segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

O dom da escrita



Os medos de toda a gente
Medo. M-E-D-O, quatro simples letras fazem uma palavra muito forte. O medo está em todos nós, mesmo que esteja muito escondido.
Eu tenho medo de aranhas. Quando estão por perto, tento ignorá-las, senão sai um grito bem agudo.
O escuro, para mim, é outro obstáculo, sobretudo quando estou sozinha, ou é de noite.
Ler ou escrever acalma-me. O barulho da caneta a roçar no papel, ou o som do virar da página, é relaxante para mim. Cá está uma coisa de que não tenho medo: exprimir-me através da escrita.
Se quem lê este texto também tiver medo, escreva.
Neste momento ouvi um grito!!! Olhei em redor; nada! Se calhar foi um grito da minha mente, a chamar por alguém que não existe...Ou então foi a despedida do medo, porque já viu que é mais difícil agarrar-se. Mas eu sei que ele há-de voltar. Volta sempre, ou então nunca se vai embora de verdade.


No meu jardim
Os esconderijos escasseavam. Os tiros e passos ecoavam de todos os lados. Nenhum sítio parecia seguro. Mas aquela casa acalentava a esperança do grupo de coelhos.
Num dia soalheiro, naquela hora quente, a pequena família decidiu entrar. Por um buraco da rede, esgueiraram-se para o grande jardim. Tanta relva. Tantas flores. Tantas bolotas. Para eles era o paraíso.
Habituados a viver entre matos de verde e castanho, aquele jardim era delicioso.
Passos miudinhos acordaram-nos do devaneio. Estacaram. Desapareceram tão misteriosamente como vieram.
E os coelhos, cautelosos, foram percorrer a propriedade. Terrenos a perder de vista. Bolotas a rolar pelas rampas íngremes. Árvores com copas cheias de pássaros a fazer gorjeios.
Os passos voltaram. Tão rapidamente como da primeira vez. E um rosto pequenino apareceu lentamente. Com os olhos esbugalhados de curiosidade. A pouco e pouco, perceberam que aquela família não lhes faria mal. Pelo contrário. Admirava-os.
Os coelhos, com um pouco de pesporrência, aproveitavam-se disso. Todos os dias, no grande jardim, brincavam e corriam. E a menina todos os dias olhava para eles. Os animaizinhos sentiam-se protegidos dentro do globo quente daqueles olhinhos curiosos.
(Maria S. M. Coelho)

Escrever, como cantar, dançar, ou pintar, é um dom que já nasce connosco e pode depois ser ou não desenvolvido, até que mais cedo ou mais tarde acabe por revelar-se. 
Toda a gente pode aprender a escrever, a cantar, a dançar, a pintar, ou seja lá o que for, porque há a técnica, claro está, mas nunca o fará da mesma maneira como quem o faz com alma, vindo do lado de dentro, do mais fundo de si.
Vejamos este exemplo: estes são dois textos de uma menina que tem apenas dez anos. Pode já ter lido muito - sei que o fez -  e isso é uma bela ajuda. Mas ser capaz de, com tão pouco tempo de vida, ter este domínio das palavras, esta sensibilidade e uma tão grande capacidade reflexiva é, sem dúvida, ter um talento especial. Temos artista!...

2 comentários:

  1. Muito talento, sem dúvida. Fiquei impressionada. :)

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    1. É de facto impressionante, Luísa. Desde muito pequenina tem um domínio fantástico das palavras. E adora ler. Com dez anos, já leu vários livros de Júlio Dinis (que já quase ninguém lê - e gostou), o Mundo de Sofia, O Mistério da Estrada de Sintra. E são só alguns exemplos. Já leu Mia Couto e muitos mais considerados literatura de adultos.
      E depois, escreve assim, esta mistura de maturidade, de imaginação e de sensibilidade. Uma raridade!... :)

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