terça-feira, 6 de setembro de 2016

Histórias de Lisboa (III)


Avenidas Novas

O bairro onde vivi os primeiros vinte anos da minha vida é, inexplicavelmente, um lugar por onde nunca passo sem ter a sensação de estar "em casa", mesmo quando na minha cabeça ecoam às vezes velhas canções: ( quand au hasard des jours/ je m'en vais faire un tour/ à mon ancienne adresse/ je ne reconnais plus/ ni les murs, ni les rues/ qui ont vu ma jeunesse). 
É verdade que o bairro é hoje muito diferente do que era naquele tempo, mais incaracterístico, talvez, muitos serviços e um pouco menos de alma. O nosso prédio, de azulejos verdes e brancos, foi substituído por um moderno edifício de vidro e ferro e a muitos outros aconteceram coisas semelhantes. Os cafés e as lojas já não são os mesmos, o padeiro e o leiteiro já não vêm de porta em porta, nem há eléctricos a passar dia e noite; já não há o Val do Rio, nem a drogaria, nem a sapataria na esquina, ou o Alberto confecções.
Hoje, a loja das tintas, na esquina com a Duque d'Ávila, é a Livraria Pó dos Livros e a pastelaria Colombo, na Avenida da República, transformou-se em Mcdonald's.
E, no entanto, apesar de toda estas mudanças que são um natural sinal dos tempos, há no meu antigo bairro pequenos detalhes que parecem tê-lo mantido de certo modo imune à passagem do tempo. Lá continua sempre igual a Versailles, até há pouco lugar obrigatório dos lanches de Domingo com a minha mãe, apesar de nem eu nem ela vivermos na zona, como se mantém igual o Colégio Académico (a "escola dos alunos burros", dizia-se na época), ou a Charcutaria Dava, mesmo ao lado da Pérola do Chaimite, com aquele magnífico cheiro a café, que continuam exactamente iguais ao que eram e são agora as únicas reminiscências de um tempo que  não volta.
Entretanto passei por outros lugares, gostei de uns mais do que de outros e, aos poucos, começo a afeiçoar-me também ao meu novo bairro, que não fica muito longe. Mas este será sempre um lugar que sinto como meu, que me pertence, a que pertenço.

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