quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Nós por cá...


Dois anos e meio depois de ter vindo aqui parar, sinto-me  ainda uma principiante. Ainda há muita coisa que desconheço neste mundo simultaneamente diverso e aliciante, que me atrai e assusta em doses quase iguais, tal e qual como o início de um amor, ou o limiar de um caminho novo.
Nos últimos dias, dois blogs que gostava de acompanhar anunciaram o seu fim. E eu, que não sou dada a despedidas, não posso deixar de sentir uma certa tristeza. Ou pelo menos de ficar com pena, nem que seja de um ponto de vista estritamente egoísta.
Um amigo dizia-me, também por estes dias, que a blogosfera tem vindo a decair; tendo a concordar, embora perceba que tudo tem um tempo. Ou que o cansaço, a falta de tempo, a simples necessidade de parar e fazer diferente, ou seja o que for, nos leve a querer desistir. Mesmo que seja uma desistência temporária.
Por mim, apesar de algumas contrariedades sem importância  - que só aquilo que tem verdadeiramente valor para nós pode afectar-nos deveras - têm sido, até agora, muito mais as coisas boas do que as menos boas. E por isso, porque por enquanto estou aqui bem, vou-me mantendo por cá.
(Um exemplo: as fantásticas descobertas que fiz, como estas fotografias que encontrei mais ou menos por acaso e que não me canso de olhar. Quando vi esta pela primeira vez, lembrei-me logo de uma canção de que gosto muito. E de tantas outras coisas em que fico entretida, a pensar...)
(Fotografia de Paulo Abreu e Lima)

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Armar ao pingarelho

Gosto do CCB. Do espaço, da localização junto ao rio, da organização e dos eventos. Se calhar passei a gostar ainda um pouco mais quando foi Vasco Graça Moura a dirigi-lo e, entre muitas outras coisas, deu à Literatura e às Humanidades o lugar de destaque que  deveriam ter sempre. E recusou-se à aplicação do AO.
Neste fim de semana, porém, mudei ligeiramente de opinião. Por isto: no final de um magnífico espectáculo de Luís Represas, um grupo alargado de pessoas que queria ir aos bastidores cumprimentá-lo, como é habitual, viu-se impedido de o fazer por meia dúzia de meninos imberbes e engravatados, com tiques de segurança de discoteca de quinta categoria.
Diziam que não podiam entrar mais de quinze pessoas e que se tratava de "ordens superiores". As quais contrariavam indecente e despudoradamente a vontade do artista, de ter junto de si familiares e amigos. Mas isso parecia, no caso, irrelevante.
Quem conhece o Luís, de resto, sabe bem com que alegria e carinho recebe sempre toda a gente que o quer abraçar e felicitar no final dos concertos. E,  até, como somos já de certo modo uma família os que nos costumamos encontrar todos depois lá dentro, nos bastidores.
As pessoas (e eram muitas) esperavam ordeiramente, cheias de paciência. Mas não adiantava. Não queriam saber de nada. Mantinham-se  imperturbáveis, comunicando por auriculares sabe Deus com quem, e afiançavam que "as regras tinham mudado".
Uma vergonha inexplicável, a qual motivou um comunicado do Luís, hoje mesmo divulgado via Facebook. Dizia assim:
Quero pedir desculpa a todos os amigos, família e convidados que ficaram retidos sem poder entrar no Bar dos Artistas e assim, como é hábito, trocarmos abraços e carinho. Infelizmente o CCB adoptou recentemente regras e comportamentos inqualificáveis quanto a este procedimento que sempre se regeu pelo mais elementar bom senso. Lamento. Os actos ficam para quem os pratica.
Luís Represas
Por mim, mesmo tendo acabado por conseguir entrar, depois de algum tempo de espera e utilizando a minha experiência destas coisas, considero que isto mancha a imagem do CCB. E não sei o que a nova direcção terá a ver com isto, mas por instantes tive saudades da inteligência e da sensatez de VGM.
Enfim, o episódio, em si mesmo lamentável e ridículo, não chegou para afectar a magia e o encanto de uma noite especialíssima. Mas, como diria o outro, "não havia necessidade"...

domingo, 26 de outubro de 2014

Mais perto das emoções


Esta noite é toda ela do Luís Represas, meu amigo e irmão, que faz parte  da minha vida quase desde sempre, e com quem ao longo dos anos tenho vivido muitas outras noites de emoção e sentimentos.
Mas nenhuma é igual. E esta foi, talvez, a mais diferente de todas. Mais intimista e intensa, mais virada para dentro, e ainda mais perto do que, no mais fundo de nós, nos faz enternecer e sonhar.
No palco, menos músicos e instrumentos do que é habitual; apenas um piano, um contrabaixo e a voz singular de um cantor excepcional, que arrepia e encanta, que nos leva para longe e permite sentir o que é impossível de explicar.
Um concerto é sempre um momento especial. De entrega e de cumplicidade. Nada a ver com o dia a dia, em que ouvimos as canções, gostamos delas  e fazemo-las nossas, passamos a sentir que nos pertencem também um bocadinho e a associá-las  a histórias vividas, que só nós sabemos. Mas é nos concertos que elas ganham mais vida e mais sentido, que se nos colam ao coração e à pele, e que a relação entre quem canta e quem ouve cantar se torna mais próxima. Como um longo e festivo abraço.
O Luís diz que "as notas são como as cores. Só aparentemente solitárias". Hoje, através delas e das canções de antes e de agora, fizemos juntos uma imensa viagem, daquelas que se saboreiam devagar e se recordam durante muito tempo, ou mesmo para sempre.
O Ricardo Ribeiro (que nunca tinha ouvido ao vivo) e o Stewart Sukuma (que eu não conhecia), também eles donos de magníficas vozes,  ajudaram a tornar tudo ainda mais bonito e a noite verdadeiramente diferente. Tocante. Inesquecível. "Tomara que fosse sempre assim..."
(Fotografia de Mónica Joady, encontrada há algum tempo, algures pela net.)

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Badalhoquice(s)


Ainda sobre o malfadado e inenarrável AO, o que se conseguiu foi criar uma confusão ainda maior e esta "rebaldaria" a que se assiste hoje, que  admite tudo e mais alguma coisa, e que ouvi há dias uma pessoa que muito prezo classificar, muito apropriadamente, como uma "badalhoquice".

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Fantasia

 
Hoje, bastar-me-ia deitar a cabeça no teu colo e sossegar no calor do teu abraço e em tudo o que nele me desconcerta, me perturba, me alicia, e me faz querer tudo e tanto, muito para além do que sei que podes e ainda assim me dás... 
 

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Saudades de Espanha


Gosto de Espanha, já se sabe. Do flamenco, das palmas e olés. Dos cavalos e dos touros. Dos lunares, dos abanicos e das castanholas. E de todos os tópicos que lhe estão associados.
E tenho às vezes saudades daquela alegria genuína que se estende noite fora, que mistura risos com copos e charlas de amigos, sem fronteiras, nem nada a separar-nos; e por isso os nossos encontros duram quase sempre até que o sol e a claridade anunciem  um novo dia.
Há memórias inesquecíveis dessas noites de festa, com momentos obrigatórios, com sevillanas e rumbas e a inevitável Maria la Portuguesa, quando já  a noite vai alta e bem regada de cañas, de tintos de verano, de rebujitos, de cubatas, ou seja do que for; e tudo aos berros:

 ¡Ay, María la portuguesa!
Desde Ayamonte hasta Faro
se oye este fado por las tabernas.
¿Dónde bebe viño amargo?
¿Por qué canta con tristeza?
¿Por qué esos ojos cerrados?
Por un amor desgraciado,
por eso canta, por eso pena.
¡Fado! porque me faltan sus ojos.
¡Fado! porque me falta su boca.
¡Fado! porque se fue por el río
¡Fado! porque se fue con la sombra.
 
  

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Abatimento

 
Às vezes, só às vezes, era como se o mundo inteiro lhe caísse em cima; e parecia não haver nada, nem ninguém, que pudesse sequer estar perto de entender o que era só silêncio, solidão, e uma profunda e gigantesca tristeza, que desatava lágrimas há muito reprimidas, ou era apenas cansaço e consumição.
 

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Expressões e frases detestáveis (II)

 
Depois de "ser muito amigo do seu amigo", lembrei-me de mais um frase feita, igualmente execrável, e que se ouve a toda a hora.
Esta: "as desculpas não se pedem; evitam-se". Pois eu acho que as desculpas pedem-se, sim. E que assentam tão bem a quem as pede como a quem as aceita. Sem exageros, é claro. Não se trata daqueles casos de pessoas que pedem desculpa por tudo e por nada, que quase parecem estar sempre a desculpar-se até pelo simples facto de existirem, num exercício humildade de tal modo levado ao extremo que acaba por soar a falso. Ou das que pedem desculpa apenas por uma conveniência qualquer, sem sinceridade, e voltam repetidamente ao mesmo.
Falo dos pedidos de desculpas genuínos de quem reconhece o erro ou a falta de razão e é capaz de os assumir sem orgulhos parvos nem teimosias sem sentido.  As desculpas são, nestes casos, sinal de inteligência e de consideração pelo outro, e contrariam as frases tontas que se vão repetindo sem pensar.

Ao Deus dará


Neste fim de semana morreu uma aluna da minha escola. Tinha treze anos. A história é má demais para ser verdade. E no entanto...
Estava sozinha em casa, de madrugada, com quatro irmãos mais novos, o que era frequente, ao que parece. Sem que se saiba com exactidão o que aconteceu, a casa começou a arder. Ela conseguiu salvar os quatro irmãos de quem habitualmente se ocupava, mas não conseguiu salvar-se a si mesma.
Eu não a conhecia, embora possa ter-me cruzado com ela inúmeras vezes, no pátio, nos corredores, nas entradas e saídas de tantos dias do primeiro mês de aulas. Dramas como este e heróis quase anónimos assim são, infelizmente, bem mais frequentes do que seria admissível e humanamente aceitável. Mas quando está demasiado perto de nós parece tocar-nos mais.
Fiquei a pensar nisto muito tempo e vieram-me à ideia esta e outras histórias igualmente dramáticas, umas que conheço e outras que apenas pressinto em alguns  olhos tristes de quem se senta na sala de aula todas as manhãs, alheado e distante; e de todos aqueles para quem a escola é ao mesmo tempo refúgio e enfado, dos não podem querer saber o que é o superlativo absoluto analítico, ou o que quer dizer comment ça va, quando a sua preocupação mais urgente é sobreviver à miséria, seja ela de que  tipo for.
Agora que volto a estar outra vez mais perto da realidade, sei bem  que há muitas crianças que crescem e vivem sabe Deus como, sozinhas, abandonadas à sua sorte, que é antes o seu azar.  E que, apesar de todos nos sobressaltarmos com estas histórias doridas e pungentes, como a da Sira, logo voltamos à nossa rotina para nos queixarmos da crise e dizer mal dos políticos, sem termos bem a noção de como é fácil, e organizada, e boa a nossa vida.

sábado, 18 de outubro de 2014

A meter água...


O assunto já foi amplamente discutido, eu sei, mas não resisto. Porque ontem li no jornal um artigo de Paulo Pereira de Almeida chamado "António Costa: a serena incompetência", que me parece dizer de forma clara o que também para mim é óbvio, embora haja quem prefira não o querer ver.
Diz assim:

As recentes afirmações de altos responsáveis da Câmara Municipal de Lisboa (CML) sobre as inundações em vários pontos centrais da cidade constituem - em si mesmas - uma ameaça à segurança e à garantia de uma ação eficaz da parte da Proteção Civil.
E foi com uma enorme surpresa e incredulidade que pudemos, na passada terça-feira desta semana, assistir a um conjunto de "esclarecimentos" de diferentes dirigentes da CML que apontavam - de um modo certamente concertado - para a "inevitabilidade" da ocorrência de acumulações massivas de água da chuva na capital portuguesa. Foi assim que - de uma maneira que é bem reveladora da sua serena incompetência - o presidente da CML e atual líder do Partido Socialista (PS) António Costa surgiu nos principais meios de comunicação social a admitir que "nada" pôde, poderia, ou poderá, vir a ser feito para evitar a repetição do caos em segurança urbana e proteção civil que Lisboa viveu na passada segunda-feira.
Ora acontece que - para além de serem profundamente preocupantes -, as afirmações de António Costa só podem deixar muito intranquilos todos os que habitam, trabalham, circulam e vivem a cidade. Vejamos - pois - de uma maneira mais concatenada, as razões de preocupação para cada um destes grupos de cidadãos. Em primeiro lugar, e para os que trabalham e comutam todos os dias entre as suas casas (muitas vezes fora de Lisboa) ficámos a saber que - em caso de chuvas fortes e de outras intempéries - não está garantido que consigam aceder ao seu local de trabalho ou regressar a sua casa depois do trabalho; será, a todos os títulos e ironicamente, uma espécie de "greve self-service" sem hora marcada dos potenciais transportes, o que só encontra paralelo em cidades do terceiro mundo. Depois, em segundo lugar, e para os que fazem das ruas de Lisboa o seu local de comércio e que já vivem atualmente sobrecarregados de impostos e numa enorme crise, ficámos a saber que a CML nada lhes garante em termos da segurança e da proteção dos seus bens e dos seus espaços comerciais; ora para o presidente da maior autarquia do País (e agora candidato a primeiro-ministro) só poderá ser contraditório defender os mesmos comerciantes quando se trata de lhes pedir o voto e agora, no momento em que se adivinham outras ambições, deixá-los à sua sorte. Por fim, em terceiro lugar, e para os turistas e todos os que circulam e vivem a cidade de diversas formas e em diferentes condições sociais, ficámos ainda a saber que Lisboa tem um presidente que nada faz (ou, pelos vistos, fará) para garantir a segurança de circulação e a preservação dos espaços públicos. É que - note-se bem - se com uma chuvada intensa mas curta Lisboa fica transformada no caos que se pôde observar na segunda-feira, nem quereremos imaginar o que poderá suceder com uma verdadeira tempestade, ou com um potencial nevão.
António Costa é um político de uma escola que - aparentemente - não olha a meios para atingir os seus fins. Para quem tem memória política, ainda se recordará dos tempos em que Costa era ministro da Administração Interna e prometia que os registos das câmaras de videovigilância nas estradas serviriam como prova para punir as infrações dos condutores; e também se lembrará de quando, já presidente da CML, Costa não hesitou em colocar em causa o trabalho do seu colega de governo do PS Rui Pereira, então ministro da Administração Interna, em nome de uma Lisboa mais segura.
Ironias à parte, merecíamos melhor como candidato a futuro primeiro-ministro.
 
 
Mas, segundo consta, na próxima semana volta o sol e o calor, pelo já ninguém pensa nisto, até porque a segurança, como outras coisas, é assunto que só nos preocupa depois da(s) catástrofe(s).

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Incerteza(s)


Para um amigo tenho sempre um relógio
esquecido em qualquer fundo de algibeira.
Mas esse relógio não marca o tempo inútil.
São restos de tabaco e de ternura rápida.
É um arco-íris de sombra, quente e trémulo.
É um copo de vinho com o meu sangue e o sol.

                                               
                                                                          António Ramos Rosa

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Banalidades dos dias


Virei a mesa de trabalho de frente para a janela, para poder ir olhando a rua quando levanto os olhos do que me ocupa e absorve, que se me concentro a sério posso até esquecer-me que o mundo existe.
O vício, trouxe-o agarrado ao corpo dos últimos quatro anos, dias inteiros a olhar a Praça de Alvalade até lhe conhecer o mais pequeno recanto e todos os cambiantes de luz e de cor na passagem das horas. E de imaginar as vidas de quem apressada ou demoradamente passava lá em baixo, adivinhando percursos e histórias que jamais poderia confirmar nem desmentir e não eram senão puro exercício da imaginação, de imediato esquecidas. Outras vezes nem chegava a fixar o olhar;  deixava-o à solta, a deambular vadio e indolente pela rua e pelo céu fora, fantasioso e disperso, enquanto os ruídos da cidade e dos aviões, em constantes chegadas e partidas, me sossegavam e me levavam para longe, no doce embalo do sonho.
A minha rua de agora já não é como a Praça de Alvalade, e o que vejo da minha janela é muito mais silencioso e quieto. Mas o hábito instalou-se, permanece igual.
E hoje, enquanto olhava distraidamente quem passava lá fora, lembrei-me desta canção de Brassens:

Je veux dédier ce poème
À toutes les femmes qu'on aime
Pendant quelques instants secrets,
À celles qu'on connait à peine
Qu'un destin différent entraîne
Et qu'on ne retrouve jamais.

À celle qu'on voit apparaître
Une seconde à sa fenêtre
Et qui, preste, s'évanouit,
Mais dont la svelte silhouette
Est si gracieuse et fluette
Qu'on en demeure épanoui.

A la compagne de voyage
Dont les yeux, charmant paysage
Font paraître court le chemin
Qu'on est seul, peut-être, à comprendre
Et qu'on laisse pourtant descendre
Sans avoir effleuré la main

(...)

Chères images aperçues
Espérances d'un jour déçues
Vous serez dans l'oubli demain
Pour peu que le bonheur survienne
Il est rare qu'on se souvienne
Des épisodes du chemin

(Fotografia de Maria Cristina Guerra)

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

O último Resnais


É um filme que vale a pena ver. Não apenas por ser o último filme de Alain Resnais, estreado poucas semanas depois da sua morte, em Março deste ano. Nem por Resnais ser um realizador incontornável, obrigatório para quem, como eu, gosta de cinema e muito especialmente de cinema francês.
Aimer, boire et chanter é um filme que adapta uma peça de teatro (Life of Riley) de Alan Ayckbourn, como já acontecera com Smoking/No Smoking, por exemplo, situando-se por isso entre o teatro e o cinema num processo de mise en abyme, e jogando sempre com a dualidade entre a ficção e a realidade, o passado e o futuro, a vida e a morte.
Tem excelentes diálogos interpretados com humor e subtileza, mas também com uma intencional ausência de naturalidade pelo leque de actores habituais nos seus filmes, como Sabine Azéma, André Dussolier, Caroline Sihol, Hyppolyte Girardot e outros.
Mas tem muito mais: a peculiaridade de a personagem principal, à volta da qual gira toda a história, nunca chegar a ser vista. E as habituais inquietações artísticas de Resnais, como a questão do tempo, que está sempre presente e se manifesta  no filme de várias maneiras.  (É genial a questão das pausas, enunciada pelas personagens de Kathryn e Colin, por exemplo...)
Eu gostei muito. E, como diria um amigo meu: ide ver, pois -  e dizei-me se tenho ou não razão.... 

sábado, 11 de outubro de 2014

A alegria das pequenas coisas


Ir ao cinema é um dos meus grandes prazeres. E tenho uma predilecção especial pelo cinema francês.


sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O Prémio Nobel


Nunca liguei muito ao Prémio Nobel, que sempre me pareceu muito mais baseado em critérios políticos do que outra coisa qualquer. E não é apenas por o único nome da literatura portuguesa que até agora foi distinguido com esse galardão ser um escritor que eu considero menor, ou pelo menos muitíssimo inferior a outros nomes que, quanto a mim, o mereceriam muito mais, para dizer o mínimo.
Desta vez, confesso a minha total ignorância. Nunca li Patrick Modiano, apesar de conhecer  razoavelmente a literatura francesa. Pior: nunca ouvira falar dele.
Mas afinal, verifico que há quem pense mais ou menos como eu. Maria Alzira Seixo, a cuja opinião dou sempre muito valor, disse isto:
JEAN ÉCHENOZ é o maior romancista francês vivo - lamento, estimados colegas do Comité Nobel... Além disso, e para só dar um exemplo, a literatura portuguesa actual é muito mais rica que a francesa. E não é bem uma opinião: uma vez que trabalho de perto com ambas, considero que é um facto.
Também no DO, encontrei hoje um texto de Rui Herbon, com o qual concordo. Aqui fica uma passagem: 
Talvez isto dos prémios não seja assim tão importante (...) quem se recorda hoje os senhores Mommsen, Mitral, Spitteler, Rolland e Sillanpää? Quem me sabe dizer se o prémio foi concedido a Galsworthy ou Gawsworth e qual a especialidade do dito premiado? E o que dizer da lista dos não premiados, que inclui nomes como Proust, Conrad, Joyce, Musil ou Borges? Na realidade a academia sueca parece cometer erros iguais ou semelhantes aos de qualquer júri de província, e não receber esse prémio, para um grande escritor, talvez seja uma honra muito maior.
E é isto!...

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Inevitabilidade(s)

 
(...)
Et la vie sépare ceux qui s'aiment
Tout doucement sans faire de bruit ...
(...)
                                                     
                                                         (Jacques Prévert)


 
(Fotografia de mfc, do blog Pé de Meia)

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Uma questão de prioridades


No regresso à escola, há várias coisas que me surpreendem e impressionam e até algumas que, de certa forma, me horrorizam. Parece-me chocante, por exemplo, que alunos de catorze ou quinze anos saibam o que é um "complemento oblíquo" e um "verso decassilábico", mas não sejam capazes de dizer qual o assunto de um texto que acabaram de ler. Ou que saibam o que é uma "palavra derivada por parassíntese", mas não conheçam o significado de "modesto", de "solícito", ou de "esmerado".
É talvez por isso que volto a ouvir uma coisa que apenas me tinham dito há  anos, na altura em que comecei. Que falo "caro", com palavras "sofisticadas", segundo me disseram hoje. 
Infelizmente, não se trata de exagero meu. E não me refiro apenas a um ou dois exemplos isolados, mas a um grande número de alunos, que é provavelmente a maioria.
Mas há outras coisas. Muitas outras. Hoje, há também o drama dos Centros de Estudos ou de Explicações, que se tornaram, mais que uma moda, uma praga e um verdadeiro "negócio da China", com efeitos absolutamente nefastos, uma vez que há neles pessoas de formação duvidosa que fazem os trabalhos de casa aos meninos e os impedem de ser autónomos. Chegam à escola com tudo feito, mas num discurso que se percebe à distância não ser o deles, cujas frases têm até, muitas vezes, dificuldade em ler. E a qualquer pergunta que se lhes faça para além do que ali está escrito, não são capazes de responder. Este é um exemplo de hoje: "Aqui, nesta frase, temos um paradoxo". "E o que é um paradoxo?" "Sei lá!", é a resposta.
Faz-me confusão que os pais não se apercebam disto, que se limitem a deixar os filhos manhãs ou tardes inteiras nestes "centros", achando que é assim que eles estudam mais e melhor, quando é exactamente o contrário que acontece.
Mas, no fundo, somos todos um pouco responsáveis pelo estado a que isto chegou. Porque tendemos ao facilitismo e à infantilização do discurso. (De resto, apesar da educação literária ter sido reintroduzida (e bem) pelas Metas Curriculares, ainda há quem defenda que grande parte dos textos não deveria fazer parte dos programas por se tratar de textos "muito difíceis"). Porque há muito a preocupação do exame e da preparação para responder de forma mais ou menos formatada a um modelo específico de prova, quando se devia ver mais longe e ensinar a pensar, a ser capaz de manifestar uma opinião e de defender uma ideia com argumentos, a ler, a escrever e a falar com correcção. E já agora também com prazer, se não for pedir muito...
Não se pode simplesmente fazer porque nos dizem que "é assim". Pergunto-me o que teria acontecido se todos os professores se tivessem recusado a ensinar o Acordo Ortográfico, que é uma aberração que mutila a língua. No ponto em que estamos, uns sim, outros não, outros assim-assim e toda a gente escreve de todas as maneiras. Como se isso não fosse relevante.
Enfim, poderia multiplicar os exemplos, mencionar  a falácia da escola inclusiva e tantas outras coisas. Mas o que me parece óbvio é que algumas boas vontades não chegam; e que enquanto as prioridades estiverem todas confundidas e erradas, dificilmente a Escola poderá fazer um trabalho sério e, acima de tudo, eficaz, cumprindo a sua função primeira, essencial na definição do modo como pensamos, como sentimos, como vemos o mundo.

domingo, 5 de outubro de 2014

Ode Marítima, segunda vez

 
Tinha ido em Março. Voltei ontem. E o que vi não foi o mesmo. Mas foi igualmente intenso e arrebatador. Para quem vê, como para quem faz certamente, cada representação é única, ainda que o texto e os intervenientes sejam os mesmos.
Não é a primeira vez que vejo um espectáculo do Diogo Infante mais de uma vez. Porque ele faz sempre tão bem o que quer que seja, que uma vez não chega.
No entanto, como ele dizia ontem, este foi o seu papel mais difícil e o mais marcante. Para nós também. Este é, sem dúvida, o papel de uma vida. Não apenas pela dificuldade de decorar um texto tão extenso e tão complexo, "maior que nós", como eles disseram, mas pela forma como se apropriou dele e o interpretou; e como nos levou com ele naquela viagem ao mais fundo de si, e de nós, ao lado mais obscuro das emoções, das fragilidades e dos medos, expondo-se e entregando-se na totalidade de corpo e alma, e transfigurando-se até aos limites do possível. 
Quem vê esta Ode Marítima nunca mais volta a ler o texto da mesma maneira, porque ele ficará para sempre marcado por uma impressão digital tão forte.
E percebe com mais clareza que não é actor quem quer, mas quem já nasce artista e assume essa sensibilidade e a exterioriza assim, sem nenhum pudor.
O que achei também extraordinário, ontem, foi que, depois daquele turbilhão que quase nos esmaga, o Diogo e o João sentaram-se no palco e conversaram com a assistência, com a simplicidade que os caracteriza, como se fazer aquilo que tínhamos acabado de ver fosse tão natural como respirar.
Não conheço todos os actores do mundo; nem preciso. E, ainda assim, tenho a certeza que o Diogo Infante é o melhor  de todos eles.
Gostava de poder agradecer-lhe, nem que fosse apenas pelo que vi em Março e ontem; mas nunca seria capaz de encontrar as palavras certas. Por isso, digo só isto: Obrigada, Diogo!
 

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Complexados


Uma das facetas mais irritantes dos portugueses é a mania de que somos muito bons nas línguas. De que falamos quase todas. E bem, claro. Gabamo-nos disso, dizendo, com indisfarçável orgulho,  que somos muito diferentes dos outros povos e dando de imediato como exemplo os vizinhos aqui do lado.
Não há português que não considere dominar fluentemente pelo menos o inglês e o espanhol, ainda que fale inglês como o Mourinho, ou espanhol como o Sócrates. Ainda me lembro de, quando decidi ir aprender espanhol, ouvir muitas vezes: "Aprender espanhol para quê? Eu sei falar espanhol e nem precisei de aprender." Típico...
Mas, pior que isso, é o facto de não querermos perder nenhuma, mas mesmo nenhuma, oportunidade de exibir esses conhecimentos e de mostrar toda a nossa sapiência.
Há o exemplo patético, a que já assisti milhentas vezes, de um turista dirigir-se a um português para pedir uma informação, esforçando-se, apesar do sotaque, por exprimir-se no nosso idioma, e o português responder-lhe automaticamente na língua que adivinha ser a do estrangeiro, com um sorriso condescendente, onde se lê, implícito, este pensamento: "Tão querido, a tentar falar português, que é tão difícil! Nem sabe que não é preciso. Nós falamos tudo. Somos tão simpáticos e hospitaleiros..."
Esta é um tendência transversal, comum a todas as faixas etárias e classes sociais. Agora, há até algumas faculdades portuguesas em que as aulas, todas, são em inglês.
Ainda hoje, no encontro "Presente no Futuro", no CCB, entre um público supostamente culto e até mais ou menos selecto, pelo menos na aparência, pude testemunhar uma vez mais  esta nossa ridícula, para dizer o mínimo, maneira de ser.
Discutia-se a liberdade. Havia meia dúzia de oradores estrangeiros: um professor neozelandês de Direito e Filosofia da Universidade de Nova Iorque, uma filósofa turca, professora de Ciência Política e Filosofia em Yale, ou um escritor canadiano e professor na Universidade de Harvard, para referir apenas os que eu ouvi. Exprimiam-se, como é natural, em inglês. Mas havia, como é óbvio e habitual nestas situações, tradução simultânea para quem entendesse dela necessitar. Pois, no período destinado ao debate, a assistência insistia em colocar questões em inglês, apesar de ter sido expressamente pedido que as perguntas fossem feitas em português. E, perante a insistência para se utilizar a nossa língua, ainda deixavam escapar uma frase ou expressão em inglês (provavelmente para que ficasse claro que não era por não saberem Inglês que se exprimiam na sua própria língua).
É nestes pequenos sinais, nesta mania de nos vangloriarmos daquilo que nos deveríamos antes talvez envergonhar, que nós mostramos o nosso subdesenvolvimento e o quanto somos complexados.
Eu, que sou toda das Letras, defendo o mais possível a aprendizagem e o domínio de outras línguas. Que são, também elas, outras visões do mundo. Claro que falarmos inglês ou seja que língua for (e já agora bem) é óptimo. Mas fazê-lo em detrimento da nossa língua é que já me parece um absurdo. E não vejo ninguém preocupar-se com isso. Falar ou escrever com correcção deixou de ser relevante. É-o cada vez menos. Basta ouvir, ou ler a Comunicação Social, por exemplo. Mas não só...
No episódio de hoje, o que tornou tudo isto ainda mais explícito, para mim, foi o facto de na assistência estar um espanhol, também ele professor em Yale (não deveria, por isso, ter propriamente problemas com o inglês), mas que quando quis intervir fê-lo, sem hesitar, na sua língua.
É este orgulho pelo que é seu que nós devíamos aprender com nuestros hermanos, em vez de os criticarmos, como fazemos habitualmente. Pode até ser que essa seja uma das razões que explica que eles nunca tenham sentido necessidade, ou tido vontade, de fazer um Acordo Ortográfico com os restantes países que falam espanhol.

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A minha música

Hoje é o dia Mundial da Música. Quem me conhece sabe que não sou de efemérides, mas quanto à música posso fazer uma excepção. Porque ela me é fundamental. Todos os dias e nas mais diversas circunstâncias. E, entre as poucas coisas que lamento, não ter aprendido música a sério, é uma delas.
Mas, felizmente, há quem o faça por mim, certamente bem mais e melhor do que eu o faria, se fosse o caso.
Por isso, hoje, felicito e agradeço a todos os músicos que têm contribuído para encher de música a minha vida, e assim ser mais feliz.
À cabeça da lista, Luís Represas e João Gil, cuja música me acompanha quase desde sempre e que são, para mim, não apenas músicos, mas também amigos.

Hoje, o João Gil escreveu isto no Facebook, que me parece significativo:
Assinalo este dia mundial da Música com uma canção que compus num dia de Primavera com as janelas abertas ao silvado das andorinhas no bater da folhagem dos choupos numa rua de Lisboa.
Abri o livro de poesia de Florbela Espanca naquela página que há tempos tinha marcado com um pedaço de papel, por ter achado engraçado uma auto-citação.
Acreditem, entrei em loop e em transe porque escutava e reproduzia a música que saía das palavras.
Nós os autores , que muitas vezes somos tidos como uns seres esquisitos, afinal é coisa simples, basta estar disponível e ouvir o que as palavras têm para dizer e servir de corrente dessa transmissão, transformando-as em som.
Escolhi a versão original, apesar das inúmeras versões fantásticas, porque o Luís marcou o " território " com a sua alma.

 
Letra: Florbela Espanca
Música: João Gil
Intérprete: Trovante
 
Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!
 
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
 
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhas de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!
 
E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dize-lo cantando a toda a gente!

Mas, além deles, muitos outros. A música francesa, a música brasileira e o flamenco, em diversos momentos e por diferentes razões, também ocuparam e ocupam um lugar de destaque na minha história. Aqui ficam alguns exemplos: