quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Aprender a escrever



Retomo aqui um assunto que me é especialmente caro, porque é talvez um dos eixos fundamentais da minha vida profissional. E porque tenho de referir, de novo, o excelente artigo de opinião de Vasco Graça Moura, hoje no DN, com o qual concordo na íntegra, que vem ao encontro daquilo que penso há muito tempo e que, por motivos vários, nos últimos dias, tem sido tema de conversa com várias pessoas.
O texto, intitulado "O ensino do Português", trata sobretudo da discussão pública do "Programa e Metas Curriculares de Português", de que eu já falara também na semana passada.
Diz, por exemplo, isto: Vale a pena ler o documento do Ministério da Educação, muito bem fundamentado e com objectivos claramente enunciados. (...) valoriza-se a importância da literatura no ensino do Português, salienta-se a "dimensão prospectiva e o potencial de criação que significa a leitura dos clássicos" e entende-se o texto literário como uma realidade em que "convergem todoas as hipóteses discursivas de realização da língua". (...) Trata-se, como também ali se lê, de "escrever para aprender e escrever para pensar, na sua articulação com o ler para escrever." E termina com esta frase: Em si mesmo, este programa de Português para o ensino secundário é já parte de um guião fundamental para uma verdadeira "reforma do Estado".
Escrever deveria ser o centro das preocupações da cada professor de Português, apesar de eu saber, na pele, quanto isso custa. É um trabalho lento e árduo.
Há pessoas que nascem com jeito para escrever, como há as que nascem com jeito para dançar, ou para cantar. E, no entanto, toda a gente, mesmo os que não têm esse talento, que é como um dom, podem aprendê-lo, com esforço, persistência e a técnica adequada. Não haverá um Balzac nem um Camilo dentro de cada um de nós, mas trabalhando a escrita qualquer pessoa pode ser capaz de se exprimir muito razoavelmente deste modo.
O que não se pode é pretender que alguém chegue ao 12º ano e seja capaz de fazer um comentário de frase, num texto bem estruturado e linguisticamente correcto, apresentando argumentos válidos, quando durante os anos anteriores não se trabalhou nesse sentido. Aprender a escrever é um caminho que se vai construindo desde cedo e que leva anos. E, aos poucos, vai-se aprendendo também a organizar o pensamento e a estruturar o discurso, a assumir pontos de vista e uma visão do mundo mais consciente e mais crítica. E descobre-se o prazer que tudo isso pode proporcionar. E percebe-se que a leitura e a escrita estão absolutamente interligadas; e que para escrever é preciso, antes de mais, ler.
Por isso continuo a dizer o que sempre digo. Ensinar ou aprender Português tem que ser ler, ler, ler; e escrever, escrever, escrever. E ler textos literários. Porque quem lê um texto literário e consegue entendê-lo, será sempre capaz de entender qualquer outro tipo de texto. O inverso é que já não é verdadeiro.
Sei muito bem do que falo. E sei o trabalho que tudo isto dá. A quem aprende e a quem ensina também. Porque é preciso ler e corrigir muitos textos, indicar em cada um o que está bem e o que está mal, onde e como melhorar.
Mas ensinar Português é muito isto. É sobretudo isto. E só assim faz sentido. E depois, é indizível a alegria e o orgulho de ver alguém a crescer e a revelar-se escrevendo. E saber que, de algum modo, se contribuiu para chegar até ali. E que é possível ir ainda mais longe. 

2 comentários:

  1. Sabe sim senhora! Sabe muito bem do que fala. Escrever obriga a pensar e é um excelente exercício para o cérebro. Há quem vá mais longe e tenha a opinião que se devia escrever cópias de bons livros literários para melhorar a escrita.
    Um dia, ouvi um actor de teatro dizer que depois de escrever uma carta ou texto li em voz alta. Só assim percebia se a composição estava percetível ao leitor. Habituei-me a fazer este exercício . E não é que o senhor tem razão!...
    Gosto da forma como escreve e das suas análises variadas!
    Beijo.

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  2. Ensinar o prazer da leitura e da escrita é o que me move e fascina, Madalena! Tenho tido, a esse nível, interessantíssimas experiências (umas mais conseguidas que outras, naturalmente.)
    Não estou muito de acordo com as cópias de livros, que podem ser um incentivo ao plágio, mas antes com a sua leitura. Porque escrever exige muito de nós, embora ao escrever sejamos influenciados por tudo o que lemos, vimos e vivemos.
    Não me imagino a dar aulas sem dar prioridade à escrita, que é o mais difícil, mas também o mais aliciante.

    Muito obrigada.
    Beijinho

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