segunda-feira, 15 de abril de 2013

Viver só não é ser solitário



Nem sempre começa por ser uma opção. Muitas vezes é fruto de um acaso qualquer, ou de um conjunto das mais variadas circunstâncias. A verdade é que quem experimenta acaba, quase sempre, por não querer outra coisa. Porque se aprende a ser independente e a gostar disso. Mesmo que no ínício possa até não ser fácil.
Na maior parte dos casos é um percurso lento, feito de altos e baixos, de avanços e de retrocessos, de arrojo e de arrependimento. Do deslumbramento ante a ideia romântica de se ser dono da sua vida e de momentos  em que só se deseja um colo onde repousar a cabeça, ou o calor reconfortante de uns braços que acolham uma fragilidade repentina.
E depois, é preciso saber lidar com a opinião dos outros: dos que olham com desconfiança  para quem gosta de viver sozinho, vendo nisso o sinal de uma anormalidade qualquer e lançando olhares apiedados  de quem  não acredita que isso não signifique uma enorme solidão;  dos que no fundo invejam essa vida, mesmo não ousando confessá-lo, e apenas o deixam transparecer em sorrisos admirados e reprovadores, ansiando secretamente a liberdade de gerir também o tempo com autonomia plena, mas incapazes de se libertar de uma conjugalidade muito mais solitária, mantida a pretextos vários. E, ainda, dos detentores de uma mentalidade retrógrada, mas persistente, que vê em cada pessoa que vive só (e pior se for uma mulher)  um libertino em potência, ou um pinga-amor, disposto a quase tudo por um pouco de companhia. Nada mais irritante, nem mais errado! Mas, como li no outro dia, a verdade é que "à medida que vamos ficando mais velhos, vamo-nos tornando mais sábios e mais imunes às censuras alheias."
Quem escolhe viver só sabe o valor de fazer o que lhe apetece do seu tempo e do seu espaço e a importância do  silêncio de poder estar a sós consigo. Conhece o prazer de dormir demais, ou de se deitar  às horas mais impróprias, de chorar e de rir desalmadamente sem ter que justificar  tristezas e alegrias, de comer no sofá,  à frente da televisão,  ou de deixar coisas por arrumar. 
E de como tudo isso é fundamental para o seu equilíbrio e o seu bem-estar físico e emocional, que permite que estar acompanhado seja vivido de uma forma muito mais plena, que a cumplicidade e a partilha possam ser ainda mais verdadeiras, porque genuinamente desejadas.
E redescobrir, assim, a importância do amor verdadeiro e da companhia, de abraçar quem se gosta com força, na felicidade de instantes vividos na serenidade e na paz de duas vontades em sintonia.
Não é menos amor; pode até ser uma forma de intensificar laços e ligações, de aumentar a intimidade, vivida sem plano prévio,  de experimentar a sensualidade do corpo sem a rotina dos gestos maquinais, feitos quase só por obrigação, do sexo com  horas e dias marcados, como o cumprimento de uma tarefa mais e não como uma prova de amor; e da recusa da vida a dois transformada num inferno quotidiano, que se acredita poder vir ainda a  superar, em nome de um passado que um dia já foi feliz.
Haverá sempre quem não entenda que este não é um caminho de solidão e que viver só não é viver isolado. É escolher ser mais feliz.
E que, nestas como noutras coisas, cada um sabe de si...

19 comentários:

  1. Concordo com a conclusão.

    Há pessoas que pura e simplesmente não são felizes sozinhas.

    Também há que tenha tido uma vida conjugal de mais de vinte anos e que opte, em dada altura, com filhos crescidos, viver independente, com todos os riscos e medos , enfrentando a censura familar e social, que porventura possa existir. Foi o meu caso e não estou nada arrependida.
    Quando se tem filhos e netos, nunca se está sozinho, mesmo quando se vive sozinho. Sou mais pela família que pela solidão total só com amigos ou conhecimentos sociais. Não acredito no isolamento total, mas há que goste ou não tenha outra opção.

    Bjo

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    1. Parabéns!

      Tenho 23 anos de casado, e não estou feliz no casamento, e ainda não tive a coragem de optar por viver só, pois estou só há muito tempo.

      Eduardo

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  2. Na verdade, Virgínia, cada um pessoa deve encontrar a melhor maneira de se sentir bem, consigo e com o mundo.
    O que eu acho irritante é que, ainda que de forma mais ou menos difusa, se tenda a impor um determinado padrão de "normalidade", quando o que se verifica, na prática, é que a quase totalidade dos que o seguem nem por isso são muito felizes.
    Foi o que quis dizer.

    Beijinho

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  3. Na minha óptica, nem viver só implica solidão, nem viver com alguém ao lado implica companhia. A essência é viver em paz e adaptação, o mais feliz possível. Seja com alguém, com um cão ou com um gato, ou sem ninguém a partilhar espaços. A censura social é isso mesmo, censura. Mais não faz que do que tabelar individualidades que não são possíveis de medições cientificas. O nosso erro é se cedermos, e deixarmos de fazer o que nos faz felizes, desde que em respeito por nós e pelos outros, claro. Aí, sim, poderemos ficar realmente solitários.
    Um beijinho para si.

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    1. Estamos de acordo, pois! Agradeço o beijinho. E retribuo.

      Isabel

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    2. Concordo com a Carla. Ainda assim, e falando a nível pessoal, gosto de independência e liberdade. Mas também gosto do lado afetivo. O ideal seria um grande e perfeito equilíbrio entre os dois, o que nem sempre é possível totalmente, por razões várias e, por vezesm até óbvias. Eu também já escrevi sobre isto antes. Para mim, sou toda "mata-me de amor, dá-me liberdade"... :)

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    3. Pois, no fundo todos queremos colo e afecto mas também liberdade e independência, como naquela música "O seu amor, ame-o e deixe-o, ser o que ele é, ir onde ele quiser..." etc., num grande "deslarga-me" mas que ´´e ao mesmo tempo "anda cá que eu dou "cabo" de ti"... Peço desculpa! Hoje estou um bocado aparvalhada, mesmo.

      Mas isto passa-me. É o que tem de bom. ;)
      Beijinho

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  4. Penso que hoje em dia já ninguém censura ninguém por preferir viver só, ter amigos, amantes passageiros, relações de qualquer espécie.
    Até quase que se estigmatizam os casais que se amam e que vivem juntos até à morte. Duvida-se da sua fidelidade, da sua capacidade de entendimento, da sua harmonia. Os meus pais amaram-se durante 40 anos e a morte do meu pai aos 68 anos foi um choque enorme para a minha mãe, que levou muito tempo a recuperar.

    Tudo é possivel quando há amor e liberdade.

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    1. Ai censura, censura... embora não abertamente, claro, porque na aparência, pelo menos, convém parecermos todos muito "mente aberta"...
      Seja como for, no que me diz respeito, nunca fui de me preocupar muito com o que os outros dizem e pensam e agora então cada vez mais faço lema aquilo que dizia a uma amiga minha, outro dia, que me falava num tom demasiado hiperbólico de um post deste meu blog. E eu respondi-lhe que já tenho idade para dizer e fazer só o que me apetece. E assumi-lo, completamente!

      Beijinho

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  5. Esta frase é-me tão familiar: "à medida que vamos ficando mais velhos, vamo-nos tornando mais sábios e mais imunes às censuras alheias."... :p

    Eu sei que é cliché, mas, "por amor de Deus", só temos esta vida (precária e curta) e este corpo, portanto, façamos de tudo para viver bem (no sentido mais amplo da expressão) e caso encerrado! Ou como também li por aí: balelas! :)

    Beijinho

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    1. Está a ver? É que eu sou muito atenta ao que leio... :P
      É isso mesmo, Paulo! fazer de tudo para nos sentirmos bem. Mais nada. O resto sãp só "balelas". Gosto deste termo. É muito musical ;)

      Beijinho enorme :)

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  6. Muito sinceramente não acho que as pessoas finjam que têm a mente aberta, acredito que se aceita muito melhor a diversidade, desde que não venha interferir no nosso cantinho.

    Encontrei pessoas no meu percurso que foram extremamente lúcidas e que inclusivé me ajudaram moralmente num período em que temia a reacção de colegas e conhecidos.

    Em relação à família nunca tive problemas, nem sequer com os filhos, embora eles se preocupem com a minha "solidão" aparente. Nunca me senti depressiva e até tinha razões para isso.

    E afinal como diz a CF a solidão pode existir no meio de muita gente!

    Citar o que o Paulo escreveu no meu blogue tem copyright, sabia????

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    1. Não é o que Paulo escreveu no seu blog, mas sim no blog dele, embora em resposta a um comentário seu.
      Tem copyright sim, eu sei e não é por acaso que está entre aspas, provando ser uma citação. No meu texto só não disse quem era o autor das palavras, o qual, de resto, reconhecendo-as não reagiu mal ao facto de ser citado.
      Imagino que a Virgínia esteja a brincar, naturalmente... ;)

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  7. Claro que estava, Isabel....como é que pode duvidar?

    Até fiquei triste por ter levado o meu comentário a sério:)))

    Bjinho

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    1. Ó Virgínia, desculpe, claro que eu no fundo achei que era a brincar, mas como apesar de tudo ainda não a conheço assim tão bem, fiquei também um bocadinho na dúvida. Humor very british, não? ahah :P

      Beijinho

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  8. Boa noite, Isabel Mouzinho!
    Li todos os posts atrasados porque estive uns dias fora de circulação e escolhi este para comentar.
    Ora bem, Sou a mais nova dos meus três irmãos e com diferença significativa na idade em relação a eles. Quando todos casaram, minha mãe ficou viúva e eu era uma adolescente. A princípio imaginei que ia ser um caos e não foi. Bem pelo contrário! Foi um dos melhores tempos da minha vida, viver só com a minha mãe cerca de 10 anos. Depois casei, vieram os filhos com toda a trabalheira que possa imaginar criar quatro com idades aproximadas. As duas filhas já saíram de casa e foram viver com os respectivos companheiros. Não vejo a hora dos rapazes fazerem o mesmo (risos) Não é por mal, logo eu que sempre me considerei uma mãe galinha, mas acho que chegou a hora de saborear os meus espaços e virar a página...Não sei o que é viver sozinha, mas aprecio os momentos do dia em que estou só, apenas com os dois gatos!Todavia, o meu marido não me incomoda nem nunca me incomodou.
    Tenho feitio muito independente e por isso percebi na perfeição tudo o que escreveu...
    Beijinhos.

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    1. Já tinha dado pela sua falta, Madalena, e alegro-me que esteja de volta, que gosto de a ver por aqui.
      Nós entendemo-nos, não é?

      Beijinho

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  9. Parabéns pelo excelente texto. Muito claro e objetivo. A idade traz-nos, de facto, tranquilidade e serenidade...

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    1. Abri aqui uma excepção ao publicar este comentário simpático e aparentemente bem intencionado. Mas não consigo entender os anonimatos de nenhum tipo...

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