sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Vida e Alma



(Fotografia de Neuza Ayres)

Ontem, uma vez mais, estive no lançamento de um livro de Helena Sacadura Cabral, que é sempre um momento de festa.
Não costumo simpatizar especialmente com aquelas pessoas muito consensuais, de quem toda a gente gosta muito. Em geral, tenho tendência para preferir as personalidades controversas, que se amam ou odeiam com semelhante intensidade.
A Helena é, porém, uma excepção; talvez a única. Porque ela é, de facto, um ser humano extraordinário, que consegue, para lá do inevitável aparato mediático, fazer de cada um destes lançamentos um verdadeiro encontro de amigos, com toda a alegria que é lhes é própria. E que é, também, capaz de se emocionar e de emocionar-nos pela maneira sincera como abre o coração e fala do Miguel e do que sente e do que pensa; e do seu "caminho das pedras." E como mantém sempre o sorriso, e a força, e alegria de viver. É que, como ela diz, a vida vai-se vivendo em cada dia, em cada hora. E tem às vezes um lado muito negro. Mas é possível, ainda assim, "realizarmo-nos e ter prazer com isso".
O livro tem um título lindíssimo: Vida e Alma, é em formato mais pequeno do que o habitual, e de capa dura. Diferente dos outros, diz a Helena. Porque o que ela quis fazer, inicialmente, foi um livro de orações. E depois achou que ainda não era a altura. Este é um livro de sentimentos e de pensamentos, de um caminho de encontro consigo e de tudo o que a ajudou a viver este difícil ano e meio. É por isso que o dedica ao padre Tolentino de Mendonça.
"Espero que goste!", disse-me. Ainda não o li, apenas o folheei, mas sinto e sei, no fundo do coração, que sim. Vou gostar, Helena! Porque é "o olhar íntimo de que tanto necessitamos"; e porque também eu "acredito no valor das palavras" e que é "através delas que o mundo se muda". As palavras da Helena transmitem-(me) sempre sabedoria, sensatez e serenidade. E, cada vez que estou com ela, sinto que a Helena é já uma amiga. Estou certa de que muitos sentirão o mesmo.
É talvez isso que explica que para a ouvir e lhe dar um abraço haja sempre gente de todas as idades e das mais diversas proveniências, que ela recebe com o seu magnífico sorriso, inteira disponibilidade e afecto genuíno. Ontem, até o Pai Natal lá esteve; vejam só...


quinta-feira, 28 de novembro de 2013

O meu céu


Olho lá para fora e o meu olhar distrai-se agora em muito mais coisas. Já não é só uma nesga de céu com os aviões a passar de cinco em cinco minutos, vistos através de uma abertura pequena, num canto escuro onde o sol não chega e mundo exterior parece nem existir.
Agora, a parede inteira é uma enorme janela rasgada sobre a Praça e é como se, neste pedaço de bairro, tão característico, eu visse a cidade inteira a meus pés, a agitar-se nas rotinas de um quotidiano que é seu, meu, nosso.
Aqui há vida! Há as pessoas que caminham lentas ou apressadas, há os barulhos e as luzes e o movimento das ruas, que vão sendo diferentes consoante as horas do dia. Há a estátua bem ao centro, em primeiro plano, na direcção dos meus olhos, a abençoar-nos e a lembrar que isto é Lisboa, o que seria impossível esquecer ou ignorar...
E depois há o sol, há imenso sol, a estender-se pela chão, pela mesa, e a aquecer-me as pernas à tarde.
Só eu sei como me sabe bem este silêncio e este sossego. E como esta tranquilidade me permite trabalhar mais e melhor.
No fundo, é tudo muito simples. Às vezes, muitas vezes, basta um pequeno pormenor para se ser mais feliz.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Vergonha(s)



Decididamente, hoje, dedico o dia às palavras dos outros, porque o que encontro nelas, muitas vezes, se assemelha ao que eu penso também. Este é um assunto que tenho evitado, mas que não ignoro.
No blogue Espumadamente, de Nelson Reprezas, encontrei este texto, intitulado "Já envergonha", que tomei a liberdade de copiar para aqui.
E, por coincidência, também Vasco Graça Moura (uma vez mais!) escreve no DN mais ou menos sobre o mesmo tema, numa crónica intitulada "Duas vergonhas nacionais".

Já envergonha 

Faz-me muita confusão (mas não devia…) perceber que o meu país está gradualmente a ficar refém de um limitado número de desordeiros que se entretêm a ocupar ministérios, Assembleia da República, interromper actos públicos e insultando governantes em linguagem de carroceiros (de carroceiros malcriados, porque os há decentes). 
A comunicação social resfolega com isso e vai transmitindo estes espectáculos com uma linguagem adequada, qual seja aquela língua de trapos que aprenderam na faculdade ou, de outro ângulo de análise, transmitindo um sentido aos acontecimentos que está longe de ser correcto e verdadeiro. Isto não está bem. O país não é isto e eu diria mais. Os tremendos sacrifícios a que a população em geral tem vindo a ser submetida mereciam deste grupelho de gente comandada pelo PC, por via da CGTP e da anódina e irrelevante UGT, mais respeito. Porque são gente que sofre na pele os efeitos de uma crise para a qual não contribuíram, salvo, quiçá, o voto que depuseram num partido irresponsável como o Partido Socialista e que, em muitos casos, não têm sequer a garantia de um posto de trabalho, como tem a maioria destes ditos sindicalistas e demais figurantes. 
Há ainda as elites. As aulas magnas, os novos partidos, as esquerdas renovadas (muito se renovam as esquerdas para dizerem sempre a mesma coisa…) e os intelectuais que nos enchem a cabeça com esta conversa redonda do dia-a-dia e que nos enche as televisões e que, tal como os sindicalistas e outros figurantes, estão bem empregados, ou «pensionados», mas acham imensa graça pairarem na ribalta dos noticiários com ideias mais ou menos arrevesadas sobre a putativa felicidade do povo português. 
Já cansa. Os portugueses não merecem esta gente. Merecem que a crise passe depressa, para o que têm já demonstrado uma notável acção participativa e continuam impermeáveis até aos apelos à violência das elites que querem correr o governo à paulada ou dar tiros parecidos com o que matou o rei D. Carlos. E a pergunta, final, é. Na verdade, acções como ocupar ministérios ou fazer greves já nem se sabe porquê, são acções legais? Parece que agora querem pôr mais vinte polícias em cada ministério. E isso significa o quê? Que a ocupação era ilegal e havia polícia a menos? Mas se era ilegal, estão á espera de quê para deter os Arménios que aparecem de dez em dez minutos nas TV’s, os Lourenços pauliteiros ou mesmo as Rosetas ressabiadas?

Duas vergonhas nacionais 

(...) A segunda vergonha nacional traduz-se na já consabida propensão do Dr. Mário Soares para a obscenidade política. (...) por se tratar de um ex-presidente da República a quem não ficava mal um pouco mais de compostura. Não me faz impressão nenhuma que uma aula magna inteira vocifere em coro com ele. Podia ser até um estádio de futebol. O que me faz a maior das impressões é que alguém, que foi presidente da República Portuguesa ainda não há muitos anos, salte para a ribalta nos termos destemperados em que o fez. Mais nenhum ex-presidente da República, mesmo que com críticas pontuais ao actual, se achou justificado para fazê-lo. Tratou-se de uma tentativa insensata de manipulação das massas:não há nenhum mecanismo constitucional que permita a destituição pretendida - logo, não é em nome do estado de direito, nem da legitimidade constitucional, mas da barafunda revolucionária que o dr. Soares e alguns apaniguados pretendem falar. (...) A verdade é que, em nenhum momento do seu mandato, Cavaco Silva deixou de cumprir ou violou a Constituição. Toda a gente o sabe. O que é deveras deprimente, não é que a esquerda finja ignorá-lo, é que o dr. Soares a acompanhe nessa vergonhosa ficção.

(Vejo agora que também HSC fala disto, hoje, no seu Fio de Prumo, com a sensatez que a caracteriza. Para ler aqui)

Ainda a literatura


A acusação de elitismo (...) convida a um debate demorado em torno das missões da Escola. A questão pode formular-se deste modo: deve as Escola abdicar dos textos "difíceis" apenas porque são "difíceis"? Ou deve, pelo contrário, esforçar-se por criar condições para que o contacto com esses textos (que são decisivos sob o ponto de vista cultural) sejam facultados a todos os alunos, em especial áqueles que, de outra forma, nunca chegariam a conhecê-los? O desafio maior deve ser o de encontrar um ponto de equilíbrio entre o imperativo da "inclusão" e o desenvolvimento da "cidadania", sendo que ambas as palavras concorrem para o ideal mais nobre da escola pública: o de conceder a todos as mesmas oportunidades. Se bem analiso a situação, os novos programas de Português (e também as metas que dele resultam) constituem um notável avanço e não um retrocesso. Reforçando o peso da Literatura, reconhecem que esta se encontrava menorizada nos programas anteriores; aceitam a importância identitária de que se reveste no contexto da cultura portuguesa, recuperam o alinhamento sadio da história literária sem cair no historicismo, preservam a centralidade dos textos no espaço lectivo e fazem deles (dos textos literários e também dos outros tipos de texto) via de conhecimento e de treino comunicacional. (...) 

Não, desta vez não é Vasco Graça Moura. É um tal José Augusto Bernardes, professor da Faculdade de Letras de Coimbra, de quem eu nunca ouvi falar, mas que escreve hoje no DN um artigo de opinião com o qual concordo inteiramente. Além disso, este assunto interessa-me (deveria interessar-nos a todos, na verdade), e diz-me respeito. Por isso tenho insistido tanto nele e por isso o trago aqui uma vez mais. E suspeito que não será a última...

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Ao fim de um ano e meio...




Um ano e meio depois de me ter aventurado neste mundo, apercebi-me hoje, ao começar a escrever, que era a trecentésima trigésima terceira vez que o fazia. Dito de outra forma, este é o meu post número 333. É um número interessantíssimo e por isso não posso deixar de o assinalar, sem querer parecer excessivamente narcisista.
O número três está associado à perfeição, ao céu e à harmonia, por causa da Santíssima Trindade e de tantas outras trilogias, porque é princípio meio e fim, presente passado e futuro... Neste caso trata-se, ainda por cima, de uma capicua, na simetria de ser o mesmo e seu reverso que é, segundo se diz, indício de boa sorte. Tudo a ver, portanto.
É que o balanço que faço destes dezoito meses continua a ser muito positivo, mesmo se se perdeu de certo modo  a aura de novidade e encantamento dos primeiros tempos. Agora, continuo a ver um lado muito interessante e arrebatador em tudo isto, mas já conheço, também, em parte, o que pode haver  de menos bom.
Lembro-me de ao início me terem dito que a blogosfera era mais ou menos como a vida. Eu acreditei. É diferente, contudo, conhecer na pele essa verdade. Que há gente maravilhosa e gente verdadeiramente estranha, surpresas boas e más, alegrias e decepções, aprendizagens significativas e episódios que é preferível esquecer. A única diferença é não nos olharmos nos olhos. E, tal como na vida, procuro guardar só a parte boa.
Dizem-me os cépticos destas coisas que uma pessoa se expõe muito; e podem até ter razão. Eu continuo, no entanto e, apesar de tudo, a gostar de estar por aqui. Porque escrever é antes de mais um prazer e, em certos dias, é quase uma necessidade. Escrevo o que penso e o que sinto, o que me emociona e motiva, ou impressiona, sem qualquer tipo de pretensão. Não me interessa se tenho muitos ou poucos leitores, ou quantos comentários tem cada texto, não estou em concorrência com ninguém, embora, na verdade, vá estando atenta ao número de leitores e me saiba muito bem saber que há gente do lado de lá das palavras, que lê o que escrevo e que o comenta, concordando ou discordando; e que, outras vezes, apenas lê.
Às vezes ponho-me a pensar quem serão essas pessoas e como terão chegado aqui. E a minha curiosidade faz-me ter vontade de lhes conhecer as caras e saber como soam as suas vozes. Ao longo do percurso, como é natural, muitos foram ficando pelo caminho, porque afinal não eram o que pareciam, porque os seus blogues me desinteressaram e por tantas outras razões e circunstâncias. Mas há também os blogues e as pessoas que me acompanham desde o princípio, que se tornaram muito "cá de casa", que hoje continuam a ser cais e porto de abrigo, que me ensinam imenso e me mostram outros rumos, com quem tenho  aprendido muito mais do que sei dizer e pelas quais consigo sentir hoje verdadeiro apego, que é já cumplicidade, amizade e afecto.
E por isso continuo o meu caminho, peito aberto e alma ao léu, mostrando-me assim, tal como sou. E espero que continue a ser tão bom como até aqui, porque, enquanto me der prazer, fico por cá.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Claro e escuro


Ao longo do tempo, evoluímos e transformamo-nos em função do que somos, do que vemos e do que vamos sentindo e experimentando.
E, mesmo se acreditamos que nos conhecemos muito e bem, constantemente nos surpreendemos com o que descobrimos de nós. Porque haverá sempre na nossa vida - e também na dos que nos são próximos - zonas secretas, inconfessáveis desejos, gestos por explicar, sentires irredutíveis a palavras.
Todos somos claro e escuro, luz e sombra, dia e noite. Mas talvez seja na aparente contradição e incerteza entre o que se revela e o que se oculta que resida grande parte do encanto de cada um de nós, no aliciante de um mistério por desvendar.
É por isso, também, que a a transparência total me parece inatingível. Por maior e melhor que seja a intimidade, em nós e no(s) outro(s) permanecerão sempre alguns recantos inacessíveis do ser, pedaços recônditos indissociáveis do fascínio que provocam em nós. Conhecemos os outros, de facto, como julgamos, ou idealizamo-los também, à mercê da nossa fantasia, inconstante, transitória e instável?
Mas há depois os momentos fulgurantes, de sintonia perfeita, de entrega total de corpo e alma e de radiosa felicidade, capazes de nos surpreender, porque alguma coisa se desata de repente e nos desarma ao revelar-se, como uma luz a brilhar na escuridão.

(Fotografia de Paulo Abreu e Lima)

domingo, 24 de novembro de 2013

Parabéns Luís!


Tem uma voz única e excepcional, que eu não hesitaria em escolher para a banda sonora da minha vida. Porque me tem acompanhado ao longo tempo, há  tantos anos que já nem sei quantos são, e porque nunca, mesmo nunca, me canso de a ouvir.
Gosto do Luís Represas como se gosta dos amigos verdadeiros: tal e qual como eles são! Por isso, hoje, que faz anos, dou-lhe um abraço apertado e um enorme beijo de parabéns. E agradeço-lhe, também, por me embalar os sonhos e, com a sua música, tornar mais bonitos os meus dias.


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

À lareira



Depois de um fim de semana de sol e de mar segue-se-lhe outro totalmente diferente, de frio e chuva, a pedir recato e intimidade. Mas são estas vicissitudes que dão, também, encanto à vida.
Hoje, quando regressava num fim de tarde de um dia especialmente cinzento, húmido e agreste, enquanto apressava o passo para me defender do frio cortante que se me entranhava por todos os poros e sonhava com o calor da casa, antevendo as horas de calma, de preguiça, de aconchego e de bem-estar, lembrei-me de uma canção do tempo da minha adolescência, ou até de antes dela. Coisa mais antiga...



quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Um amor assim



Não, não quero falar de futebol. Não quero saber do Ronaldo nem do mundial; e toda esta gigantesca euforia nacional me passa ao lado. Parece-me absurda e desproporcionada. É-me absolutamente indiferente. Não me vanglorio com as vitórias, nem me humilham as derrotas. Vou sabendo o que passa, porque não há outro assunto. Hoje, o país é só futebol. Amanhã volta a crise. E depois de novo o futebol, em rigorosa  alternância. Triste país este, que apenas no orgulho futebolístico se assume patriota.
Mas, para mim, hoje, és tu o meu país e até o mundo. Porque quando me olhas nos olhos, ainda vejo às vezes tudo a andar à roda; e o coração começa a bater mais apressado; e há vontades a crescer-me nas mãos, e na pele, e no corpo todo, na inevitabilidade do desejo, na urgência do  abraço apertado e  na vontade imensa de te querer ter, ansiando e antecipando a vertigem do prazer.
Nem preciso que me ames para sempre. Basta-me o aqui e o agora  de todas as vezes que se foram somando e eternizando, de tantos momentos de cumplicidade e risos confundidos,  de tudo o que ainda me fazes pensar e sentir, e mesmo do sabor amargo de tantos  dias e noites de saudade sem tamanho, de distâncias e esperas, de dor e lágrimas silenciosas, de mágoas e de desalentos, que também foram fazendo a nossa história, tão simples e tão bonita, por mais estranha e inexplicável que ela possa parecer a quem não a conhece pelo lado de dentro. É que, quando o amor é enorme, cabe numa vida inteira.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Fazer das fraquezas força



Há sempre um "fazedor de histórias" escondido no fundo de cada um de nós. São as nossas histórias que nos recriam quando estamos despedaçados, moribundos, ou mesmo destruídos. É o narrador, o fazedor de sonhos, o construtor de mitos, que é a nossa fénix, aquilo que somos no melhor de nós mesmos, da nossa criatividade.

Estas são palavras de Doris Lessing, que morreu há dois dias com 94 anos, no discurso a propósito do Prémio Nobel. E com elas encontro hoje, de novo, no Fio de Prumo de HSC, qualquer coisa que se ajusta ao meu dia.
Mesmo quando se tenta aceitar tudo com a naturalidade da inevitável passagem do tempo, há dias de desânimo e de perda, em que sobra a saudade de um colo antigo, que se sabe não voltar.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Fascínio(s)



Homme libre, toujours tu chériras la mer! 
La mer est ton miroir; tu contemples ton âme 
Dans le déroulement infini de sa lame 
Et ton esprit n'est pas un gouffre moins amer 

Tu te plais à plonger au sein de ton image; 
Tu l'embrasses des yeux et des bras, et ton coeur 
Se distrait quelquefois de sa propre rumeur
Au bruit de cette plainte indomptable et sauvage. 

Charles Baudelaire

Quem nasce e vive sempre à beira-mar, cria nessa proximidade um inexplicável apego, que mistura  temor, enlevo e assombro, que é conforto e encorajamento, ou simples sentimento de harmonia com o universo. É como se a imensidão das águas tivesse em si, além da esmagadora beleza que lhe é inerente, uma transcendência que exalta e apazigua, que é príncípio e fim, símbolo do porvir, desejo de infinito.

(Fotografia de Isabel Santiago Henriques)

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Viajar no Inverno



http://www.youtube.com/watch?v=9mGjh-oaGY4

Sou visceralmente citadina. Quem me conhece sabe da minha paixão por Lisboa, por Paris e por Sevilha. E do meu desejo de conhecer outras cidades, Buenos Aires, Nova Iorque, Rio da Janeiro. 
Há nas cidades um magnetismo, um mistério, uma magia qualquer, que não sei explicar e me seduz.  Deslumbro-me a vê-las despertar e ganhar vida logo de manhã, cativa-me o movimento das ruas, o bulício ao fim da tarde e os silêncios e ruídos que diferenciam as noites e os dias. Atrai-me a vida a correr contra o tempo como se tudo fosse sempre muito urgente e delicio-me a descobrir recantos tranquilos e secretos. Gosto das especificidades de cada lugar, das cores, dos sons e dos cheiros que os caracterizam, de admirar a arquitectura dos edifícios onde o novo e o antigo coexistem, às vezes em harmonia e outras vezes nem tanto, de observar as pessoas e olhar atentamente as centenas de coisas que em cada momento me passam diante dos olhos e me avivam o espírito. 
Na verdade, sempre que penso em viajar, é de uma cidade que me lembro em primeiro lugar. E faltam-me tantas!... Na Europa, por exemplo, faltam-me quase todas as cidades românticas: Veneza, Praga, Budapeste, Bruges, Florença, Roma, Amsterdão. Ah, tivesse eu mais tempo e, sobretudo mais dinheiro, e já teria ido a quase todas.
Mas evito viajar no Verão. Porque é um tempo de excessos. Há o calor e as moscas e gente a mais por todo o lado. Mesmo quando as férias grandes eram em Agosto, gostava de aproveitar os feriados de Dezembro para sair. Nem que fosse para Espanha, sempre aqui tão perto.
No ano passado experimentei pela primeira vez sair entre o Natal e o Ano Novo. E foi muito bom. Tanto, que este ano gostava de poder repetir. A hipótese ainda surgiu (e era Veneza), mas afinal parece que já não vai ser possível. Não importa! Lembra-me aquela canção de Reggiani:
Venise n'est pas en Italie/ Venise c'est chez n'importe qui/ Fais-lui l'amour dans un grenier/ Et foutez-vous des gondoliers/ Venise n'est pas là où tu crois/ Venise aujourd'hui c'est chez toi/ C'est où tu vas, c'est où tu veux/ C'est l'endroit où tu es heureux.
E, apesar da minha extrema urbanidade, às vezes também tenho vontade de silêncio e de sossego. E acontece-me querer "perder-me" em fundo verde, ou azul. Sou mais praia do que campo, ainda assim; sinto o apelo da água mais do que o da terra e, por isso, gosto frequentemente de me escapar para junto do mar. É o que vou fazer já hoje!...

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Impressão

Era uma tarde linda de Outono de um dia quase perfeito, iluminado por um sol ainda morno, que uma aragem fresca suavizava. A lembrar um fim de tarde de Verão. Nas ruas a imagem habitual, o passo apressado de quem tem hora marcada e sabe exactamente que direcção seguir,  a contrastar com o movimento ondeante dos que apenas vão deambulando em ritmo de passeio,  aproveitando a temperatura amena e olhando à sua volta devagar, embrenhados naquele semi-sossego de meros espectadores, misturando-se com os turistas atentos a cada pormenor, e o rio, sempre mais ou menos igual, quieto e cintilante, a revelar-se ou ocultar-se em cada volta de esquina.
E de repente, o insólito acontecia. Um homem atirava-se do miradouro de onde usualmente se  admira a cidade na sua estonteante e romântica beleza; e caía desamparado, daquela altura descomunal, no meio dos passantes.
Não o vi cair. Mas a imagem do corpo estendido no chão, morto, à espera de ser levado, entre o aparato policial e uma pequena multidão que se foi juntando e, em murmúrios e suposições sussurradas, numa insensata e repentina morbidez, queria saber todos os detalhes, agarrou-se-me ao  dia e aflige-me até agora.
Impressionou-me muitíssimo aquele corpo caído, mais solitário ainda no abandono do meio da rua,  do que na tragédia de uma morte que escolhera tão violenta. E mesmo sem conseguir imaginar, sequer remotamente, pergunto-me quanto desespero cabe num acto como este.  

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Aprender a escrever



Retomo aqui um assunto que me é especialmente caro, porque é talvez um dos eixos fundamentais da minha vida profissional. E porque tenho de referir, de novo, o excelente artigo de opinião de Vasco Graça Moura, hoje no DN, com o qual concordo na íntegra, que vem ao encontro daquilo que penso há muito tempo e que, por motivos vários, nos últimos dias, tem sido tema de conversa com várias pessoas.
O texto, intitulado "O ensino do Português", trata sobretudo da discussão pública do "Programa e Metas Curriculares de Português", de que eu já falara também na semana passada.
Diz, por exemplo, isto: Vale a pena ler o documento do Ministério da Educação, muito bem fundamentado e com objectivos claramente enunciados. (...) valoriza-se a importância da literatura no ensino do Português, salienta-se a "dimensão prospectiva e o potencial de criação que significa a leitura dos clássicos" e entende-se o texto literário como uma realidade em que "convergem todoas as hipóteses discursivas de realização da língua". (...) Trata-se, como também ali se lê, de "escrever para aprender e escrever para pensar, na sua articulação com o ler para escrever." E termina com esta frase: Em si mesmo, este programa de Português para o ensino secundário é já parte de um guião fundamental para uma verdadeira "reforma do Estado".
Escrever deveria ser o centro das preocupações da cada professor de Português, apesar de eu saber, na pele, quanto isso custa. É um trabalho lento e árduo.
Há pessoas que nascem com jeito para escrever, como há as que nascem com jeito para dançar, ou para cantar. E, no entanto, toda a gente, mesmo os que não têm esse talento, que é como um dom, podem aprendê-lo, com esforço, persistência e a técnica adequada. Não haverá um Balzac nem um Camilo dentro de cada um de nós, mas trabalhando a escrita qualquer pessoa pode ser capaz de se exprimir muito razoavelmente deste modo.
O que não se pode é pretender que alguém chegue ao 12º ano e seja capaz de fazer um comentário de frase, num texto bem estruturado e linguisticamente correcto, apresentando argumentos válidos, quando durante os anos anteriores não se trabalhou nesse sentido. Aprender a escrever é um caminho que se vai construindo desde cedo e que leva anos. E, aos poucos, vai-se aprendendo também a organizar o pensamento e a estruturar o discurso, a assumir pontos de vista e uma visão do mundo mais consciente e mais crítica. E descobre-se o prazer que tudo isso pode proporcionar. E percebe-se que a leitura e a escrita estão absolutamente interligadas; e que para escrever é preciso, antes de mais, ler.
Por isso continuo a dizer o que sempre digo. Ensinar ou aprender Português tem que ser ler, ler, ler; e escrever, escrever, escrever. E ler textos literários. Porque quem lê um texto literário e consegue entendê-lo, será sempre capaz de entender qualquer outro tipo de texto. O inverso é que já não é verdadeiro.
Sei muito bem do que falo. E sei o trabalho que tudo isto dá. A quem aprende e a quem ensina também. Porque é preciso ler e corrigir muitos textos, indicar em cada um o que está bem e o que está mal, onde e como melhorar.
Mas ensinar Português é muito isto. É sobretudo isto. E só assim faz sentido. E depois, é indizível a alegria e o orgulho de ver alguém a crescer e a revelar-se escrevendo. E saber que, de algum modo, se contribuiu para chegar até ali. E que é possível ir ainda mais longe. 

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Verão de São Martinho

 

(Some days you hear a voice taking you to another place 
Some days are better than others) 

Nesta altura do ano, neste dia, fala-se sempre do "Verão de S. Martinho", que segundo a lenda, sobejamente conhecida, seria a recompensa de Deus em relação ao gesto do soldado Martinho, o qual, não tendo mais nada consigo, ofereceu a sua capa a um pobre mendigo que o interceptara no caminho.
Não sou grande fã de castanhas e, por isso, os magustos próprios da época não me dizem muito.
Mas gosto destes dois ou três dias com um calor fora de tempo, despedida definitiva do Verão e ponto de viragem para os rigores do Inverno, cada vez mais próximo.
Hoje, se pudesse, era num lugar assim que eu gostava de estar, de cabelo solto no vento, corpo rendido ao sol e olhos perdidos no horizonte, inebriando-me de azul em silencioso arrebatamento...
(Fotografia de Paulo Abreu e Lima)

domingo, 10 de novembro de 2013

Às voltas com o tempo


Se exceptuarmos a "Festa do Cinema Francês", que já foi há umas semanas,  tenho andado um pouco afastada do cinema.Voltei ontem. E, desta vez, contrariando a tendência habitual, calhou um filme inglês, About time, de Richard Curtis. O mesmo de "Quatro Casamentos um Funeral" ou "Notting  Hill". 
O filme -  "Dá tempo ao tempo", na versão portuguesa - é também uma comédia romântica, de certo modo. Mas é mais que isso. Em termos genéricos, a questão que coloca é se seríamos mais felizes ou se poderia a nossa vida ser mais perfeita caso pudéssemos viver cada momento uma segunda vez. Para nessa nova oportunidade corrigirmos o que correu menos bem. Por isso tem aquele lado fantasioso, que dá à personagem principal  a capacidade de voltar atrás no tempo. E que a leva a concluir, no final, que a mágoa e a imperfeição fazem parte da vida e que mais importante do que procurar uma plenitude mais ou menos paradisíaca é ver o lado único e bom de cada instante. 
Enfim, não será um grande filme, mas é um filme tranquilo e bem-disposto. Um hino à vida e ao que há nela de mais simples. E depois tem as paisagens lindas da Cornualha, Domhnall Gleeson a fazer-nos rir no seu desajeitado e enternecedor Tim Lake, a personagem principal à volta da qual tudo gira, uma deliciosa Rachel McAdams e o impagável Bill Nighy no papel de um pai  afectuoso apesar de contido e, acima de tudo, muito bem-humorado. Razões de sobra para fazer deste filme uma história que vale a pena ver.
Mas, nem que fosse por esta canção de Nick Cave, que eu adoro, já teria valido a pena.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A arte da fotografia


(Fotografia de Paulo Abreu e Lima)


(Fotografia de Isabel Santiago Henriques)


(Fotografia de José Manuel Durão)



(Fotografia de Maria Cristina Guerra)

(Fotografia de mfc)
Impossível dizer o quanto eu gosto de fotografia. E como me deleito e demoro a apreciar as imagens que de algum modo me tocam. Gosto do olhar peculiar sobre a realidade, da forma subjectiva de tentar capturar um instante e segurar o tempo, imobilizando-o, da história que contam, apelando também à nossa imaginação e sentimento. Gosto de imagens com alma.
Talvez por isso, prefiro também os blogues que associam texto e fotografia, em detrimento dos que são apenas uma das coisas. Porque me parece haver nessa complementaridade um acréscimo de significado. Assim, no meu Isto e Aquilo é raro um post sem imagem. E há milhentas na internet, para todos os gostos. Algumas são muito bonitas. Mas confesso que me faz um pouco de impressão publicá-las sem lhes conhecer a autoria e a proveniência.
Gosto muito mais de usar fotografias como estas, de fotógrafos com nome e com rosto, que eu conheço pessoal ou virtualmente, e cujos excelentes trabalhos admiro tanto.
Nunca saberei agradecer-lhes convenientemente a generosidade de me deixarem fazer também um pouco minhas as suas obras de arte. E reinventá-las, na emoção que provocam em mim e que permite transformar o (meu) mundo num lugar mais belo ainda.
É isso que explica que hoje, subitamente, me tenha apetecido homenageá-los. Exprimir a minha gratidão. A todos os fotógrafos cujas fotografias já utilizei, e em especial a vocês, Paulo, Isabel, José Manuel, Cristina e MFC, muito obrigada!

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

L'Étranger



Devia ter dezasseis ou dezassete anos quando li l' Étranger pela primeira vez. E esse contacto inicial com um dos grandes autores da literatura francesa foi para mim de uma importância determinante, apesar de, na altura, não ter sequer consciência disso. Mas lembro-me ainda da estranheza que o livro me causou, misto de desconforto, apego e inquietação. A ponto de nunca mais ter conseguido esquecer o seu fortíssimo incipit: Aujoud'hui, maman est morte. Ou peut-être hier, je ne sais pas.
E de querer conhecer mais livros e autores da língua pela qual tenho, ainda hoje, uma tão grande paixão. Só mais tarde viria a perceber que esta obra, publicada em 1942, adapatda ao cinema em 67 por Visconti, traduzida em variadíssimas línguas e muito lida, mesmo na actualidade, é um dos textos incontornáveis da literatura-mundo.
Albert Camus (1913-1960), o seu autor, nasceu há exactamente cem anos. É um escritor que me marcou, um dos que fazem parte da minha vida. Foi o DO que me relembrou a comemoração do centenário. E, uma vez mais, vale a pena ler o que Pedro Correia escreveu sobre ele
E para os que acham que a literatura só interessa às pessoas das Humanidades, aí está a prova de que ela pode ser capaz de modificar-nos e de nos ensinar a procurar um significado para a vida, nem que seja na coexistência com a sua impossibilidade.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

O Programa de Português


Desde ontem, e até dia 2 de Dezembro, estão em consulta e discussão públicas os novos programas de Português para o ensino secundário e as metas curriculares. São sessenta páginas, que ainda não pude ler de fio a pavio. Mas, para já, aquilo que li agradou-me muitíssimo. Porque volta a dar à literatura o papel de relevo que ela deve ter no ensino do Português. Voltam assim a estar no programa textos fundamentais da cultura portuguesa, que é obrigatório conhecer. Falo, por exemplo, da poesia trovadoresca, das crónicas de Fernão Lopes, da Peregrinação, ou do Amor de Perdição. E de tantas outras obras e autores que, de uma maneira inexplicável, haviam desaparecido dos programas.
Como o próprio programa refere na introdução: (...) a complexidade textual apresenta-se como uma das variáveis decisivas na compreensão da leitura e, concomitantemente, na produção textual, em particular escrita. É ela que permite o desenvolvimento de capacidades de compreensão mais elaboradas e robustas, que naturalmente tenderão a reflectir-se nas opções realizadas ao longo da vida, quer dentro da escola, quer fora dela. (...) O presente Programa valoriza o texto literário no ensino do Português, dada a forma diversificada como nele se oferece a complexidade textual. A literatura é um domínio decisivo na aquisição da compreensão do texto complexo e da linguagem conceptual, sendo, além disso, um repositório essencial da memória diversificada de uma comunidade, além de um inestimável património que deve ser conhecido e estudado (...) na sua dialética entre memória e reinvenção. (...) Em suma, defende-se uma perspectiva integradora do ensino do Português, que valoriza as suas dimensões cultural, literária e linguística.
Estranho muito as declarações da Associação de Professores de Português. Ou talvez não, porque já é hábito discordar completamente das suas posições. Quem disse um dia que o texto de um exame de 4º ou 6º ano era muito difícil porque "obrigava os alunos a pensar", vem agora, de novo, e confessando não ter ainda lido o novo programa, defender a ideia de que os alunos das áreas de ciências não têm que aprender literatura.
Como um dia já disse aqui:  Não admira que os alunos do secundário, hoje, gostem cada vez menos de Português. E tenham sérias dificuldades na interpretação de textos e enunciados e na expressão oral e escrita. Porque além de leituras superficiais de textos tão básicos quanto possível, obrigam-nos a saber o que são orações subordinadas adjectivas relativas explicativas, ou os mecanismos de coerência e coesão textual, distinguindo "catáforas" e "anáforas"; e também a classificar os "actos ilocutórios", dizendo que uma determinada frase  ou enunciado é "um acto ilocutório assertivo", por exemplo, ou a aprender figuras de estilo  abstrusas como "zeugma", "quiasmo" e "hipálage", que seis meses depois já não saberão o que significam. Mas, estranhamente, destas barbaridades quase ninguém fala. E muito menos a tal Associação de Professores de Português.
O que os alunos precisam, antes de mais, é de aprender a pensar, de desenvolver o espírito crítico e a capacidade de argumentação. E  de descobrir a importância das palavras; e que a leitura e a escrita  podem ser um enorme prazer. E de conhecer, pelo menos, os autores de língua portuguesa.
É por haver muita gente sempre disposta a defender o facilitismo e o nivelamento por baixo, o utilitário e o explícito, que este país atingiu níveis de ignorância e de iliteracia tão generalizados e gritantes como os que vemos, ouvimos e lemos todos os dias.
E enquanto se entender a escola como o lugar onde impera o que é conhecido e fácil - e por isso se insiste excessivamente nas novas tecnologias e nos "powerpoints"-, e se esquecer que os livros e a literatura nos abrem um mundo inteiramente novo e nos podem ensinar tanto sobre nós e sobre a vida,  não poderemos passar desta mediocridade dominante.
A escola só faz sentido se for a indicação de outro caminho, a abertura de horizontes, uma descoberta face ao que é desconhecido e diferente. Mostrar como isso pode ser bom é a obrigação de todos os professores. E ninguém disse que era fácil. Mas é, sem dúvida, um dos mais aliciante desafios.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Confissão


Quiero que me beses
y a media voz decirte que te amo
y háblame bajito
que nadie se entere
lo que nos contamos
quiero que me beses
que nadie se entere
lo que nos amamos

Por ti seré un angelito
Y guardaré tu corazón
y te daré la luz de luna
que tu corazón buscaba


domingo, 3 de novembro de 2013

(In)sinceridade



Comecei a ler o novo livro de HSC. Chama-se Vida e Alma e diz-se Breviário de Sentimentos, designação que me agradou de imediato. Não sei se por isso, ou se por qualquer outra razão inconsciente, não comecei a lê-lo pelo princípio, mas fui-o folheando um pouco ao acaso, como costumo fazer com os livros de poesia. E encontrei isto:
A vida não se ganha com o medo, ganha-se com a coragem de ser quem realmente somos, ou com o esforço de nos transformarmos em quem gostaríamos de ser. Ou isto: Ninguém vive se não esperar por algo bom, que seja bem melhor do que o que já conhece, já possui ou já experimentou.
E pus-me a pensar em muita coisa. Com o tempo, tendemos a aceitar-nos melhor e assumir ser como somos, com tudo o que isso tem de bom e mau. E tornamo-nos também mais imunes às opiniões alheias. Ao melhor estilo Gabriela Cravo e Canela (Eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim... ).
Eu, por exemplo, tenho a mania da sinceridade. Que pode ser uma qualidade ou um defeito, dependendo do ponto de vista. Costumo defender-me, dizendo que é bom ser sincero para as pessoas saberem sempre com o que contam. Mas, muitas vezes, muitas mesmo, o excesso de frontalidade também já se virou contra mim. Porque nem sempre é fácil encontrar o equilíbrio entre o que se deve dizer e o que é preferível calar. E fala-se demais. E diz-se o que não era preciso dizer. E que às vezes até pode magoar os outros. São também famosas algumas das minhas inúmeras "gaffes". Enfim, gostava de conseguir ser  mais comedida.
E, no entanto, posso ficar verdadeiramente triste se percebo que as pessoas não são sinceras comigo. Mesmo sabendo e tentando aceitar que não somos todos iguais, há poucas coisas que podem decepcionar-me mais.
Mas como diz uma canção de Jorge Palma de quem me lembrei agora: Enquanto houver estrada pra andar/ a gente vai continuar. E, na verdade, a vida vai-se aprendendo a cada passo do caminho.


(Fotografia do blogue Pé-de-Meia, de mfc)