sábado, 29 de outubro de 2016

Paixões


Ó sino da minha aldeia
Dolente na tarde calma
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma

É inevitável. Há uma magia qualquer em cada ida à Baixa, que me traz sempre de volta uma parte da minha infância. Lisboa é - será sempre - uma das minhas grandes paixões...

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Histórias de Lisboa (IV)


Rua Passos Manuel


Na rua de baixo cabe o mundo inteiro. Há o Jardim Constantino e o restaurante "Vaskus", de portas vermelhas e toalhas de quadrados, que já existe há pelo menos trinta anos. E continua quase igual. Esta é, sem dúvida, uma rua singular, onde encontramos de tudo um pouco: a loja de artigos ortopédicos e a sexshop, a Igreja Evangélica ao lado da Livraria "Assírio e Alvim", a mercearia antiga e o cabeleireiro "Pura Vaidade", o VivaFit mesmo antes  do alfaiate, o "Mundo dos pneus" e a papelaria, o Hotel e o Externato, a Boulangerie Costes em frente do atendimento social da Junta de Freguesia de Arroios, a Farmácia, a venda de velharias e a loja de artigos eléctricos, entre tantos outros pequenos comércios de bairro.
Na rua Passos Manuel misturam-se as línguas, as raças e as nacionalidades numa coexistência pacífica que é o paradigma da nova Lisboa, moderna e antiga, bairrista e cosmopolita, retrógrada e arrojada, caótica e encantadora, cheia de luz, de vozes e de vida. Mas é também esta miscelânea que faz de Lisboa uma das mais fascinantes cidades que conheço, que me seduz e apaixona todos os dias.

domingo, 23 de outubro de 2016

Café Society



Depois de Almodóvar, Woody Allen. Finalmente bons filmes em cartaz. Sou suspeita. Gosto destes realizadores de uma forma mais ou menos incondicional. Café Society poderá não ser um dos filmes maiores deste conceituado realizador, mas é sem dúvida uma história bem contada e que, justamente por isso, nos deslumbra.
Há depois duas coisas que Woody Allen sabe fazer na perfeição: escolher os actores e a música. Quanto mais não fosse pelo ambiente de jazz que é pano de fundo e quase imagem de marca na maior parte dos seus filmes já valeria a pena vê-los. Mas não é apenas isso. Aqui há Jesse Eisenberg e Kristen Stewart a conferir veracidade e encanto a uma história onde se ligam na perfeição o humor e a melancolia, há o glamour dos anos 30 em Hollywood e uma história que gira em torna de ambição e sentimento, onde não faltam todos os ingredientes tipicamente "Allenianos": os gags humorísticos, as situações inesperadas, os sentimentos amargos, belíssimas imagens...
É de filmes sobre sentimentos que eu mais gosto. Afinal, não é o que há de melhor na vida?

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Luz de Lisboa


Quando Lisboa escurece
E devagar adormece
Acorda a luz que me guia
Olho a cidade e parece
Que é de tarde que amanhece
Que em Lisboa é sempre dia

terça-feira, 18 de outubro de 2016

15 anos depois - el reencuentro


Quem me conhece bem sabe como eu gosto de Espanha, a ponto de ser a TVE o canal de televisão que mais sigo. Em 2001, eu tinha acabado de me apaixonar pelo flamenco e vivia ainda com mais fervor e intensidade aquela garra que vinha do outro lado da fronteira e que tanto me tocava, que me continua a tocar, que é coração, sangue e alma, euforia e emoção transbordante.
Havia, por aquel entonces, um programa que prendia todos os espanhóis ao écran - e eu com eles. Era o tempo da Operación Triunfo, na sua primeira edição (OT1), um programa que revolucionou a televisão e a música espanholas e teve, por isso, um sucesso inigualável e difícil de explicar. Era a excelência das vozes, mas era também um bom leque de professores, o bom gosto na escolha variada do repertório, das coreografias, e era um grupo carismático de jovens simples e ilusionados, dando o melhor de si mesmos para conseguir chegar o mais longe possível o que tanto nos atraía e encantava. 
Eu sou insuspeita. Não costumo ter a mínima paciência para concursos de talentos, sejam de música ou de cozinha, e acho que não exagero se disser que este foi o único que acompanhei do princípio ao fim. Porque era diferente. Porque me parecia absolutamente genuíno e tinha tudo o que um programa de entretenimento tem que ter. 
Por isso, também me surpreendi com o potencial vocal de Rosa ou com a vivacidade e energia de Bustamante; acompanhei a história de amor de Bisbal e Chenoa, que nasceu diante do nossos olhos e quase nos apercebemos dela antes deles próprios - é inesquecível o vídeo dos ensaios de "Escondidos"; diverti-me com as aulas de interpretação de Ángel, enterneci-me com a doçura maternal de Nina e admirei as coreografias de Poty; arrepiei-me com certas interpretações que ficaram para a história, conheci canções que até aí desconhecia.
Quando o concurso acabou, em Fevereiro de 2002, houve ainda a participação de Rosa na Eurovisão, que eu já não acompanhei, porque isso é que não faz de todo o meu género, e depois cada um seguiu o seu caminho e apenas dos mais mediáticos fui sabendo alguma coisa pelas revistas e pela televisão.
Mas, quinze anos depois, a TVE decidiu promover o reencontro daquele grupo inicial em três programas dos quais passou este Domingo o primeiro e um concerto ao vivo, no dia 31, em Barcelona. 
Passado este tempo, já não são os mesmos meninos de vinte anos de outrora, são adultos com um percurso feito e amadurecidos pela vida. E foi outra vez um fenómeno de audiências, um enorme sucesso. Por mim, voltei a emocionar-me quase como há quinze anos. E não me interessa nada se Bisbal foi mais frio ou mais caloroso com Chenoa e outras coisas que se disseram. O que eu vi ali foi aquele magnetismo de antes, de quem gosta de música e é capaz de passar para o lado de cá o que sente quando canta.
Talvez fosse bom que a televisão portuguesa, onde quase só passam novelas e debates de politica e de futebol, pudesse aprender alguma coisa com os vizinhos aqui do lado.


sexta-feira, 14 de outubro de 2016

O raio do Nobel


Nunca fui muito nesta conversa do prémio Nobel, que sempre me pareceu obedecer a critérios mais ou menos obscuros e duvidosos. Mas disso já aqui falei.
Não queria, pois, falar do assunto. Mas não resisto. Faço parte do grupo dos que consideram a atribuição do Nobel da Literatura a Bob Dylan um perfeito disparate, para não dizer pior. E não por não lhe reconhecer importância. Também ouvi e cantei, na adolescência, as suas canções. Acho que teve o reconhecimento que merecia, antes e depois. Chamar-lhe "literatura" é que já me parece um excesso.
No meio da polémica criada, não posso deixar de destacar o melhor texto que encontrei até agora e com o qual não posso estar mais de acordo. E sou insuspeita. O "Escrever é triste" é um blogue que raramente leio e com que pouco me identifico, porque me parece sempre demasiado "armado ao intelectual"  - para o meu gosto - e não tenho grande paciência para o género. Mas, como em tudo, há excepções. E, por isso, acho que vale a pena ler o texto de Manuel S. Fonseca intitulado "Em defesa de Bob Dylan" e do qual transcrevo apenas alguns excertos. Diz, por exemplo, isto:

(...) Bob Dylan é grande por ter sido transgressor, profeta assimétrico, rebelde contra os conservadores, rebelde outra vez contra os iconoclastas de feira, mas sobretudo por ter marcado a música popular do século XX. Usou para isso palavras e escreveu-as, à mão, à máquina, para aí num Remington de escritor. Ultimamente num laptop, quem sabe. Mas as grandes e maravilhosas palavras que escreveu, escreveu-as para uma arquitectura que envolve sons, para uma construção a que chamamos música.  Soprou palavras e as palavras mudaram um tempo. Em cima de um palco incendiou um tempo. Não dentro de um livro.
Eu bem sei que, hoje, a um homem já não se chama um homem, a uma mulher já não se chama uma mulher, a nada se chama nada, porque a tudo se chama tudo. Confundem-se as estradas. Mas Bob Dylan caminhou tanto na mesma estrada que merece que dela se diga o nome. A enigmática estrada da Literatura não foi a estrada de Dylan. Porque há uma estrada da Literatura: faz-se escrevendo para o papel, para a publicação em páginas, para a emergência das palavras numa folha de papel, criando tessituras dramáticas que só existem nessa forma autónoma e só nessa forma específica, de papel e letras, geram o mistério de um inexplicável tumulto emocional. Alfabeto e lábios imóveis, um par de nervosos olhos que lê, são essas as loucas ferramentas dessa nação. A Literatura é uma imensa montanha com 25 séculos e tem uma tradição – ó raio de palavra que me saíste descomandada e ainda me vais perder!
A arte de Dylan é feita de som, com fúria ou sem fúria. A arte pela qual lhe deram, hoje, o Nobel é feita do silêncio íntimo de uma página de papel. Mesmo os silêncios da música de Dylan, na tradição de todos os silêncios da música, são distintos do silêncio da palavra cativa do papel. E é essa diferença entre os silêncios que faz a grandiosidade da tradição de tantas artes. São diferentes, mas se as chamarmos pelo nome, elas vêm. Procuram o mesmo instante, têm a mesma aspiração de sublime ou de caos, uma danada vontade de beleza, destruição e eternidade, mas são diferentes: uma, a Música; outra, a Literatura; outra, a Pintura. Cada uma com o seu silêncio, nem o silêncio da Arquitectura rima com os silêncios das outras.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Julieta


Almodovar é um dos raros realizadores (como Woody Allen) de quem vejo quase tudo, independentemente de  considerar, depois, que o filme é melhor ou pior, que me agrada muito, ou nem por isso. É de Almodovar um dos melhores filmes que vi, Habla con ella (2002), para mim a sua obra maior. 
Julieta é um drama, com a tristeza e a complexidade que têm muitas vezes as relações humanas e a própria vida. Mas o que faz a singularidade e a supremacia de um grande escritor, como de um grande realizador,  é essa capacidade de nos prender do primeiro ao último minuto a uma história que em si mesma pode ser entendida como trivial. E de, ainda assim, nos tocar. Porque é essa, também, a sua força. Claro que, neste caso, há excelentes interpretações, sobretudo as de Emma Suárez e Adriana Ugarte. Há silêncios, mistério e surpresa. Há a culpa, a separação, o sofrimento e a ternura. Há a Galiza e a Andaluzia, o mar e a terra. 
Baseado em três contos de Alice Munro, que não li, é assim, fascinante na sua inteligente simplicidade, o vigésimo filme de Pedro Almodovar; e é, talvez, juntamente com The room, um dos melhores que vi e mais me marcou neste ano. 
Há muito tempo que não ia ao cinema. Não por falta de vontade, nem de tempo, mas por circunstâncias daquelas que às vezes nos surpreendem e ultrapassam, e nos obrigam a pôr a vida de todos os dias entre parênteses por uns tempos. Que tenha voltado hoje, dia da festa nacional de Espanha, para ver este fantástico filme espanhol foi uma curiosa coincidência, de que só me apercebi no final. E fez-me também ter a certeza de que preciso de regressar  a esse país de que tanto gosto, onde já não vou há quase um ano e do qual tenho muitas saudades.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Agora sim...


Hoje, já se pode dizer que o Outono está aqui. E é tão boa a chegada das primeiras chuvas, o cheiro da terra molhada, as noites cada vez mais longas, a pressa de voltar ao aconchego e conforto da casa, a cidade pintada de tons vermelhos e dourados, o cheiro das castanhas e tudo o que anuncia uma nova estação...