domingo, 1 de novembro de 2015

O que nos fica dos que partem


Não tenho de todo o culto dos mortos, não gosto de visitar cemitérios em circunstância alguma, e menos ainda nestes dias em que vai toda a gente. Respeito muito, no entanto, quem o faz.
E, contrariamente aos que conseguem encontrar beleza e paz nestes espaços, só vejo neles soturnidade, assim como, para mim, há em todos os rituais associados ao fim da vida terrena qualquer coisa de lúgubre que me impressiona e incomoda. 
Não sinto, por isso, necessidade ou desejo de levar flores aos mortos, porque é em vida que gosto de homenagear e mimar as pessoas a quem quero bem; nem é no cemitério que me sinto mais perto dos que já cá não estão, porque não os associo a tristeza nem a desconforto.
Dos que partiram ficam-me as recordações, as ideias, as acções, os ensinamentos e tudo o que de bom e mau fomos vivendo ao longo do tempo, que é a marca indelével que deixaram em mim. É com ela que vivo. É ela que, passada a surpresa inicial do momento da partida - a morte surpreende-nos sempre - a dor da perda, o momento do luto, no-los traz de volta, em lampejos fugazes que nos chegam através de um lugar, de um objecto, de uma palavra, de uma canção. E lembrá-los assim é a mais bonita e singela forma de os voltar a ter próximos, no pensamento e no coração.

(Fotografia de Paulo Abreu e Lima)

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