terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A opinião dos outros

 
Não sei por que ainda me espanto. Na verdade sempre fomos um povo demasiado sensível a tudo o que vem "lá de fora". Vê-se nos modos  subservientes com que os portugueses ficam em êxtase perante um estrangeiro, ansiosos por agradar-lhe, apressando-se em mostrar que "falamos línguas estrangeiras" e tudo, mesmo que ninguém nos tenha perguntado nada, ou respondendo em inglês automaticamente, mal detectamos um qualquer sotaque, nem que seja o dos Açores. 
Estou a exagerar, eu sei! Mas faz-me confusão a nossa autoestima sempre em níveis tão baixos, a dependência da opinião alheia, que ganha contornos de verdadeiro delírio nacional se algum estrangeiro ousa dizer bem de nós. Do tipo: eles até sabem quem nós somos...
Mas, ainda assim, pergunto-me porquê tanto alarido na comunicação social e afins só porque uma jornalista com nome de princesa de desenho animado e de marca de pneus se lembrou de dizer que Lisboa era a cidade mais cool da Europa. Porque ela é da CNN (muito importante!) e porque diz coisas extraordinárias como "olhamos para o rio e parece que estamos a ver o resto do mundo", ou "Lisboa é uma cidade com um estilo antigo e elegante" ou ainda "não consigo criticar nada em Portugal" - o que só prova que não conhece bem o país.
Porque quanto ao resto, e em particular ao que diz sobre Lisboa, apetece gritar-lhe: Ó Fiona Dunlop, isso já nós sabemos!...
(Fotografia de Paulo Abreu e Lima, ao jeito de "toma lá mais esta, ó Fiona!")

8 comentários:

  1. Presumo que Miss Dunlop tenha sido paga para, além de fazer o trabalho jornalístico, cometer alguns excessos.
    Ou houve, da parte da menina, uma vontade tremenda de agradar.

    Bem analisado o seu trabalho, o que salta à vista é, de facto, aquela coisa do 'cool'.
    E como nós, portugueses, apreciamos tudo o que soe a estrangeirismo, sentimos um arrepio e saltamos de contentes porque uma Miss Dunlop assevera que "olhamos para o rio e parece que estamos a ver o resto do mundo".

    Deixemos então, as 'Dunlop' do planeta jornalístico esbanjar o seu ar poético e contar histórias para português ouvir.

    Ter a CNN em Lisboa é um acontecimento inexplicável. Para lá de bom.

    Isabel, temos o que temos, não adianta reclamar.
    Sabia que "Lisboa é uma cidade com um estilo antigo e elegante"?
    :D
    Beijinho

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    1. É conhecido e notório o orgulho que tenho na minha cidade e o quanto ela consegue deliciar-me e surpreender-me. Mas, como acontece nos grandes amores, conheço-lhe as qualidades e os defeitos e amo-a apesar deles, tal como é.
      Irrita-me tanto mediatismo em relação a uma opinião que vale o que vale e que tem muito lugar-comum à mistura.

      E dá-me até vontade de rir imaginar, sem precisar de ir muito longe, o efeito que a opinião sobre Madrid ou Paris, de um jornalista português, por mais conceituado que fosse, teria em Espanha ou em França.

      Enfim, sinais do nosso secular provincianismo...

      Beijinho

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  2. Parece contraditório, mas não é: o pessoal da CNN tem "falta de mundo" (e de gosto), caso contrário já teria descoberto Lisboa ( a Nossa) desde sempre.

    Outra coisa: não é em Lisboa que se come melhor. Nem peixinho, nem marisco. Mas isso até agradecemos que desconheçam...

    Beijinho :)

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    1. Eu até não acho mal que venham descobrir Lisboa, mas nunca ninguém a conhecerá como nós, que a conhecemos por dentro e por fora, com todos os seus segredos e recantos e encantos ou desencantos. E podemos até partilhá-la, mas uma parte dela será sempre só nossa.

      Quanto à Fiona Dunlop (raio de nome!) e a todo o mediatismo a propósito das suas banalidades, eu sugiro talvez "uma volta ao bilhar grande", onde poderá descobrir o que é verdadeiramente cool...

      Beijinho :)

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  3. Eu lamento que Lisboa tenha tantos edificios degradados, caso contrário não tenho dúvidas que mais arranjada seria uma cidade única.
    Eu que já tenho trabalhado e trabalho em projetos que envolvem consórcios com pessoas de toda a Europa, uma coisa que noto é que quando chega o momento de se decidir o local de reuniões gerais presenciais, Lisboa está sempre no topo das preferencias. Especialmente para o pessoal do norte da Europa.
    Esta semana tenho cá um cliente em que inicialmente estava previsto as reuniões de projeto presenciais serem alternadas entre Lisboa e Bruxelas. Entretanto isso foi alterado a pedido para serem sempre em Lisboa (algo que eu agradeço), afinal aquele pessoal gosta bastante de cá vir.
    E tenho um primo original de Munique que trabalha em Viena e veio tirar agora mesmo o MBA a Lisboa, afinal os programas são todos mais ou menos os mesmos nas principais escolas, e ele e um colega preferiram vir para Lisboa em detrimento de outras cidades europeias incluindo francesas ou outras.
    No final Lisboa não deixa de ter o seu quê de agradável.

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    1. Ó Sérgio, não percebo seu condicional. Lisboa não "seria" uma cidade única, porque já o é. Eu não sou muito viajada (hélas!), mas não tenho a mínima dúvida que Lisboa tem um lugar de destaque entre as cidades mais belas da Europa e até, talvez, do mundo. E não preciso que venha ninguém "do estrangeiro" dizer-mo. Sei-o, como o sabem todos os que como eu aqui nasceram e aqui vivem e que gostam dela no que ela tem de melhor e de pior, mesmo se não tem a monumentalidade de Paris, ou mesmo de Madrid. Tem sido maltratada e podia estar mais cuidada, de facto, mas não deixa de ser encantadoramente romântica e apaixonante. É de Lisboa, Sérgio? Conhece bem a sua cidade? Já alguma vez a olhou com os olhos limpos como se a visse pela primeira vez? Já se sentou junto ao rio num fim de tarde, já apreciou a luz única das suas manhãs, já se perdeu pelas ruelas de Alfama numa manhã ou numa tarde de Primavera? Se conhece bem Lisboa, Sérgio, será fácil perceber que ela é sedutora, insondável e caprichosa como uma mulher, que se estende preguiçosa junto ao rio com o qual namora incessantemente e que é capaz de surpreender a cada instante.
      Podia continuar, mas termino com uma sugestão: suba ao Miradouro da Senhora do Monte e fique a olhar Lisboa durante dez minutos, em silêncio e solidão. Ou ao cimo do Arco da Rua Augusta... E depois voltamos a falar. Impossível que não perceba que ela tem mais que "o seu quê de agradável". Ela é a materialização da alma portuguesa, simultaneamente dolorosa e sonhadora, como o fado. ;)

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    2. De facto sou de Lisboa: nasci na antiga freguesia de São Jorge de Arroios. Também estudei em Lisboa, e já trabalhei em vários cantos da cidade, estando agora na Expo. Ontem no meu papel de guia turistico levei o pessoal a um daqueles restaurantes que fica na encosta do castelo, e de facto faz muito sucesso. E eu também gosto bastante.
      Mas como lhe digo, por vezes tenho alguma pena de haver tantos edificios degradados, tantos azulejos que podiam ser restaurados, etc. Mas estou a ver que anda muito a pé pela cidade ;)

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    3. Sim, ando muito a pé, por gosto e por necessidade; e é a pé que se conhece uma cidade.
      Devo-o ao meu pai, lisboeta de gema (os meus avós viviam na Baixa) que desde bem cedo me mostrou o que Lisboa tinha de especial. Mesmo sem o dizer. Mostrando-o apenas. Vivíamos no Saldanha e íamos muitas vezes a pé a casa dos avós. E todas as tardes dávamos um passeio com o meu pai. Por isso gosto tanto dos telhados vermelhos e das sardinheiras nas varandas, da roupa branca nos estendais e das lojas antigas da Baixa, das frequentes subidas e descidas e do Tejo sempre à espreita, ao virar de cada esquina.
      Há os edifícios degradados, claro, e é uma pena, mas há também tanta coisa que vale a pena ver. Basta estar atento...
      Só para acabar: uma vez, uma amiga espanhola que tem uma paixão profunda por Lisboa, olhava a cidade do alto do Castelo e virando-se para mim de repente, emocionada, disse-me: será que vocês que vivem sempre aqui e estão habituados a isto têm a noção de como é bonita e única a vossa cidade?
      É isto... e mais! Beijinhos

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