quinta-feira, 2 de maio de 2013

Capela do Rato


Não me lembro ao certo que idade tinha quando comecei a ir à Capela do Rato. Sei que era ainda uma miúda. E que, desde cedo, aquela missa com sabor a festa e com palavras cheias de sentido  me impressionou de tal maneira e foi tão determinante para a minha existência e para a minha maneira de viver a fé, que,  hoje, não sou capaz de assistir a qualquer uma e só na missa do Padre Feytor Pinto eu consigo encontrar profundidade e significado semelhantes.
A Capela do Rato é, para mim, um lugar fundamental, emblemático, que marcou fortemente a minha adolescência e onde se estabeleceram os fundamentos de muito do que hoje sou. Onde conheci amigos extraordinários, com quem cresci, por dentro e por fora, e com quem fui aprendendo a pensar, a pensar-me e a procurar um sentido maior para a vida. Foi um período importante. Tínhamos os sonhos mais utópicos que se possa imaginar  e acreditávamos, com inabalável convicção, que havíamos de conseguir mudar o mundo e torná-lo muito melhor. Mas o tempo, inclemente, foi fazendo o seu caminho, o grupo dispersou um pouco, eu passei por uma fase em que pus em causa tudo aquilo em que acreditara até então e afastei-me. Nunca mais lá fui.
Voltei hoje, em circunstâncias muito específicas. E foi uma emoção. Por tudo. Pelo que me levava ali, pela beleza e simplicidade da cerimónia a que assisti e por aquele regresso a um  passado bom, a um lugar que me é tão familiar, próximo e distante ao mesmo tempo, mas que representa tanto.
Quantos anos terão passado desde que entrei lá pela última vez? Vinte e quantos? Trinta? Mais? Nem sei... Muitos. Olhando em volta, notei pequenas diferenças. As cadeiras de madeira castanha clara são agora cinzentas, de plástico. A imagem por trás do altar não é a mesma. O espaço pareceu-me até um pouco mais pequeno, porque a nossa memória aumenta sempre o tamanho do que lembramos.
Hoje, já não estava lá o Padre Resina, nem a Feliciana, nem o Pepe, nem os Sassettis, ou as Castel-Branco; nem se ouviram os nossos cânticos, ou as nossas guitarras daquela altura. Do tempo antigo, estava apenas o João Paulo Sacadura; e olhando para ele, sentado na minha frente, pude aperceber-me de como, de facto, os anos passaram, a vida segue e é o presente que verdadeiramente importa.
Esta celebração de agora, que vivi hoje, naquele lugar da minha adolescência, foi  simples, bonita, e plena de sentimento. De amor, que é o maior e o mais importante de todos. Um privilégio, pois, poder partilhá-la com pessoas por quem nutro um afecto desmedido.
Não conhecia o Padre Tolentino de Mendonça, de quem tenho ouvido falar muito e que ando para ler há que tempos, mas tenho adiado sempre, por uma razão ou por outra. Gostei muito do seu modo de estar, discreto, espontâneo e despretensioso, de tudo o que disse e do modo natural e quase intimista como o fez.
De tudo o que ali ouvi hoje, retenho a importância da espiritualidade e da contemplação, a ideia de que a imortalidade é também os nossos sonhos e tudo o que nós somos perdurarem para além de nós; e esta frase, tão bonita, do salmo: "Ensina-nos a contar os nossos dias, para que o nosso coração alcance a sabedoria".

Sem comentários:

Enviar um comentário