segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Hierarquia dos Meses



Há o tempo sequencial e o tempo "psicológico". O primeiro dividimo-lo com rigor, arrumado em horas, dias, meses e anos. Mesmo sabendo que tudo é relativo no tempo e no espaço, que vivemos cada momento em função da impressão que nos causa, tenho um fascínio pelo tempo, um deslumbramento pelo seu carácter passageiro e por tudo o que nele é igual e ao mesmo tempo diferente, pelo tempo que corre e  pelo momento presente, que procuramos tanto quanto possível viver em plenitude.
Não sei se isto acontece com toda a gente, mas tenho em relação aos meses do ano as minhas preferências; e consigo, até, na minha cabeça, atribuir cores a cada um deles.
Para lá do que estabelece o calendário, a minha hierarquia organiza-se, pois,  assim: 1 - Março. É o meu mês, aquele em que eu nasci e em que começa a Primavera e, por isso, nessa altura tudo me sabe a novidade e a recomeço. É um mês de luz intensa, mas não exagerada, amarelo como o sol e azul como o céu e o mar. Com ele regressa a alegria e o optimismo, a intensidade das cores e dos cheiros, os sentidos mais atentos à beleza do mundo. 2- Junho. Se pudesse escolher como quero, Junho seria sempre o meu mês de férias. É o mês de Lisboa e, também por isso, só apetece ar livre e liberdade. Entre Março e Junho fica toda a Primavera e essa é, claramente, a altura do ano em que sou mais eu. Junho cheira a manjerico e sabe-me a fruta fresca, a água a correr e a descontracção, com o Verão inteiro ainda por chegar. 3- Abril. Em geral é o mês da Páscoa e por isso associo-o à cor laranja e a cores pastel, que são as que gosto de vestir nesses dias. Abril está inevitavelmente ligado aos coelhinhos de que eu tanto gosto, aos ovos e às amêndoas, mas também ao renascimento, aos sinos e aleluias do lado mais espiritual da festa; e à instabilidade atmosférica, que faz alternar sol e chuva, calor e frio, dias ora claros, ora cinzentos, a crescer e a aquecer devagar. E tem uma sonoridade bonita, a acabar em -l como o meu nome. É também o mês de voltar ao prazer dos primeiros dias de praia, de estender o corpo ao sol e deixar o calor suave penetrar-me na pele, de caminhar descalça na areia molhada, de ouvir a cadência das ondas quando à minha volta ainda há silêncio e sossego, do arrepio da água fria, que às vezes já apetece e outras ainda não.  4- Maio. Mês de Primavera plena, é em tudo semelhante a Abril, sem a festa da Páscoa, mas com a Romería del Rocío, a coincidir com o Pentecostes. Inexplicável para quem nunca a tenha vivido, esta é uma festa que marca o meu ano e que só se pode entender pelo lado de dentro da emoção, como uma explosão dos sentidos em que se misturam fé e alegria, numa experiência desmedida que nos enche a alma e nos marca para o resto da vida .5 - Outubro. É castanho, cor de mel e dourado, como as tonalidades que enchem todos os lugares, profundamente belo e nostálgico, misturando poeticamente sensações de tristeza e de bem-estar, de intimidade e mansidão.  6 - Setembro. É o mês da mudança e do regresso. Para quem, como eu, tem na escola uma parte importante da sua vida, é na rentrée que verdadeiramente se começa um Ano Novo. Mudam-se os hábitos, as cores e as roupas, e vive-se em permanente contradição entre o  entusiasmo de um novo começo e a melancolia das férias recém terminadas. 7 - Julho. É um mês de Verão e de férias, bem mais tranquilo que o impossível Agosto, que se vive em serena liberdade; que é agradável, mas não marcante. 8 - Fevereiro. O que há de bom neste mês é ser mais curto que os restantes e, por isso, passar mais depressa. Mas, para mim, Fevereiro está inevitavelmente  ligado a dois eventos que não me entusiasmam nada:  o Carnaval  e o inenarrável Dia dos Namorados, que me repugna de uma forma que nem sei bem explicar, mas acima de tudo por ser essa aberração: precisará o amor de dia e hora marcados para se celebrar? Parece-me muito estranho...   9 - Novembro. Associo este mês à cor cinzenta, visível nos dias muito curtos, e nas horas sombrias já com ares de Inverno, que mesmo não tendo chegado em pleno já se vai manifestando nas constipações e na vontade de ficar em casa, em recolhimento profundo que é quase hibernação. E começam também a aparecer, aqui e ali, sinais do frenesim natalício que se avizinha. 10- Dezembro. É o mês do consumismo por excelência, que cada vez vai ganhando mais peso na sua associação às Festas de Natal e de Ano Novo, emocionalmente violento e pleno de sentimentos contraditórios, que em geral provoca um enorme cansaço e se vai fazendo mais superficial e vazio de sentido. 11 - Janeiro. Como Agosto, mas por diferentes motivos, Janeiro é um mês que me "pesa" e que demora a passar, arrastando-se frio, húmido e escuro, sob o peso da ressaca das festas que quase faz passar despercebido o que está por vir. 12 - Agosto. É para mim o mês mais insuportável do ano, associado a tudo o que há de menos bom no conceito "férias", sinónimo de praias abarrotadas, de calor excessivo, de suor e corpos demasiado expostos, de chungaria em chinelos, de pernas ao léu e camisolas de alças, de boçalidade total, como um imenso e entediante Domingo.
Como se percebe, são as estações intermédias e amenas as que mais me fascinam, pois são da Primavera ou do Outono os meses que ocupam os seis primeiros lugares na minha lista de preferências. Gosto de dias claros e frescos, sem muito calor ou muito frio, com temperaturas agradáveis que não excedam os vinte e cinco graus.
Mas para lá da influência que tem em mim  - e no meu humor -  a alternância entre a luz e a escuridão, o dia e a noite, ou a mudança das estações, tenho cada vez mais a noção de que só o presente importa; e que temos que aproveitar cada dia, não apenas como um dia que se sucede a outro dia, mas como uma dádiva da vida.

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