sábado, 16 de agosto de 2014

Contagem decrescente

 
Todos os anos era igual. O meio de Agosto, mais que qualquer outro mês do ano, marcava uma viragem. A partir dali  o Verão começava a despedir-se lento, espreguiçando-se ainda vagarosamente em dias de sol e noites de aragem branda, a cidade voltava a encher-se aos poucos e, de forma subtil, os dias iam também ficando mais curtos. Aqui e ali apareciam sinais de  mudança e recomeço, às vezes demasiado visíveis, outras difusos e longínquos.
Desta vez era o mesmo e, no entanto, era diferente. Vivia entre o sobressalto e a calma, entre a mansidão de quem sabe o que quer e consegue antever o que espera, ansiando novidade, desafio, projectos novos, e a inquietação da incerteza, a nostalgia de um tempo que não volta, e milhentas perguntas que lhe passavam pelo espírito e para as quais não tinha resposta nenhuma.
Mas quando se sentava  calada a olhar a claridade do rio e sentia na cara e no  cabelo a brisa da tarde, ou quando pousava os pés na areia húmida da praia e o corpo estremecia com o contacto da água fria, quando deixava os olhos perder-se naquela imensidão quieta ou no ir e vir das ondas de espuma, que a seduziam e atemorizavam de igual modo,  então o coração sossegava; e entregava-se ao devaneio: deixava que o pensamento fosse só fantasia, tomado pelos mais secretos desejos, que lhe pareciam muito perto de ser realidade, embalados assim, pelo vento e o mar.
Era então que  acreditava realmente que seria grande e bom o caminho  novo que estava quase a começar e  até, quem sabe, melhor ainda que tantas insensatas quimeras com que se punha a sonhar no calor das noites de Verão.

2 comentários:

  1. E a verdade é que já temos menos 1h e meia de sol por dia...
    Os frios vêm aí!

    Beijos.

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    1. Ainda mal se dá por isso. Mas Setembro muda tudo ;)

      Beijinho

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