede, a minha ligação ao campo desvaneceu-se para sempre. Mas talvez o que revivi ali, naquele dia cinzento de Dezembro, me tenha ajudado a entender o prazer que sinto em voltar muitas vezes aos lugares que me tocam, seduzem, encantam.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Mariquices


Não sei explicar este fenómeno. Será uma questão de idade ou outra coisa qualquer, mas a verdade é que à medida que o tempo passa me parece que vou ficando mais sensível e dou comigo a emocionar-me por tudo e por nada: uma canção, um  filme, uma passagem de um livro, uma qualquer situação do quotidiano, ou apenas um gesto carinhoso, um abraço apertado, uma lembrança, uma atenção, chegam para me comover.
Também é verdade que, com o passar dos anos, passei a assumir isso sem nenhum pudor; e lembro-me, muitas vezes, do meu querido Paulo Portas que disse, a propósito das suas lágrimas por ocasião da morte do irmão, que elas são naturais e não denunciam fragilidade, mas apenas afecto e sentimento. Não é esse, afinal, o nosso lado mais humano?

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Voltar



E já voltou Setembro, mês de recomeços e alterações, de novos caminhos e de outros desafios, entre a nostalgia do que fica para trás e o deslumbramento do que está por começar.
Encontro sempre um prazer especial na rentrée, gosto da novidade e da mudança, ainda que o risco seja sempre mais ou menos calculado, porque não sou exactamente aventureira, ou radical. Apenas procuro não manter durante muito tempo uma rotina sempre igual, com hábitos e gestos que de tão repetidos acabam por perder o sentido. Tenho uma alma inquieta e sonhadora, não sei se pela minha natureza, se para cumprir, talvez, o que se diz do meu signo, embora no fundo não acredite muito nessas coisas.
Enfim, há nas pequenas ou grandes transformações a ideia de que o melhor é o que ainda virá, a esperança de tudo poder ser diferente, nem que seja só um bocadinho, e logo melhor ainda, sem esquecer que muito do que vai sendo a nossa vida depende quase só de nós.
É também um pouco por tudo isto que depois de mais de dois meses de silêncio e “a pedido de várias famílias”, mas acima de tudo porque me apetece outra vez, regresso hoje à escrita e vou ficando por aqui, sem pressa nem obrigações, que é como eu gosto de tudo na vida, dando-me tempo para este encontro comigo e com quem passa, sem deixar de estar atenta ao mundo à minha volta e esperando que um quotidiano mais ou menos apressado não impeça nunca o espanto e a alegria das coisas simples e boas.