domingo, 8 de maio de 2016

Não, eu não sou de esquerda


Sobre esta história das escolas com contratos de associação de que muito se tem falado nos últimos dias, não estou de acordo com o que diz em particular o meu partido, desde os chavões mais ou menos vazios, a argumentos mais consistentes de pessoas que muito prezo, mas com quem não tenho que estar sempre de acordo. E, na verdade, ser militante de um partido não me impede de pensar pela minha cabeça  - era o que faltava! - nem de ter uma opinião, ainda mais quando estou muito por dentro do assunto, como é aqui o caso.
Há em Portugal a ideia um pouco provinciana de que o ensino privado é bom e o público é mau (um pouco semelhante à ideia de que tudo o que é estrangeiro é que é), o que anda muito longe da realidade.
De facto, sendo certo que há de tudo em todo o lado, não tenho a menor dúvida que, apesar de muitos maus exemplos, que também existem, a qualidade do ensino é claramente melhor na escola pública (com excepções, hoje, apenas para o Liceu Francês, o Colégio Alemão e o St. Julian's School). E sei muito bem do que falo: na escola onde estou, recebo alunos vindos dos mais caros e conceituados colégios de Lisboa, a maioria dos quais muitíssimo mal preparados. Que tiveram por exemplo latim no ensino básico, mas chegam ao secundário sem saber escrever e interpretar correctamente em português. Enfim, podia multiplicar os exemplos, mas nem vale a pena. Porque o que está aqui em causa não é uma discussão sobre a qualidade do ensino, nem sobre o privado versus público.
É antes aquilo que se explica claramente aqui, nestes termos:
Quando faltam os argumentos, como sucede agora aos defensores dos contratos de associação com escolas privadas, e falta também a força com que, como sucedeu com o anterior governo, se impõe a falta de razão, sobram, para consumo da opinião pública, apenas dois recursos:
No plano emocional, jogar com o dramatismo das criancinhas que ficam sem a sua escolinha e dos pais que são confrontados com a perda de estatuto social ou a desorganização da vidinha se o menino ou a menina tiverem de deixar o "colégio" para ingressarem na escola pública indiferenciadora.
No plano racional, confundir a opinião pública distorcendo a realidade e recorrendo a analogias com situações aparentemente idênticas para tentar passar a ideia de que as reivindicações dos colégios são lógicas e fazem sentido.(...)
O carácter supletivo da prestação de serviços públicos por entidades privadas tem sido regra geral em todas as áreas da administração pública; (...) quando o Estado financia creches, escolas ou clínicas privadas para acolherem os utentes do público, não é para que estes "possam escolher", mas sim para que tenham acesso aos serviços de que necessitam e a que têm direito e que o Estado não está em condições de, pelos seus próprios meios, dar resposta adequada.
Ora eu, que até trabalhei nos serviços centrais do Ministério da Educação, sei que isto acontece hoje em relativamente poucos sítios no país (em Fátima, por exemplo, ou em Arruda dos Vinhos), e também que é mais ou menos escandaloso o que se passa com os colégios com contrato de associação, com os quais lucram em particular os seus proprietários e não os alunos visados, nem as famílias, como se quer fazer crer.
Acho interessante, pois, tanta preocupação repentina com os "professores que ficarão no desemprego", quando nunca ninguém se preocupou com as suas condições de trabalho, as quais são, tanto quanto sei, bem piores que as dos professores do público, e, mesmo essas, não são nada boas.
Claro que o Ministro é inenarrável e  Mário Nogueira uma figurinha execrável, que não representa nenhum professor minimamente decente (e ainda os há...).
Mas não metamos tudo no mesmo saco. E, sobretudo, nesta como noutras matérias, há que ouvir quem está por dentro do assunto. E isso, infelizmente, raramente se faz...

2 comentários:

  1. Esquerdas e direitas à parte, sou defensora do ensino público e da aposta em melhorar as suas condições.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Luísa, eu então que o conheço por dentro e muitíssimo bem sei de cor todos os seus defeitos e virtudes.
      Só falei na questão esquerda/direita, porque se está a tentar transformar isto numa questão ideológica e a misturar muitas coisas que não têm nada a ver umas com as outras. E eu sei que é uma "pouca-vergonha" a questão dos contratos de associação. Mas isso não tem nada a ver com "escolhas das famílias". Por favor, poupem-me...

      Eliminar