terça-feira, 10 de dezembro de 2013

"Adorar muito" (ou exageros de amor e outras redundâncias...)



Como se já não bastassem todos os "eu antes prefiro", os "encarar de frente", "eu disse-lhe a ele" e "eu pessoalmente", ou os ainda mais óbvios "subir para cima" e "entrar para dentro", há agora a nova moda do "adoro-te muito", que vai ganhando cada vez mais adeptos.
Lembro-me que foi na escola que comecei a ouvir os adolescentes "adorar muito" o que quer que fosse: do(a) namorado(a) à música do momento, passando pelo prato preferido, ou qualquer outra banalidade. Mas era sobretudo para manifestar um afecto excessivo que a expressão mais se aplicava.
Diversas vezes expliquei, com zelo e paciência, que adorar era sinal de um querer extremo, com um elevado grau de significação, não necessitando, por isso mesmo, de ser superlativizado. Porque a palavra em si mesma já indicia muito amor, uma estima desmedida, devotada, aproximando-se, até, da veneração.
Nada a fazer! Hoje, os "adoro-te muito" alastraram como cogumelos e ouvem-se por todo o lado, ditos pelas mais insuspeitas criaturas, convencidas de que manifestam assim de modo mais expressivo e profundo a intensidade dos seus "sentires".
Enfim, amemo-nos muito, pouco, assim-assim ou loucamente, o que quisermos, mas se adoramos, isso já é tanto, que não precisa de ser "muito".
 Há cada mania mais irritante!...

30 comentários:

  1. Boa tarde, Isabel!
    Gostei da lição! Penso que não tenho estes hábitos "criativos" mas se os tiver lembrar-me-ei do que escreveu. Por exemplo, deixei de usar a seguinte expressão:" na minha opinião".... Alertaram-me que não é preciso porque ao dizer-se o que se pensa a opinião já está dada. A outra é a palavra" postura" dele ou dela... Deve -se evitar porque é ligado às galinhas.:) Agradecia que desse o seu parecer.
    Obrigada e beijinho!

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    1. Olá Madalena!
      Posto desta maneira, parece até "arrogância" minha. Isto não é nenhuma lição. É apenas uma expressão que tenho ouvido muito nos últimos tempos e que me irrita de forma particular. Só isso!
      Sou apaixonada por estas questões das palavras (já se sabe) e do que elas exprimem e significam, mas não sou melhor que ninguém, nem estou imune a "modas". Jamais direi "adoro-te muito" (até se me põem os cabelos em pé!) mas há muitas outras coisas "da moda" que acabo por dizer também, à força de tanto as ouvir e até sem dar por isso. Acontece a todos!

      Dito isto, e já que me pede um "parecer", aqui vai ele: Pode dizer à-vontade "na minha opinião". O que é redundante é dizer "na minha opinião pessoal" ou "eu pessoalmente"...
      Quanto à "postura" não sei quem lhe disse isso, mas enganou-a. As palavras são polissémicas, Madalena, isto é: têm vários sentidos e significados. Existe a "postura" das galinhas, mas o modo como colocamos o nosso corpo também é "postura".
      Faz-me lembrar mais duas coisas: há pessoa que acham que não se diz " a gente" e dizem aquela coisa enervante do "agente é da polícia!". Ora, " a gente" é correctíssimo, embora seja um registo um pouco mais familiar do que o pronome pessoal "nós". O erro consiste em utilizar o verbo no plural. Pode dizer-se "A gente vai sair hoje à noite!" e nunca "A gente vamos sair".
      E depois, há ainda o politicamente correcto: hoje muita gente (eheheh!) não diz "bicha" por causa do sentido conotativo que a palavra adquiriu, substituindo-a por "fila" e emendando até quem diz "bicha". Ora "bicha" tem também esse sentido. É pois correctíssimo dizer "estar na bicha" (é o que eu digo...)
      Alonguei-me um bocadinho, eu sei, mas o assunto é inesgotável e eu adoro estas coisas. ;)

      Não precisa de agradecer nada. Beijinho!

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    2. Gosto sempre de agradecer com quem aprendo! E hoje já aprendi umas coisas por isso chamei de lição na melhor das intenções. Também me ri porque sei que estas modas andam por aí.
      Quando as minhas filhas eram adolescentes, principalmente a mais nova, vinham com uns termos que me custava a ouvir. Tais como, os bués, ganda cana, a cena e etc...Hoje sou capaz de utilizar este palavreado, mas colocando sempre aspas. Dá um certo gozo! :)
      Ah!...Já posso novamente utilizar na minha opinião e postura! Agradecida!

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    3. Se gosta tanto de agradecer, então está bem, pronto! Eu sei que foi com boa intenção que usou a palavra "lição", Madalena! ;)

      Quanto aos "bués" e coisas do género não sou capaz de os utilizar e continua a não gostar de ouvir, mas herdei algumas coisas (é inevitável) como, por exemplo, "tipo".

      Beijinho

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  2. Isabel o que eu ri com este post!
    Faltou-lhe "há anos atrás" que oiço todos os dias...
    Bjo

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    1. Esqueci-me dessa, Helena, e na verdade faltam muitas outras. É que a lista é infindável - e eu faço colecção...

      Ainda bem que se riu! Eu também já me tenho rido muito com alguns dos seus posts.
      É possível que ainda volte um dia a este assunto, que eu adoro (mas não muito, claro!) Adoro "tout court"...

      Beijinho

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  3. Um gosto ter chegado ao seu lado onde já me registei.
    Virei sempre que possa.
    Saudações
    Irene Alv

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    1. Um gosto, também, tê-la por aqui, Irene. Venha sempre que quiser, que será bem-vinda.

      Beijinho

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  4. Isabel, e será que não é legítimo brincar com as palavras, de vez em quando? O adoro-te muito de um adolescente é qualquer coisa de saudável. E adorável... :)

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    1. Caríssima CF: estamos a falar de coisas diferentes, penso eu, ou estamos em total desacordo. Brincar com as palavras é legítimo e saudável e adorável até, mas para isso é preciso conhecê-las. De resto, o que é a poesia senão uma certa forma de "brincar com as palavras", subvertendo o seus sentidos mais imediatos?
      Mas não é disso que falo aqui. Quem diz "adoro-te muito" (e não são apenas os adolescentes que o fazem) não está a "brincar com as palavras". Simplesmente desconhece o valor semântico da palavra "adorar" e considera que a intensidade se exprime apenas através do advérbio "muito", o que é revelador, se calhar, de algumas limitações ao nível do léxico activo. Mais: muitos dos que hoje dizem "adoro-te muito", dizem-no porque já o ouviram, e vão de certo modo atrás de uma "moda", sem pensar muito no que estão a dizer. A língua é o nosso património historico-cultural e identifica-nos como pessoas e como nação, até. A consciência linguística ajuda a estruturar o pensamento e alarga a nossa visão do mundo e a nossa capacidade de acção.
      Uma certa irreverência e transgressão associada à juventude é muito saudável, sim, "adorável" até, em certas circunstâncias (nisso estamos de acordo), mas isto é outra coisa. Aceitar qualquer coisa como "ambos os dois" parece-lhe igualmente adorável? É que é o mesmo género de registo. E aceitar tudo na base do "qual é o mal"? é uma coisa com a qual não concordo nada e lembra-me uma "moda" (outra) pedagógica muito em voga há uns anos que tendia a considerar irrlevante um erro ortográfico, por exemplo, porque o importante era que a "mensagem" fosse entendida pelo interlocutor. (Cheguei a ver uma estagiária escrever "acta número cinquo" - juro! e a orientadora achar que isso não era muito grave, porque se percebia...)

      O discurso vai longo, CF, não a quero convencer de nada e o facto de discordarmos parece-me uma coisa saudável, muito saudável, até, mas quis apenas expor-lhe os meus argumentos. :)

      Um beijinho

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  5. Que bela imagem foi buscar! O resto, é isso :)

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  6. Isabel adorei ler este seu post, tanto quanto gosto de ler quase tudo o que escreve. Quando terminei a leitura do mesmo, dei por mim com um sorriso nos lábios. Tenho a certeza de que há muitas redundâncias que não fazem parte do meu vocabulário - as que, por tão redundantes, me fazem rir. Contudo, em relação a algumas, a certeza já não é assim tão grande!... Vou ficar mais atenta a partir deste momento...

    Beijinho

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    1. Maria Vitória, todos nós acabamos por utilizar redundâncias na linguagem quotidiana. É inevitável! Estar atento é bom, mas é como diz: se exceptuarmos aquelas que nunca utilizamos, há algumas que ouvimos tantas vezes e que acabamos por repetir quase sem dar por isso. O que importa é ter consciência e perceber mesmo ao utilizá-las que não é assim ;)

      Obrigada pelas suas simpáticas palavras e volte sempre que quiser, que é um prazer recebê-la "aqui em casa".

      Beijinho

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  7. Apetece-me fazer, deste seu texto, uma espécie de edital e espalhar por todo o lado, incluindo as redacções de toda a comunicação social.
    Brilhante!

    Voltei atrás e dou com uma expressão - comunicação social - que de acordo com algumas opiniões não estará correcta. Porquê? Porque consideram que comunicar é, em si, um gesto social.
    Até que ponto poderemos interiorizar esta ideia?

    Beijinho, Isabel.

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    1. Um edital, António? Não seja exagerado...

      A minha opinião vale o que vale, mas acho um excesso considerar incorrecto dizer "comunicação social". É que nisto, como em tudo, todos os fundamentalismos são, também, perigosos.

      Beijinho

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    2. A sua opinião vale o que vale mas, neste caso, vale muito.

      Afaste-se qualquer tipo de fundamentalismo.
      Afinal, falei apenas do que ouvi dizer.

      Beijinho, Isabel.

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    3. Não aos fundamentalismos, pois! Afinal, aqui e ali, todos empregamos algumas redundâncias, umas vezes dando por elas e outras vezes deixando-nos levar. :)

      Obrigada, António.
      Beijinho

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  8. "Vi claramente visto...", também é redundante (penso que é um pleonasmo, se ainda me lembro dessa aula), mas soa bem e é um classico (eu pelo menos ainda me lembro dele...).
    "Subir para cima", "descer para baixo" e outros do género, diria que são apenas gafes que toda a gente comete especialmente em discurso corrido, uma vez que não me parece que alguém ache que se "sobe para baixo" e vice-versa (quer-se dizer se for sempre para sul, ou seja para "baixo" da minha posição inicial, a dada altura estarei mais a norte, ou seja mais "acima", em relação ao meu ponto de partida, logo neste caso será que "desci para cima"?...)

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    1. Ainda bem que dá esse exemplo, Sérgio. "Soa bem", sabe porquê? Porque aí a redundância é deliberada, visa enfatizar o acto de ver, produzindo simultaneamente um efeito estético. Tudo a ver com aquilo de "brincar com as palavras" de que falava a CF. E por isso é uma figura de retórica - um pleonasmo.
      Dizer "subir para cima" ou "adoro-te muito" ´não é uma mera "gaffe" é um erro que deve ser evitado, porque constitui uma redudância que não acrescenta nada.

      E por favor: não me venho com a história dos pontos de vista. Só falta dizer-me "eu posso estar em cima de um escadote e "subir para cima" de um banco".

      Ai Sérgio essa sua mania de ser "do contra" ;)

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    2. ahahahah! Essa de subir para cima do banco está bem apanhada. Como a do Sérgio S que desce para Sul e às tantas sobe para Norte... Já vi que há mais gente assim do contra como eu. Lembrei-me doutra que está muito na moda: "um grande beijinho". Um grande beijinho deve ser um beijo, certo? :)

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    3. "Um grande beijinho" é mais uma contradição, Paulo, digo eu. Mas pior, mais irritante é "beijinhos grandes" ou "beijoquinhas" (cruzes!).
      A lista destas coisas é infindável. E depois há também as corruptelas: aquelas pessoas que dizem: "controlar a rotunda"; "Trigo limpo Maria do Amparo" ou "bode respiratório". Enfim, vamos coleccionando?
      Olhe, um beijinho, ou um beijo, como quiser... :)

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    4. Só mmais uma acha para esta fogueira, Paulo: O sufixo -inho tem uma carga semântica muitas vezes associada ao afecto. E por isso pode não haver aqui contradição alguma. O "beijinho" não é necessariamente mais pequeno que o beijo, mas antes transporta consigo um acréscimo de tenura. O beijo parece-me sempre um pouco mais "solene" :) Mas tendencialmente direi: um beijinho e/ou um grande beijo (vá lá saber-se porquê...)

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    5. Ainda bem que a Isabel tocou nesse ponto, o do "afecto" e dos "grandes beijinhos" porque para mim, que sou do contra, as palavras, mesmo que contraditórias servem para formar expressões que ajudem, também, a "mudar o mundo"; quando adaptadas às gentes, ao tempo e ao local. Mas isso digo eu, que não sou nada.... De qualquer modo, agradeço a reflexão que aqui iniciou e prometo ter o "máximo" cuidado quando vier escrever aqui, na sua casa. Abraço grande :)

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    6. Querida Teresa:
      Perdoe-me o à-vontade, mas nós somos "velhas conhecidas" quer do "Fio de Prumo" quer do "Assim na Terra como no Céu", os meus dois blogues preferidos. Além disso, julgo que já coincidimos mais de uma vez nas apresentações da Helena. É por isso com imenso prazer que a recebo "aqui em casa". É muito pertinente a sua reflexão e não diga isso que "não sou nada"... Aqui toda a gente é tudo! E, pelos vistos, há muita gente "do contra!" Ainda bem, digo eu. Porque essa divergência de opiniões só pode ser ainda mais enriquecedora. E não precisa de ter nenhum cuidado especial (Já viu a quantidade de "gralhas" que eu também faço?)

      Volte sempre que quiser, Teresa e receba também um grande abraço (não um abracinho, a não ser que seja pelo lado da ternura, claro!) :)

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    7. Do contra? Eu que gosto tanto de a ler? Imagine que não gostava ;)
      Mas... Já aprendi mais uma coisa: "gaffe" em vez de "gafe". Posso ser do contra, mas de um contra atento ;)

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    8. Ser "do contra" não é negativo, Sérgio. De todo. Todos as opiniões são legítimas e essa pluralidade pode até ser muito interessante.
      Quanto às "gaffes" eu uso o termo francês, porque sou muito francófona, (e se é atento, decerto verificou que o pus entre aspas), mas a palavra já foi "aportuguesada" e "gafe" também é correcto. Eu de qualquer modo não digo "gafe", nem "dossiê", nem "uísque". Mas por mera questão de gosto. ;)

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    9. Não é não digo, é não escrevo...

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  9. Querida Isabel
    Muito obrigada pelas suas palavras. Virei sempre que puder :), por duas razões. Em primeiro lugar porque considero a aprendizagem como uma constante da vida e, em segundo, porque já a conheço há algum tempo e sei que a Isabel é uma pessoa de grandes afectos.
    Beijinho para si

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    1. Agora até me comovi, Teresa. Sou de grandes afectos, sim. Não é o melhor da vida?
      Obrigada eu. Venha quando quiser, quando puder, será sempre um prazer. :)

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