quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Impressão

Era uma tarde linda de Outono de um dia quase perfeito, iluminado por um sol ainda morno, que uma aragem fresca suavizava. A lembrar um fim de tarde de Verão. Nas ruas a imagem habitual, o passo apressado de quem tem hora marcada e sabe exactamente que direcção seguir,  a contrastar com o movimento ondeante dos que apenas vão deambulando em ritmo de passeio,  aproveitando a temperatura amena e olhando à sua volta devagar, embrenhados naquele semi-sossego de meros espectadores, misturando-se com os turistas atentos a cada pormenor, e o rio, sempre mais ou menos igual, quieto e cintilante, a revelar-se ou ocultar-se em cada volta de esquina.
E de repente, o insólito acontecia. Um homem atirava-se do miradouro de onde usualmente se  admira a cidade na sua estonteante e romântica beleza; e caía desamparado, daquela altura descomunal, no meio dos passantes.
Não o vi cair. Mas a imagem do corpo estendido no chão, morto, à espera de ser levado, entre o aparato policial e uma pequena multidão que se foi juntando e, em murmúrios e suposições sussurradas, numa insensata e repentina morbidez, queria saber todos os detalhes, agarrou-se-me ao  dia e aflige-me até agora.
Impressionou-me muitíssimo aquele corpo caído, mais solitário ainda no abandono do meio da rua,  do que na tragédia de uma morte que escolhera tão violenta. E mesmo sem conseguir imaginar, sequer remotamente, pergunto-me quanto desespero cabe num acto como este.  

2 comentários:

  1. Lembro-me de ter escrito um post verídico sobre uma cadeia de suicídios em série. Ainda por cima, parece que a "fatídica coisa" pega-se e mais não digo... :(

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  2. Sim, lembro-me agora de ter lido um post seu antigo aobre o assunto (em Alvalade, creio, ainda por cima). :(

    Nesta caso, fiquei de tal maneira impressionada, que mesmo várias horas depois custou-me adormecer, o que é muito raro acontecer-me...

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