Eu, que sou desde sempre uma apaixonada pelas palavras, pelo que elas significam e pela incomensurável distância a que ficam do que só se sente sem se conseguir dizer, sei bem que há emoções verdadeiramente difíceis de descrever, mas que também não podem calar-se, nem quando as palavras parecem ter fugido todas para muito longe, ou situar-se demasiado aquém da comoção que as antecede. Foi mais ou menos o que me aconteceu ontem.
Quem é professor há muito tempo, como eu, sabe que na escola, tal e qual como na vida, há quem passe por nós sem deixar marca e quem por alguma razão se relembra sempre com agrado. Que há alunos verdadeiramente detestáveis, outros muitos queridos, e outros ainda com os quais é possível criar laços que perduram.
Ontem, fiz uma coisa que nunca tinha feito. Recebi na minha sala de aula uma dessas antigas alunas com quem nunca se perde o contacto, porque a empatia e a cumplicidade se mantêm, mesmo de outra maneira e passados mais ou menos dezassete anos.
A Ana Filipa Nunes, que hoje é jornalista, aceitou o meu desafio de ir conversar com os meus alunos de agora sobre alguns dos livros que a marcaram e sobre a sua vida profissional.
E o que o se passou naquela sala de aula durante noventa minutos foi para mim uma emoção totalmente inexprimível. A menina que eu conhecera outrora, que na época fizera parte das minhas equipas do jornal e da rádio da escola, estava outra vez na minha aula, mas a explicar aos que têm a idade que ela tinha então que ler é fundamental, o que pode haver de bom e de mau na profissão que escolheu, a importância de se gostar do que se faz e o trabalho que implica chegar onde queremos, a aceitação de maneiras de pensar e de sentir diferentes das nossas, e tantas outras coisas que ela entendeu dever dizer. Com a mesma paixão e entusiamo de antigamente, ampliados e modificados pela(s) experiência(s) que a vida lhe trouxe.
Enfim, esta foi uma tentativa de levar os meus alunos a entender que ler pode ser bom e tornar-nos mais capazes e mais preparados para a vida. O primeiro round não podia ter corrido melhor. E foi quase uma espécie de retribuição, que me faz acreditar que apesar de tanto trabalho a ver testes e de tanta hora gasta em muita coisa considerada inútil, no fundo, se calhar, tudo isto vale a pena e faz sentido. O que vi e ouvi ontem fez-me sorrir de felicidade; e de orgulho também, um bocadinho.
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