quinta-feira, 19 de julho de 2012

Amor clandestino



Souberam ao primeiro olhar que entre eles o amor era uma inevitabilidade e que, para lá de  tudo o que os separava e detinha, haveriam de ceder  à paixão e ao desejo refreados. Demorou. Mas foram deixando que a amizade acontecesse devagar, como uma certeza doce e terna,  fingindo não querer saber de mais nada. As coisas importantes demoram a acontecer, dizem.
Um dia, a vontade tornou-se demasiado forte e  transbordou. Então fundiram-se num súbito abraço, como quem toma o outro de assalto. O coração é que os aproximou. E o que os unia  já era tão forte, que  ficar por muito tempo apertados e agarrados um contra o coração do outro parecia que era tudo o que queriam. Depois, entregaram-se finalmente nas asas do desejo, descobrindo-se e amando-se, numa rendição total de corpo e alma,  até à saciedade. E, daí em diante, as suas existências ganharam uma dimensão inteiramente nova. Aquela entrega incondicional, que é o que o amor tem de melhor, deixara neles uma marca definitiva. 
Seguiram-se muitos momentos cúmplices  e lindos assim, em que se foram conhecendo  e descobrindo mais e melhor, lentamente, deixando que entre eles existisse aquilo que não tinha nome nem estatuto definidos, mas que era demasiado grande e especial, como um segredo que apenas eles os dois conheciam. A essência do afecto que os ligava, invisível para os olhos de toda a gente mas tão profunda, tão forte e tão pura no fundo dos seus corações, proporcionava-lhes um imenso bem-estar e uma maravilhosa sensação de liberdade. Acreditavam que o amor deles, mesmo escondido, não tinha a efemeridade de uma paixão; era um amor eterno, um daqueles amores totais, que vêm para ficar e só se vivem uma vez. Os  momentos vividos a dois davam um encanto especial às suas vidas, esquecidos de tudo o que deixavam para trás quando se encontravam e pertencia a outro mundo, porque, fora daquele universo só deles, a vida real era outra coisa.
Os dias que passavam juntos, sem tempo e sem pressa, eram uma verdadeira loucura. Cansados da agitação que os rodeava,  da correria quotidiana e, sobretudo, daquela sociedade tão mundana e mesquinha, incapaz de compreender ou aceitar a intensidade e a grandeza do amor que os unia, nada lhes sabia melhor que as suas idas ao campo. Era na Primavera que mais gostavam de se afastar de tudo e de partir os dois, esquecidos do mundo, para  a casa simples que um dia haviam descoberto, isolada, no meio de um prado verde.
Quiseram logo que aquela casa fosse deles. A casa parecia, de facto, o refúgio ideal para viverem o seu amor, clandestinamente, como se mais nada e mais ninguém pudesse vir interromper tamanha felicidade.
E depois, ali, naquele lugar tão parecido com o que eles imaginavam ser o paraíso, até a paisagem, com os  tons quentes e os cheiros campestres, estava de acordo com o que sentiam. Estarem juntos fazia dos seus dias dias bons.
Quando chegavam, ela não podia impedir-se de rir, a cada passo, do mau jeito de caminhar com aqueles saltos, e do ar levemente ridículo das suas roupas citadinas, que quase fazia deles actores numa peça errada. Depois, a pouco e pouco, iam-se desfazendo de todos os artifícios que pertenciam ainda ao mundo de onde vinham - e até o cigarro dele parecia estar ali a mais. Ele fazia-lhe a vontade, resistia um bocadinho, mas acabava sempre por deitá-lo fora.
Uma sensação boa invadia-os então, sabiam que a felicidade chegava e deixavam que só o amor tomasse conta de tudo.  Enquanto  lá fora o mundo continuava a girar... 

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