sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Aquele abraço


Já não era o tempo de morrer de amor. E no entanto, nada lhes parecia mais perfeito do que os momentos de intimidade em que não havia nada a não ser eles os dois, e a vontade urgente de se terem um ao outro e de ficarem assim, agarrados para sempre, no calor de um abraço que lhes sabia a paraíso e a eternidade.
Eram esses momentos só deles, vividos entre aconchegos e afagos, tudo só pele, toque, emoção e sensualidade pura; era aquele amor desmedido, que lhes acontecera sem esperas nem anúncios prévios, como um destino a que não se pode escapar, e que durante tantos anos fora prisão e liberdade, desconcerto e calmaria, desatino e redenção; era tudo isso, bom e mau, incompreensível e insensato, que fazia a vida valer a pena.
Às vezes era até um pouco assustadora a força com que se queriam, a urgência de se perderem no corpo um do outro, a vontade de se descobrirem e se terem para lá de tudo o que já era deles e mais ninguém conhecia.
Tinham aprendido a entender-se em silêncio, a conhecer-se nos risos e nos olhos, em todos os humores, manias, ânsias e formas de ser, a sentir-se perto mesmo quando estavam longe, a aceitar-se em tudo, a saber-se fragéis e imperfeitos, como os demais.
E tinham a certeza que, para lá de tudo o que ia acontecendo nos dias e anos das suas vidas, não havia prazer maior que o dos seus corpos confundidos, nem melhor abraço ou companhia; e que, por isso, fosse como fosse, haveriam de continuar a tomar conta um do outro para sempre. 

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