sábado, 30 de julho de 2016

Nunca estamos preparados


Há na morte este supremo paradoxo: é o que temos de mais certo e, ainda assim, nunca deixa de nos surpreender. Quando se perde alguém que nos é muito próximo, ou muito querido, é como se alguma coisa dentro de nós se quebrasse, como se todas as emoções se misturassem e vivêssemos num turbilhão de sentimentos, entre a incredulidade, o desgosto, as lembranças e esse legado intransmissível, que é a marca que fica em nós.
No fundo, acreditamos que somos eternos (mesmo sabendo que não) como acreditamos que são eternos aqueles a quem queremos bem. E é a sua ausência que nos devolve a realidade, tornada de repente imensa, fria, brutal, enquanto muitas memórias passam pela nossa cabeça e muitas perguntas, que ficam sem resposta. Quando, como e porquê se cansa uma pessoa de viver? Quanto desespero é preciso, quanto sofrimento, para resolver desistir? Fica-nos sempre a sensação de que alguma vez, em algum dia, ou hora, teremos falhado, sem perceber os sinais que afinal estavam lá, que poderíamos ter dito e feito um pouco mais ou melhor. Depois, em silêncio,  aceitar. Porque há momentos em que todas as palavras parecem ficar muito aquém do essencial. E porque aceitar que a morte faz parte da vida é talvez a mais difícil e dolorosa aprendizagem com que vamos sendo confrontados.

Obrigado, Senhor, pelos amigos que nos deste (...) 
Que nos fazem sentir amados sem porquê,
Que têm o jeito especial de nos fazer sorrir.
Que sabem tudo de nós perguntando pouco.
Que conhecem o segredo das pequenas coisas que nos deixam felizes.
Obrigado, Senhor, por essas e esses,
Sem os quais caminhar pela vida não seria o mesmo. (...)
Que nos incitam à coragem só com a sua presença
Que nos surpreendem, de propósito, porque acham mal tanta rotina.
Que nos dão a ver um outro lado das coisas

                                                                   Padre Tolentino de Mendonça

(Fotografia do blogue À Esquina da Tecla)

terça-feira, 26 de julho de 2016

Enfim, férias...


O ano foi difícil, desafiador, cansativo. Cheio de novidades boas, também... 
330 e tal dias, muitas horas e 84 exames depois, deitei fora, hoje, todos os papéis, arrumei a mesa, esqueci tudo o que durante tanto tempo me consumiu as horas e a cabeça; e estou preparada para o que aí vem: daqui a dois dias começa o tempo de liberdade (quase) total.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Frescura


Há uma magia qualquer nos amores repentinos, profundamente arrebatadores, que começam sem como nem porquê, que fazem o mundo parece muito mais harmonioso e encantador, e se tornam depois inabaláveis e resistentes ao tempo, tão simples e saborosos como a aragem fresca de um fim de tarde de Verão.

domingo, 17 de julho de 2016

Um interessante filme banal


"Amor e Amizade" é um filme de época, daqueles que distraem sem fazer mossa nem deixar marca e se esquecem em pouco tempo.
Realizado por um norte-americano, Whit Stillman, filmado na Irlanda, baseado numa novela de Jane Austen (Lady Susan), embora assumindo o título de outra obra da autora (Love and Friendship), a história transporta-nos para o ambiente aristocrático da Inglaterra dos finais do século XVIII, com todas as suas convenções e rígidas regras de convivência.
Kate Backinsale interpreta uma convincente Lady Susan, viúva que vive fora das normas daquele tempo, atrevida, sedutora, maliciosa e manipuladora, que sobressai relativamente às outras mulheres do meio em que se insere, não olhando a meios para obter o que pretende. É ela e o desconcertante Sir James Martin, interpretado por Tom Bennett, que apimentam o filme, trazendo-lhe ironia e humor em doses moderadas, o que contribui em muito para fazer deste filme um filme "que se vê bem".

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Bater no ceguinho

Desde Domingo, os franceses não têm sido poupados e o conhecido humor português tem feito da suas, em versões mais ou menos felizes. Mas também se puseram a jeito, convenhamos...

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Males que vêm por bem...


Há muito aquela ideia de que nada é por acaso e eu estou cada vez mais de acordo com ela. E quando nos enganamos sobre alguém, ou alguma coisa, rapidamente o tempo e a vida voltam a pôr tudo no sítio certo. 

segunda-feira, 11 de julho de 2016

O esplendor de Portugal



Sou insuspeita. Nunca gostei de futebol, não percebo nada do assunto e mal sei quem ganha ou perde. Sou do Sporting mais por herança paterna e por ter sido ginasta do clube que por outra coisa qualquer; e nem mesmo os jogos da selecção me despertam paixões exacerbadas ou arroubos patrióticos. Por isso acompanho tudo com uma certa distância, com relativa indiferença relativamente a ganhos e perdas, e quase só por gostar de estar sempre informada.
Mas ontem foi diferente. Pela primeira vez desde que me lembro, a saída dramática do Cristiano logo no início do jogo fez-me parar à frente da televisão e assistir depois, atentamente, até ao fim. Vi as magníficas defesas de Rui Patrício, vibrei com o golo do Éder, torci para que os minutos passassem então mais depressa e, no fim, emocionei-me, como toda a gente.
Foi uma vitória sofrida. E merecida, também, dadas todas as circunstâncias. Eu gosto muito de França, mas reconheço nos franceses uma irritante sobranceria que os faz considerar (às vezes com razão e sem ela na maior parte das outras) que não há melhor que eles. Desta vez enganaram-se, o que dá um sabor peculiar a este sucesso, mais desejado que esperado, mesmo no mais fundo de nós.
Só isso explica aquilo a que assisti hoje e que nunca tinha visto: um país inteiro vestido de verde e vermelho, em euforia e em festa, com Lisboa inteira na rua, nas janelas, de braços no ar, aos gritos e aos saltos, a aplaudir, feliz. Tinha que estar na festa e quase sem querer fui lá parar. Foi linda e inesquecível a recepção aos jogadores. E fiquei a pensar que o futebol, de que eu não gosto, consegue esta magia de unir pessoas de todas as idades e raças, de todas as crenças políticas e religiosas, de todas as classes sociais.
Temos certamente, nos dias que correm, muitos motivos de preocupação. Mas este momento em que nos unimos todos, sem excepções, em alegria e em felicidade, foi muito bonito de viver. E ser português também é, de certo modo, isto tudo: acreditar, sofrer, vencer.

Toma e embrulha!


Palavras para quê?

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Petits riens


No bom ou no mau sentido é (quase sempre) nos detalhes que melhor se percebe o essencial.

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Histórias de Lisboa (I)


Avenida Guerra Junqueiro

Houve um tempo em que a Avenida de Roma e circundantes, ou os Bairros de Areeiro e Alvalade eram uma zona nobre da cidade, onde se destacava a Avenida Guerra Junqueiro como um lugar chic de compras, com as lojas e os cafés a transbordar, sempre cheia de movimento e de vida.
Hoje, é apenas uma sombra do que foi, um lugar deserto onde parece não se passar quase nada, e a agitação de outrora partiu definitivamente para outras paragens. Muitos cafés fecharam ou transformaram-se em bancos, e até a Mexicana, com a remodelação, perdeu o prestígio e a popularidade de épocas passadas. A maior parte das lojas de roupa deu lugar a lojas de decoração onde não entra ninguém e o silêncio em que mergulha agora a avenida pesa e incomoda. Só os edifícios mantêm a imponência de antes, mas é poucochinho em relação ao que já foi.
No fundo, tudo isto deverá fazer parte da dinâmica da cidade em permanente mutação: há zonas que envelhecem e quase morrem, enquanto outras renascem e crescem.

terça-feira, 5 de julho de 2016

A minha vez


Quando eu era pequena, se estivesse doente, ficar na cama era obrigatório. Nada a fazer. Não podia sair dali até a febre passar e voltar a ficar boa. Ler também não era permitido, para não potenciar o cansaço. Havia, porém, nessas alturas de tédio, fragilidade e desconfortos vários, duas coisas que me deliciavam: folhear os álbuns de fotografias familiares que já conhecia de cor e ainda assim me encantavam, e a papa de banana esmagada com bolacha Maria e sumo de laranja que a minha mãe me fazia à hora do lanche. Mais que tudo, no entanto, era a sua voz e a sua presença que me reconfortavam e davam a certeza que daí a nada tudo voltaria à rotina habitual.
Hoje mudou tudo e os nossos papéis inverteram-se quase totalmente.  Hoje, sou eu que lhe faço a papa de banana com bolacha que ela come com o mesmo ar satisfeito que imagino que eu teria muitos anos antes; sou eu que lhe passo a mão na cabeça repetindo baixinho que está tudo bem; e lhe conto mil histórias sem saber se ela as entende, ou apenas a apazigua reconhecer-me o toque e a voz.
E se é verdade que há uma tristeza inerente à degradação do corpo e ao enfraquecimento de todas as capacidades, há também qualquer coisa de profundamente belo, e vitorioso, em chegar aos 91 anos, apesar de todas as limitações que tal implica. É por isso que, embora possa até parecer uma certa forma de egoísmo, continuo a preferir tê-la do lado de cá da vida, porque me tranquiliza a sua serenidade silenciosa e porque, no fundo, mesmo manifestando-se agora de maneira muito diferente, acredito que o nosso amor nos faz bem.

O grande equívoco


Depois de ver, ler, corrigir cinquenta exames de 12º ano, volta impressionar-me o estado confrangedor a que chegou o ensino e a aprendizagem do Português. E repito aquilo que sempre me pareceu ser o essencial: é na leitura e na escrita que se tem que insistir. Muito. E esquecer tudo o que é acessório, pouco útil e que, estranhamente, ocupa hoje um lugar demasiado central. Que importa, pois, "o adjectivo relacional", "o polissíndeto" e as "coordenadas assindéticas", se não se consegue falar sobre um texto que se leu sem o parafrasear, se não se sabe utilizar a pontuação, desenvolver um tema, defender um ponto de vista, estruturar um texto sem os chavões habituais, onde não faltam o "por outro lado" e o "em suma".
Deviam os professores de Português reflectir longamente sobre isto, mudar de paradigma, e entender de uma vez por todas que a gramática só interessa na medida em que nos permite compreende melhor o modo como a língua funciona e por isso utilizá-la com maior correcção e clareza, que o gosto da leitura não se desenvolve com a obrigatoriedade de ler dois livros por mês e com testes de "verificação da leitura", ou que escrever é muito mais que desenvolver estratégias de sobreviver a um exame. Assim, não vamos longe...

Si je lis avec plaisir cette phrase, cette histoire ou ce mot, c'est qu'ils ont été écrits dans le plaisir (...)  Mais le contraire ? Ecrire dans le plaisir m'assure-t-il - moi, écrivain - du plaisir de mon lecteur ? Nullement. Ce lecteur, il faut que je le cherche, (que je le "drague"). (...)  Un espace de la jouissance est alors créé. Ce n'est pas la "personne" de l'autre qui m'est nécessaire, c'est l'espace : la possibilité d'une dialectique du désir, d'une imprévision de la jouissance : que les jeux ne soient pas faits, qu'il y ait un jeu.

(Roland Barthes, Le plaisir du texte)

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Leitura(s)


Agora que, pelo menos durante quinze dias, a vida abranda um pouco o seu ritmo desenfreado e frenético, que não há exames, nem textos, nem testes, nem aulas para preparar, nem campainhas a tocar de hora a hora, posso enfim dedicar-me um pouco mais a ler e a escrever, como eu tanto gosto.
De entre os escritores sul-americanos Vargas Llosa é talvez o meu preferido e está sem dúvida no "Top Ten" dos meus favoritos em geral. Ultimamente anda "nas bocas do mundo", sobretudo em Espanha, por causa do seu mediático amor com Isabel Preysler. Mas isso é o que menos importa. Porque é, acima tudo, na escrita que ele se destaca e é nisso que devemos focar-nos. Este é o livro que me tem acompanhado nos últimos dias, verdadeiramente empolgante e, como sempre, muito bem escrito. 
Um verdadeiro deleite, que recomendo, pois claro.